Carlos Cavalheiro: 'Mulher sorocabana na História: a professora Francisca da Silveira Queiroz'

Carlos Carvalho Cavalheiro: ‘Mulher sorocabana na História: a professora Francisca da Silveira Queiroz’

Carlos Carvalho Cavalheiro

Imagem inline 1Mulheres notáveis sempre permearam a História de Sorocaba. A começar de Isabel de Proença, segunda esposa do fundador Baltazar Fernandes, chamada por Aluísio de Almeida como “a primeira sorocabana”. Também, indiscutivelmente, foi notável a figura da Marquesa de Santos, que viveu por algum tempo entre os sorocabanos. Já no início do século XX, as operárias registravam sua presença na História, participando de greves e movimentos sociais, ou mesmo lecionando, tanto nas escolas regulares quanto nas chamadas “Escolas Modernas”, de cunho anarquista. Assim, como atesta o historiador Edgar Rodrigues, a militante anarquista Angelina Soares teria sido professora em Sorocaba numa dessas escolas modernas.Também, na mesma época, formava-se a primeira mulher médica de Sorocaba, a doutora Ursulina Lopes Torres.

Ainda no século XX, o nome de Francisca da Silveira Queiroz merece destaque. Nascida em Sorocaba em 31 de janeiro de 1896, de família de poucos recursos, Francisca Queiroz diplomou-se professora na antiga Escola do Braz (São Paulo) graças ao auxílio de uma família sorocabana residente na capital paulista. No dia 08 de dezembro de 1921, em cerimônia realizada no Salão Germânia, em São Paulo, a senhorita Francisca da Silveira Queiroz diplomou-se professora. O jornal Cruzeiro do Sul noticiou o fato, informando que “a senhorinha Francisca da Silveira Queiroz se distinguiu sempre entre as demais alumnas por sua assiduidade, intelligencia e applicação”.
Como estudante, Francisca foi eleita presidente da República da Escola Normal, uma instituição criada com a finalidade de incentivar a participação cívica da mocidade estudantil. De volta a Sorocaba, foi professora adjunta no Grupo Escolar Antonio Padilha, em 1925. A partir de 1930, tornou-se professora de português no Ginásio Estadual de Sorocaba. Em 1931, fundou com outras sorocabanas, o Centro de Cultura Pedagógica.
Envolvida com os ideais da Revolução Constitucionalista de 1932, Francisca da Silveira Queiroz foi uma das sorocabanas voluntárias, auxiliando na confecção de fardas para os combatentes. De suas próprias expensas, publicou nessa época o livro Folhas Dispersas, uma reunião de crônicas e escritos, publicado exclusivamente para ter sua verba revertida em prol dos órfãos da Revolução Constitucionalista. Nessa época, a professora Francisca da Silveira Queiroz já colaborava com seus escritos em jornais da cidade, alguns desses textos assinados sob o pseudônimo de Flávia.
Na abertura de Folhas Dispersas há uma Exortação: “Mulher paulista! Faze reviver em ti, nesta hora anciosa da nacionalidade, a alma heróica de uma Rosa de Siqueira, de u’a Maria Betim Pais Leme, de u’a Margarida de Barros! A primeira combateu corsários denodadamente. A segunda iluminou o sonho de Fernão Dias. A última incitou o filho para a conquista da glória. Todas paulistas. Varonis. Heroicas. Filhas da terra bandeirante”.
Francisca da Silveira Queiroz carrega ainda em seu currículo a honra de ter sido a primeira mulher sorocabana a se candidatar a um cargo no Legislativo municipal. A bem da verdade, foi a primeira mulher a se candidatar a qualquer cargo eletivo. Eis que, somente em 1934 a mulher conquistou o direito de votar e ser eleita. A primeira eleição após a promulgação dessa lei foi em 1936, com as eleições municipais.
O Partido Constitucionalista, a partir de seu diretório municipal, achou por bem convidar a professora para compor a chapa de candidatos. Assim se expressou Francisca Queiroz ante o convite feito:

“Simples espectadora do panorama político nacional, em que refulge a obra regeneradora e sadia do grande presidente de S. Paulo [Armando de Salles Oliveira] , jamais pensei intervir nos destinos de minha terra, a não ser pelo exercício do voto.
Eis porque me foi uma grande surpresa a escolha de meu nome para a chapa de vereadores ao executivo local. Teria eu o direito de excusar me a acceitar o convite que me era feito, ponderando a responsabilidade immensa que a honra envolvia? Não, que a homenagem não se conferia á minha pessoa mas á mulher sorocabana. Eu, no caso, não passava de um symbolo – pequenino demais – mas um symbolo dessa que a renovação política brasileira reverenciou e acolheu nas suas fileiras como uma collaboradora na solução dos altos problemas da pátria. E cônscia do meu papel, sem resquício de vaidade, annui ao convite do directorio peceista”.

A campanha de eleição de Francisca Queiroz foi bem recebida, tendo apoio do Comitê Feminino (então existente na cidade), e de setores do operariado, do movimento estudantil e de associações femininas. Mais de 20 (vinte) oradoras ocuparam o microfone da PRD 9 (a rádio da cidade), no programa “Hora Constitucionalista”, para homenagear e apoiar o nome de Francisca ao legislativo municipal. Maria José Vieira era a locutora do programa.
Mesmo com todo esse apoio, Francisca da Silveira Queiroz não conseguiu se eleger. Recebeu 127 votos, uma votação considerável para a época, mas insuficiente para alcançar o quociente eleitoral. Recebeu mais votos do que qualquer candidato da Chapa Integralista. Foi a 19ª candidata mais votada, numa eleição em que participaram 39 candidatos.
Logo veio o Estado Novo, em 10 de novembro de 1937. O Legislativo municipal foi fechado. Os ares da democracia só iriam soprar no Brasil ao final da 2ª Guerra Mundial, em 1945. Somente em 1947 haveria nova eleição municipal com a participação das mulheres sorocabanas. Tarde demais para aquela que foi a primeira a se candidatar. Francisca da Silveira Queiroz faleceu em 22 de julho de 1941.