Cláudia Lundgren: 'E daí?'
E daí?
Sinceramente? Hoje eu não abri o guarda-chuva. Não me importei com o frio das gotas que caiam sobre mim, como era de costume.
Não me preocupei se meu cabelo iria encolher, essas coisas tão fúteis com as quais normalmente me importo.
Não sei quem passou ao meu lado, nada disso me interessou. Atordoei-me dentro do supermercado, o que eu estava fazendo ali? Ah! sim, me lembrei em seguida.
Sentei-me para me alimentar, porque já não havia em mim forças. Eu havia saído de casa apressadamente, sem proporcionar ao meu próprio corpo a provisão necessária. Da mesa da lanchonete as nuvens cinzas, densas, não me amedrontaram.
Alguém precisava de mim. Alguém esperava por mim, pelo meu cuidado naquela tarde. Por isso nenhum desses detalhes me deteve. Como passarinhos esperam da mãe, indefesos no ninho o seu sustento, e ali, tranquilos descansam plenamente, pois nela confiam, alguém me aguardava.
E o que significava o banho de chuva e o cabelo molhado naquele momento? Trovões, relâmpagos e a imensidão do negro e pesado céu? A multidão nas ruas, tantos estímulos a enfrentar. E enfrentei. Tudo se tornou pequeno.
Fui me doar a alguém, ainda que tão pouco.
O que fiz não importa; o que a mão direita oferta, a esquerda não deve saber.
Era um dia perfeito para ficar no conforto do meu lar, quem sabe assistindo a um filme ou dormindo. Um dia frio, chuvoso. Mas saí em missão, me senti a própria Mulher Maravilha; e a cumpri!
Como disse perfeitamente Caio Fernando Abreu, exatamente assim: “Um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim.”
Esqueci-me de mim e das minhas esquisitices. Deixei a sombrinha na bolsa; não fiquei embaixo da marquise aguardando a chuva passar. Meus óculos molharam. E daí?
Claudia Lundgren
tiaclaudia05@gmail.com