Andrade Jorge: 'Exilado em minha terra'

“Então não permita Deus que eu morra/ sem ver um fio de esperança brilhar,/ sem ver a derrubada da masmorra,/ sem ver o Sabiá e o povo,/ aqui de novo, cantar..”

 

Assim versejou Dias na Canção do Exílio:

“Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores….”

 Será?

Hoje na minha terra a palmeira

ainda é verdejante

mas as aves em revoada,

entristecidas gorjeiam pra la.

 

O nosso céu ainda azul

impávido assiste esse colosso

deitar em catre, adoecido;

Nossas matas desmatadas,

nossos bosque sem flores,

nossa vida em teu seio, Mãe

chora as dores

de um povo maltratado e esquecido.

 

À noite fico cismando

qual é o meu prazer?

É ver diariamente um bando armado

distribuindo bala de aço sem lei

que rasga sem clemência a carne inocente?

Sim, minha terra tem palmeira

Onde já não canta o Sabiá,

Mas tem gente!

onde resmunga os sem eira nem beira,

mas ecoa o riso fácil do rei.

 

Minha terra de antigos primores

escancara à minha cara as vilanias,

os prazeres são dissabores

nas cidades e cercanias.

 

Então não permita Deus que eu morra

sem ver um fio de esperança brilhar,

sem ver a derrubada da masmorra,

sem ver o Sabiá e o povo, aqui de novo, cantar.

 

Andrade Jorge  –  andradejorge2@bol.com.br

22/03/2018