Aquela primeira poesia
Verônica Moreira: Crônica ‘Aquela primeira poesia’


Fico imaginando como teria sido minha vida se, anos atrás, eu não tivesse escrito aquela primeira poesia — os primeiros versos que brotaram do âmago amargurado de minha alma.
Ah, Deus… como teria sido se aquela falta não tivesse me causado o choro e o desejo de escrever?
Páginas em branco que ficaram rabiscadas de tinta azul, vermelha, preta e molhadas de tinta incolor, vinda de meus olhos castanhos e meigos…
E se eu não tivesse escrito aquela primeira poesia? Quem eu seria hoje, quem seria amanhã? E se ninguém a tivesse lido? E se ali, na folha em branco, minha poesia tivesse morrido?
De lá para cá, muita coisa mudou em mim. Algumas portas se abriram e me fizeram evoluir, crescer e prosseguir em busca de sonhos outrora esquecidos.
Vivi sonhos que me foram roubados, pesadelos inesperados e ilusões. Acreditei em mentiras que julguei verdades, abracei falsidades que pensei ser amizades.
Amores idealizei. Pedaços pequenos tomei por metades, prisões confundi com liberdade. Até que um dia, enfim, conheci a fúria da maldade.
Tive medo e me escondi. Corri, o mais rápido que pude; fugi — de tudo, de todos, até de mim.
Deparei-me com a morte. Pensei que ela seria minha sorte, e ali fiquei, me esvaindo, caindo aos poucos.
Como as flores do campo que murcham, aparentemente morri. Todavia, eu tinha raízes profundas, raízes que resistiram à força das estações sem chuvas ou orvalhos.
Renasci. Mesmo na aridez, fui tempestade no deserto que havia em mim. Revivi, me derramei…
Agora, fico imaginando como seria minha vida se eu não tivesse escrito aquela primeira poesia.
Verônica Moreira