Letícia Mariana: 'Espelho do passado'

Letícia Mariana

Espelho do passado

Crédito da foto: https://poemadeamor5.blogspot.com/2019/01/viver-o-presente.html

— Que linda menina, tão carinhosa! – disse uma parente. Eu tinha oito anos, e de fato, era muito amorosa! Ingênua, tão bobinha quanto sou hoje em dia. Alguns fatos nunca mudam, e eu estava prestes a descobrir isto.

Sou pensativa, por isso escrevo agora. Aliás, por que escreveria agora? Preciso pensar em mim! O reflexo me traz refluxo, o tudo me causa nada!

— Que linda menina, tão inteligente! – disse um rapaz. – Quer ser escritora quando crescer?

Essa história de “o que você quer ser quando crescer?” banaliza as crianças. Oras, qual garotinha sabe exatamente o que deseja? Eu sabia, mas ninguém imaginava. Minha vida era brincar de escrever! Era muito mais divertido do que qualquer boneca, e isso me fazia isolada muitas vezes.

Vinte e um anos. Tenho apenas vinte e um, e de tanto conversar com pessoas mais velhas, já me convenci de que não vivi quase nada! Será que sou tão criança assim? Meu ego não permite o fato, muito menos a lembrança da menina solitária com seu caderno na mão, vislumbrando seu primeiro livro e, quem sabe, um espaço fixo no jornal para escrever crônicas como esta. Não sou criança, mas brinco de viver. Essa brincadeira cansa!

— Nossa! – disse minha amiga. – A sua poesia foi para o jornal?

— Foi sim, e eu decidi que quero ser escritora! – eu respondi, enquanto segurava a pipoca. – Quer?

Minha amiga ria. Logicamente, escritor é profissão de senhorzinho, senhoras e no máximo adultos bem experientes. Foi essa a impressão que todos tiveram até meus dezoito anos, quando finalmente realizei o sonho que mudara minha vida!

Mas o espelho mostrava além disso. Escrever era uma paixão complexa, pois sempre foi uma busca constante contra minha solidão. Eu era ridiculamente feliz escrevendo, apesar de mostrar minhas fraquezas e tristezas. O paradoxo perfeito!

Meus defeitos enfeitavam meu espelho como se a sala não existisse ali. Eu insistia ao me olhar, encarando meu jeito perdido de existir. E será que eu existo, ou só existem os resquícios de mim?

Quero me imortalizar em palavras, e jamais me esquecer na morte! Talvez assim os outros não me rasguem depois.

E os cacos deste espelho?

 

Letícia Mariana

leticiamariana2017@gmail.com