Celso Lungaretti: ainda o 'caso Battisti'

 Celso Lungaretti: ‘ÚLTIMAS DECISÕES DO JUIZ DE CORUMBÁ CONTRA BATTISTI SÃO, NO MÍNIMO, ESDRÚXULAS! HAVERÁ ALGO MAIS NO PACOTE?’

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O escritor italiano Cesare Battisti, residente legal no Brasil, acaba de se tornar réu da Justiça Federal de Corumbá (MS) por conta de uma suposta evasão de divisas que teria sido —mas não foi!— cometida quando tentava, com dois amigos, deixar o Brasil em outubro.

 Digo esdrúxula por alguns motivos, como estes dois:

— ter ficado muito evidente que a viagem de Battisti e seus dois amigos vinha sendo há muito monitorada pela Polícia, que inclusive revistou o carro na estrada e permitiu que seguissem viagem;

— por ser uma quantia ínfima que estaria sendo evadida, meros R$ 25 mil (aproximadamente), além de haver suspeita de armação, pois Battisti alega que se tratava da quantia que os três possuíam em conjunto, tendo as notas sido reunidas e o valor total atribuído somente a ele (vale lembrar que, como cada um poderia sair legalmente do País com R$ 10 mil, os três juntos tinham o direito de ir com R$ 25 mil para onde bem entendessem).

Há mais, contudo. Procurei nas leis do país o crime de tentativa abortada de evasão de divisas e não o encontrei em lugar nenhum. O que existe é isto aqui, na Lei nº 7.492, de 16/06/1986:

Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País:

Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.

Salta aos olhos que o crime em questão se verifica quando de sua consumação (“efetuar operação”, “promover evasão”, “promove a saída de de moeda ou divisa”, “mantém depósitos não declarados”)  e não quando, por qualquer motivo, não se concretiza; e que se refere a ocorrências graves, envolvendo valores expressivos, não ao que pode ter sido mera trapalhada do(s) autor(es) e/ou má fé das autoridades.

Em português claro: a denúncia do Ministério Público e a decisão do juiz de Corumbá são evidente forçação de barra.

Vale lembrar que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao conceder habeas corpus a Battisti para livrá-lo de uma estapafúrdia prisão preventiva que o juiz de 1ª instância lhe impôs, ponderou exatamente que a acusação não se referia a um crime grave e que o único erro de Battisti teria sido o de não declarar os valores à Receita Federal.

Que se saiba, pena de dois a seis anos de reclusão para presumíveis sonegadores de ninharias só existe (se é que existe) em nações totalitárias.

Até para um leigo fica evidente que isso não vai dar em nada, e que o único risco que corre Battisti é o de ser vítima de alguma tentativa de sequestro ou assassinato nos constantes deslocamentos que terá de realizar até Corumbá.

Começando pela pirracenta imposição de uma tornozeleira eletrônica que, a crer-se na justificativa do juiz, só poderia ser-lhe afixada a mais de mil quilômetros de onde reside, sem que o meritíssimo comprovasse sequer que Battisti tem condições financeiras para bancar tal viagem.

Espero que tudo isso não passe de demonstração de antipatia gratuita por parte de autoridades que não deveriam se deixar levar pela bílis ao tomarem suas decisões, pois algo além disto seria inconcebível e inaceitável!