Artigo de Pedro Novaes: 'Idade'

Pedro Israel Novaes de Almeida

 

colunista do ROL
Pedro Novaes

Ser idoso traz o inconveniente de perceber que o organismo já não é o mesmo, e que limitações vão ocorrendo, de maneira crescente.

Contudo, a idade traz consigo desprendimentos que emprestam um ar de liberdade ao dia-a-dia.  A despreocupação com a própria imagem e com julgamentos alheios faz da maioria dos idosos pessoas quase folclóricas, convivendo socialmente sem a mínima preocupação com padrões de estética e projeção individual.

Não raro, a família tenta jogar ao lixo algumas roupas mais puídas, justamente aquelas que causam sensações de conforto. O veículo antigo, que alterna garagem e oficina, raramente é trocado, enquanto cumprir sua missão de sair de um ponto e chegar a outro.

Não existisse o desconfiômetro familiar, muitos idosos seriam abordados ou evitados, como mendigos. Afinal de contas, qual o crime em usar aquela camiseta com um furinho, ou calçar o tênis que não combina com a meia ?

Idosos excessivamente educados não são longevos, e a aceitação passiva de afrontas e desacatos tem efeito cumulativo, com reflexos diretos na saúde. A natureza costuma dotar os idosos da capacidade de reagir verbalmente, sem provocar o confronto físico.

Alguns idosos confundem idade com sabedoria, e acabam desempenhando o papel de chatos, proferindo cada frase como se fosse um grande ensinamento.  Pode parecer politicamente incorreto, mas, na verdade, nem toda criança é bonita, e nem todo idoso é sábio.

A idade, em aposentados, revela pendores ignorados, e é comum grandes empresários e profissionais liberais encontrarem a felicidade em uma oficina na garagem, no trato com jardins e hortas, nas artes, culinária, etc. Alguns partem para funções beneméritas de auxílio humano, proteção da natureza ou preservação da história.

Virtude e defeitos são realçados, na terceira idade. Os que a ela chegam, portando intolerâncias e preconceitos, dificilmente perdem tais defeitos, podendo, no máximo, evitar manifestá-las.

O sexo é o tabu mais insondável da terceira idade. Alguns buscam o auxílio de medicamentos, outros aceitam o crescente declínio, mas todos, em regra, mentem.

O grande desafio à terceira idade é manter intactas a memória e a agilidade mental. Sudoku, palavras cruzadas, leitura, xadrez, exercícios e muita conversa são algumas das armas para retardar o inexorável advento das perdas.

Quanto mais evoluída a sociedade, mais valorizadas a infância e a velhice. Populações indígenas costumam seguir tal preceito.

No Brasil, ainda são precárias as moradias para idosos, quase todas conduzidas pela benemerência e voluntariedade social. Poderiam, os governos, dispensar maiores respeitos e cuidados aos idosos, de pouco adiantando a edição de leis protetoras, se pouco cumpridas.

pedroinovaes@uol.com.br

O autor é engenheiro agrônomo e advogado, aposentado.