Pedro Novaes: 'Índios'
Pedro Israel Novaes de Almeida – ‘ÍNDIOS’
O primeiro contato que tivemos com os índios foi através das histórias em quadrinhos.
Zorro, o mocinho americano, tinha como fiel companheiro um indígena, chamado Tonto. Nas brincadeiras de criança, era difícil montar a dupla, pois todos queriam ser o Zorro.
Os índios, primeiros habitantes do país, conseguiam sobreviver graças aos usos, costumes e tradições que cultivavam. Não eram tão pacíficos quanto as românticas referências de sempre.
Alguns praticavam o canibalismo, acreditando na incorporação das virtudes e forças dos guerreiros que ingeriam. Instintivamente, tentavam expulsar qualquer que tentasse invadir seus territórios.
Os milhares de grupamentos indígenas tinham crenças e costumes próprios. Em alguns, cada índio possuía sua mulher, e o cacique possuía a mulher de todos.
Eram autoridades o cacique, chefe natural, e o pajé, chefe religioso. Não havia índios comissionados.
Progressistas, cabia aos homens a caça, pesca e derrubada de árvores, enquanto as mulheres coletavam, plantavam, colhiam, cuidavam dos filhos e de tudo o que era relegado a segundo plano, pelos homens. O sistema até hoje é elogiado, pelos não índios.
O desastre da civilização indígena começou com a chegada dos primeiros brancos, com seus sotaques europeus. Melhor armados, os novatos distribuíam quinquilharias, como espelhos, a título de recompensa a minérios, acesso a madeiras e, sobretudo, a uma convivência pacífica.
Tentaram, inutilmente, escravizar os nativos. Tentaram, e até hoje tentam, despertar a adoração por estranhos deuses, almejando substituir as arraigadas e centenárias crenças e tradições.
A ocupação de nosso território foi feita expulsando nativos. Os que guerreavam eram caçados e abatidos como animais.
Nosso índio, outrora sobrevivente e guerreiro, possui crenças que não sobrevivem ao contato com não índios, e só povos ainda isolados e não contatados conseguem manter intactos usos, costumes e tradições. Despojado de seu ideário e crenças originais, os índios tornam-se presas fáceis de bebidas, drogas e ócio.
Os sobreviventes, contatados, são extremamente dependentes da ação de órgãos oficiais. Já não são índios, mas populações tuteladas, como se fossem incapacitados.
São milhares os focos de disputa de terras, entre os que já foram índios e hoje alegam a posse ancestral das glebas, e agricultores que as ocupam, por décadas e até séculos. Nossa justiça tem sido pouca justa ao restituir o solo indígena aos que indígenas já não são.
Falhamos ao evitar, a todo custo, a emancipação indígena, buscando mantê-los, artificialmente, em seu estado original. Conseguimos, com tal tutela, incutir, na população, a injusta e mentirosa noção de que os índios são, até prova em contrário, atrasados, preguiçosos e selvagens.
Erramos durante séculos, e continuamos errando.
O autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.