Pedro Israel Novaes de Almeida: 'Avenida do Zé'
“A humanidade, velada ou abertamente, sempre buscou o reconhecimento social, e a própria imortalidade. O reconhecimento social tem ocorrência quase espontânea, nascida do reconhecimento coletivo de atos ou pensares beneméritos. É um ato de justiça, eterno sobrevivente na memória popular, escritos, quadros, estátuas e transmissão rotineira de cultura.”
A humanidade, velada ou abertamente, sempre buscou o reconhecimento social, e a própria imortalidade.
O reconhecimento social tem ocorrência quase espontânea, nascida do reconhecimento coletivo de atos ou pensares beneméritos. É um ato de justiça, eterno sobrevivente na memória popular, escritos, quadros, estátuas e transmissão rotineira de cultura.
A imortalidade não existe. É normalmente confundida com popularidade, sempre circunscrita a lapsos temporais, limites geográficos e grupamentos humanos.
Eis que a humanidade, repleta de caprichos e quereres, sempre tentou tornar imortais algumas pessoas, pelos mais diversos motivos. Vez ou outra, mas raramente, tenta imortalizar indivíduos beneméritos.
Dar nomes de pessoas a ruas, avenidas e outros logradouros públicos é um rematado absurdo. A atitude tem o condão de escravizar gerações, obrigando-as a utilizar como referência, no dia a dia, nomes com os quais, ao longo do tempo, foi perdendo o liame histórico.
Nominar logradouros públicos também é expediente rasteiro para agradar famílias com elevado número de eleitores, ou dar publicidade a partidos, com homenageados de memória vinculada à agremiação.
Nomes de pessoas conturbam a localização do logradouro, dificultando-a. É comum, ao pedir informações, o cidadão ser informado de que a rua Emengardo Corrupto fica logo após a avenida Cidinha Namoradeira, antes da praça Lindolfo Emanuel Azevedo de Souza Impichado.
Poderosos de hoje ou ontem podem, no futuro, serem reconhecidos como péssimos cidadãos e políticos desonestos, e não será fácil retirar de placas públicas seus nomes e “boas” referências. Nossos legislativos não costumam ser tão isentos e precavidos.
Cidades melhor planejadas nominam ruas e avenidas com letras, números e até nomes de pedras, animais, pássaros, plantas, países, estados, cidades, etc. Tal postura elimina o risco de homenagens equivocadas e individualistas, facilitando a orientação geográfica popular.
É tradição, em populações menos bárbaras, o respeito aos nomes nascidos no seio dos munícipes. Tais nomes possuem significado histórico e já foram assimilados pela população.
O Largo dos Amores, a rua da Biquinha, a avenida da Boiada e tantas outras denominações deveriam ser mais respeitadas, e jamais substituídas por nomes de pessoas. É um desrespeito que já vitimou a maioria de nossas cidades e populações.
A humanidade conseguiu imortalizar o descaso com a impessoalidade. Ainda chegaremos ao tempo em que as escolas, os pátios, as salas de aula e cada porta terão nomes próprios.
As sanhas e caprichos humanos persistem insaciáveis.
O autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.
pedroinovaes@uol.com.br