Edweine Loureiro: 'Matsuri'

 Edweine Loureiro:

‘MATSURI’

 

 

No dia 15 de julho, fui a um “matsuri” (“festival”, em Japonês), ocorrido na prefeitura de Chiba – mais precisamente em um bairro chamado Shin-Matsudo. Inicialmente, acostumado às festas de significado religioso, como as que ocorrem no Catolicismo, pensei estar assistindo a uma celebração semelhante na ocasião – mesmo porque, no dia 17, seria feriado no Japão, por ser esta data em que o país celebra o “Dia do Mar”.

No entanto, qual não foi minha surpresa quando, ao perguntar ao meu amigo, Masataka Yamamoto, a respeito dos motivos para a realização do festival, ele respondeu-me, simplesmente: “Nenhum! Não há um significado especial. É apenas uma celebração que fazemos, todos os anos, no bairro de Shin-Matsudo”. Em seguida, meu amigo – a quem chamo carinhosamente de Masa-San – continuou explicando que, no Japão, festivais como este, sem um significado de rito e/ou religiosidade, são comuns; e que se trata, na verdade, de uma grande “reunião” dos moradores de uma determinada localidade para comer, beber e divertir-se: sem a necessidade de pagar tributo a um deus em especial (pois lembremos que a sociedade japonesa é politeísta: ou seja, cultua vários deuses).

E, ao mesmo tempo em que me explicava sobre o festival, Masa-San também vendia “tamakonyaku” – espécie de batata sovada (ficando a massa parecida com um “chiclete”) e cozinhada com óleo de soja, prato típico de outra prefeitura japonesa: Yamagata. Minha esposa e eu, então, decidimos ajudá-lo na barraca, até mesmo para sentirmos de perto o calor humano daquele grandioso festival. E era, de fato, grandioso: para ter-se uma ideia, durante os dois dias em que foi realizado, o evento recebeu cerca de duzentas mil pessoas!… E sem outro motivo específico senão o de celebrar a união.

Claro, há também famosos festivais no Japão, que possuem um significado religioso, como o “Gion Matsuri”, que ocorre durante todo o mês de julho na cidade de Quioto, e cujas origens é para “acalmar os deuses e evitar incêndios”. Porém, a grande verdade é que a maior parte dos festivais no Japão é o que seu povo chama de “Hare no hi” (Dia para festejar). E o que significa especificamente o “Hare no hi”? Como os japoneses são, historicamente, trabalhadores do campo, possuem esta forma de pensamento: após um longo período de labor cultivando a terra, o “Hare no hi” seria simplesmente um dia dedicado ao descanso e ao festejo. Por isso, até hoje, pequenas comunidades mantêm essa tradição: como a comunidade de Shin-Matsudo.

E, maravilhado, digo um “Viva!” a cada um desses pequenos festivais japoneses, cujo motivo é apenas a celebração em si, sem a conexão a ritos ou crenças. E, por isso mesmo, tais festivais são abertos a todos: sejam monoteístas, politeístas ou agnósticos. Pois o importante mesmo… é festejar nossa humanidade.

Até a próxima.

 

Sobre o autor:

 EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta (2015), os dois últimos vencedores, respectivamente, dos Prêmios Orígenes Lessa e Vicente de Carvalho da União Brasileira de Escritores – RJ (UBE-RJ), em 2016. Em julho de 2017, tornou-se colunista do Correio do Porto (Portugal). E, em agosto de 2017, obteve o Primeiro, Segundo e Terceiros lugares, na Categoria Crônica, além do Terceiro Lugar em Poesia, no Concurso Literário Professor Armando Oliveira Lima (Sorocaba-SP); sendo convidado para tornar-se colunista do Jornal ROL. Mais recentemente, em setembro de 2017, seu livro CRÔNICAS DE UM JAPÃO CABOCLO obteve o Prêmio Alejandro Cabassa da União Brasileira de Escritores – RJ (UBE-RJ).

 

Página para contato: https://www.facebook.com/edweine.loureiro