Sandra Albuquerque: 'Naomi'

Sandra Albuquerque

Naomi

Naomi, negra linda, esbelta e formosa, toda torneada e por onde passava chamava atenção.
Ela não tinha culpa de ser tão bela e as brancas invejavam sua formosura e procuravam ocasiões para a humilhar.
Talvez, a sua beleza viesse de sua miscigenação entre negro com português, pois naquela época da escravidão as negras não eram donas de si e, por diversas vezes, eram obrigadas a deitar com seus senhores, sem dizer nada; até mesmo, traindo as suas senhoras – mulheres recatadas e cheias de pudor, as quais não podiam expressar os seus desejos mais íntimos para com seus maridos; eram vistas, apenas, como objeto de procriação.
E por destacar-se entre as demais escravas, ficava na casa grande, fazendo serviços domésticos e em todas as festas ela estava sempre pronta a servir aos convidados, que caíam de olhares por ela, cheios de desejo.
Um dia, em meio à festa, Naomi, ao percorrer os corredores para ir à cozinha pegar travessas para repor à mesa principal, sentiu alguém a puxá-la fortemente pelos braços e, ao entrar no quarto e disse:
-Não diga nada! Não vou te fazer mal! Quero você para mim! Quero casar com você! Vou comprar você, custe o que custar.
-Nem sequer sei o seu nome!
-Sou o Conde Baltazar e, custe o que custar, eu vou ter você pra mim, pois há tempos eu olho você: moça prendada e caprichosa e de uma beleza sem igual.
E ali, se travou uma grande luta, pois seu senhor exigiu muitas moedas em ouro por ela, mas o amor falou mais forte e, enfim , Naomi conseguiu se livrar de todo aquele passado horripilante e se foi com o seu amor.
Ninguém mais ouvia falar em Naomi, até que um dia teve uma importante festa na casa grande: um encontro da nobreza e, de repente, um dos convidados, ao descer de sua carruagem tomou pelas mãos, sua esposa toda ornada em ouro, que não era outra mulher, senão Naomi.

Poetisa Sandra Albuquerque
Rio de Janeiro,24 de setembro de 2021