Artigo de Ivan Fortunato: 'Sobre a relação professor-aluno: lições do Chavo del Ocho'

Ivan Fortunato“Não sou nenhum mestre-linguiça… sou Linguiça de sobrenome Mestre” (professor Girafales, in memoriam)

 

Ivan Fortunato

 

Sou professor do IFSP de Itapetininga, e o foco principal da minha atividade é lecionar futuros professores sobre técnicas, recursos, meios e propósitos desta profissão. Nesta semana do dia 15 de agosto, em meio às discussões necessárias para o desenvolvimento da disciplina de didática, tive um insight: sobre a relação professor-aluno – indispensável para a educação escolar que preza pela formação da cidadania plena – existe uma evidência silenciosa de que ela pode estar desgastada e, assim, não exercer sua função pedagógica esperada.

Tal evidência precisa ainda ser melhor compreendida, analisada, inventariada, testada… aí sim, pode ser qualificada como axiomática. No momento, é apenas uma eloquente constatação que decidi compartilhar. Trata-se da síndrome do mestre-linguiça. Síndrome é um conjunto de sintomas. Mestre-linguiça era a forma de tratamento dada pelo Chaves (do oito) e sua turma (Chiquinha, Quico, Nhonhô, seo Madruga etc.) ao professor que tinham na escola – provavelmente do terceiro ou quarto ano do que hoje seria o ensino fundamental, pois há indícios que as “crianças” teriam algo entre oito e nove anos e, além disso, o professor Girafales atuava como polivalente, tal qual um docente dos primeiros anos da educação básica.

Basicamente, os sintomas da síndrome do mestre-linguiça (SML) são: (1) os estudantes de determinada série/classe/escola cunham um apelido para designar determinado/a professor/a, seja por uma caraterística física (como a altura e a esbelteza do Linguiça o levariam a ser chamado de Mestre), um cacoete, um ritual, uma mania etc.; (2) os estudantes não usam mais o nome próprio para designar o/a professor/a; (3) a alcunha é mantida em segredo entre os pares que a criaram, jamais mencionando ao interessado que ele/a é assim chamado/a; (4) o apelido irá perdurar por toda a vida dos estudantes e este será o catalisador da maioria das memórias sobre as aulas e histórias do/a professor/a.

Nota-se que a síndrome do mestre-linguiça é consubstancialmente diferente do tratamento dado a um/a professor/a por um codinome amplamente divulgado e até preferido pelo docente. Quando isso acontece, há declarado respeito entre ambos: alunado e mestre. Não obstante, a SML parece denotar certa retaliação à aula, ou ao comportamento docente, seja pela severidade, autoridade, impaciência… ou às vezes até mesmo pelo que se conhece popularmente como “falta de didática” (esta parece ser algo que se desdobra em dois: falta de empatia entre grupo de estudantes e docente, ou dificuldade de comunicação entre ambas as partes, que leva à rejeição da ciência a ser ensinada).

Ao final, fica a sensação de que em algum momento da vida todos nós, professores, sofremos ou sofreremos da SML…