Reinaldo Canto: 'Do menino Jesus ao consumismo desenfreado'

‘Do ponto de vista da sustentabilidade, esse é um momento bastante preocupante’

 

Será mesmo que o consumo na Nova Classe Média é luxo? Foto:José Cruz/ABr

 

Qual será o real símbolo do Natal? O presépio em celebração ao nascimento de Jesus Cristo ou a profusão de sacolas de compras que algumas pessoas mal conseguem carregar?

Seriam as canções tradicionais, a trilha essencial do Natal ou os jingles comerciais e as vozes dos locutores nos centros de compras anunciando mais uma oferta “imperdível”?

São questões de fácil resposta. Basta observar as lojas entupidas de pessoas entregues a busca desenfreada por produtos e quinquilharias de todos os gêneros e preços.

Graças a esse estado de coisas, as nossas cidades são testemunhas do arrefecimento nas condições do tráfego, as metrópoles sentem uma piora considerável no trânsito já caótico e os cristãos, ou melhor dizendo, consumidores, de tão ávidos, ansiosos e impacientes para se livrar da tarefa de aquisição de produtos, se tornam agressivos e muitas vezes irracionais.

Do ponto de vista da sustentabilidade, esse é um momento bastante preocupante. Difícil estabelecer qualquer critério de consumo consciente quando o que importa é preencher a lista de compras. Nesse caso os produtos são escolhidos sem muita reflexão e o fato de consumir de empresas social e ambientalmente responsáveis e até mesmo algo que seja prejudicial à própria saúde humana fica relegado a um triste segundo ou terceiro plano. Nessa hora, o que importa é, simplesmente, comprar!

Essa época do ano deveria ser propícia ao congraçamento, à paz e a harmonia entre os homens, afinal representam algumas das bases defendidas pelo Cristianismo.  Ao invés disso, somos inundados por um clima estressante e até mesmo beligerante. E, ao mesmo tempo em que se escolhem os melhores presentes para entes queridos, também é preciso achar algo para aqueles “não tão queridos” para dizer o mínimo. Do cunhado insuportável à sogra ranzinza, ao colega de trabalho pouco colaborativo, todos devem ser contemplados. Afinal, as convenções têm de ser respeitadas independentemente da vontade e do comprometimento financeiro advindos dessas despesas.

Consumo Consciente do Dinheiro e do Crédito.

Até mesmo aqueles que durante todo o ano buscam manter o controle de suas contas e, dessa maneira, deixar a vida financeira gozando de boa saúde, ao chegar dezembro abandonam todo esse esforço e bom senso. Pois entram em cena as “inadiáveis e urgentes” compras de Natal!

Muita gente se torna refém de uma engrenagem de consumo insana e me parece distante do próprio espírito do Natal. Alguns poderão alegar, em defesa dessa tradição, a cena dos três Reis Magos adentrando a manjedoura para deixar suas oferendas em homenagem ao nascimento do menino Jesus. Mas pelo que se conhece dessa história bíblica, isso foi só quando Ele nasceu, e não temos registro de novos regalos oferecidos pelos Reis Magos ao longo dos 33 anos de existência terrena de Jesus Cristo.

Difícil ir contra a corrente quando a própria presidenta Dilma Rousseff apelou aos brasileiros para irem às compras e dessa maneira manter o mercado aquecido.

Mas será mesmo não ser possível outro comportamento? Faltam poucos dias para o Natal, a maior parte das compras já foi realizada, mas é sempre bom lembrar que consumir conscientemente é, entre outras coisas, evitar os exageros, as compras por impulso, optar pelos produtos de empresas social e ambientalmente responsáveis e sempre que possível evitar o uso das desnecessárias embalagens.

É importante lembrar também que muitas vezes o simples encontro entre pessoas que se gostam e sinceras demonstrações de amor, carinho e amizade são suficientes para preencher o espaço de um presente.

Tenha certeza que, no longo prazo, a sustentabilidade humana no planeta depende mais do afeto entre as pessoas do que de um mercado aquecido! Que tal propor um amigo secreto?

Pelo sim ou pelo não, com ou sem presentes desejo a todos um Feliz Natal e um ótimo 2018!

 

CartaCapital. Sociedade. O Natal e suas contradições

Por Reinaldo Canto — publicado 22/12/2011 08h47, última modificação 06/06/2015 18h20