Marcus Hemerly: 'Cinema em tela: um novo olhar sobre uma saga. O Poderoso Chefão: Desfecho'
CINEMA EM TELA:
Um novo olhar sobre uma saga. O Poderoso Chefão: Desfecho
Trinta anos após o encerramento da trilogia O Poderoso Chefão, com o lançamento da terceira parte de uma das mais importantes sagas do cinema, nos deparamos com uma nova montagem pelo diretor Francis Ford Coppola, lançada em dezembro de 2020. Inicialmente num circuito reduzido de cinemas e agora no serviço de streaming. Nessa releitura, Coppola altera a sequência de algumas cenas, bem como retira passagens inócuas, tornando o filme mais curto e objetivo ao imprimir significativas mudanças no início e final da trama.
Mostra-se pertinente relembrar, que à época das gravações, o estúdio não mais “temia” o diretor, para utilizar um termo comum ao universo do submundo criminoso retratado na trilogia, ao passo que seria mais vendável a divulgação do título como O Poderoso Chefão Parte III, em detrimento daquele inicialmente idealizado, tal seja, A Morte de Michael Corleone. Ao contrário do cenário que se descortinava quando da filmagem da parte dois, em 1974, pois Coppola se encontrava em uma posição favorável com o grande sucesso do original dois anos antes, havendo sido o idealizador do título da sequência, a primeira a ganhar um Oscar na categoria “melhor filme”.
Em 1990, inúmeras foram as críticas negativas, defendendo que o filme perdia o colorido quando em paralelo às obras primas de 1972 e 1974, bem como pela deficiente atuação da filha do diretor, Sofia, no papel de Mary Corleone, escalada de última hora em substituição a ninguém menos que Winona Ryder. Nesse novo corte, Coppola tenta salvar um pouco da embaraçosa capacidade interpretativa de sua filha, com os cortes e reajustes de cenas. O que se alcança, na verdade, é a justiça que o filme merecia, eis que mesmo se tratando do menos impressionante dos três episódios, ainda se mostra como um ótimo filme, especialmente se analisado de forma autônoma dos demais capítulos. Intrigas políticas, o submundo do crime, dos negócios e até mesmo do Vaticano são retratadas nas as mãos hábeis de um mestre filmaker.
As singelas alterações inseridas na narrativa, fazem com que O Poderoso Chefão: Desfecho – A Morte de Michael Corleone, traduza a verdadeira arte em pequenos retoques, habilmente orquestradas. Arquiteta-se uma nova vida a um grande filme, e não poderia ser o contrário, temos um elenco de destaque, roteiro escrito em parceria com Mario Puzo, autor do livro e dos roteiros pretéritos, além de uma trilha sonora que permanece a altura das películas pretéritas.
Nesse passo, indaga-se: Era necessário uma nova montagem? A proposta foi bem sucedida? A resposta é negativa ao primeiro questionamento; apesar de algum pontos fracos, o terceiro capítulo da trajetória de Michael Corleone com a versão do estúdio, já se mostrava, não perfeita, mas agradável aos fãs e apreciadores do bom cinema. Se deu certo, obviamente sim. O realinhamento de cenas, ainda que sutil em sua maioria, retrata a concepção original de um dos maiores diretores de todos os tempos, a partir de um material, repise-se, de qualidade inquestionável, lapidando sua narrativa rumo à morte do chefe da família mafiosa. Qual espécie de morte estamos tratando? Cabe ao expectador apreciar as sutilezas e simbolismos. Atualmente, o filme foi disponibilizado no catálogo Netflix, revitalizando o interesse de novas gerações sobre uma obra que retrata uma verdadeira aula de cinema.
Marcus Hemerly
marcushemerly@gmail.com