Alexandre Rurikovich Carvalho
‘Dom Pedro II: O Imperador Erudito que transformou o Brasil
pela Ciência, pela Cultura e pela Educação’


Matéria Especial Bicentenário de Dom Pedro II
INTRODUÇÃO – UM GOVERNANTE FORJADO PELO SABER
No cenário político e cultural do século XIX, poucas figuras tiveram impacto tão profundo e duradouro quanto Dom Pedro II, o último imperador do Brasil. Educado desde a infância para governar, tornou-se um símbolo singular da monarquia tropical: um soberano que fez da inteligência, da moderação e da cultura as bases de seu reinado.
Durante quase meio século, guiou o país por caminhos de estabilidade, modernização e abertura intelectual. O Brasil Imperial tornou-se, nas palavras de muitos historiadores, um “país de ideias”, movido por um líder que colocava livros acima de cerimônias e professores acima de nobres.
I. O IMPERADOR ERUDITO
Um Estudante Infatigável em um Trono de Livros
Dom Pedro II teve uma formação acadêmica sem precedentes na história brasileira. Aos 5 anos, iniciou uma rotina de estudos que duraria a vida inteira: despertava às 6h, estudava diversas disciplinas até a noite e tinha pouco tempo para descanso ou lazer.
• Um Poliglota Excepcional
A lista de idiomas que dominava inclui:
- Francês, inglês, alemão, italiano e espanhol (línguas modernas),
- Latim, grego antigo, hebraico e árabe (línguas clássicas e orientais),
- Tupi, provençal, russo e sânscrito, entre outros.
Ele lia jornais estrangeiros diariamente, sem tradutores, e mantinha correspondência com intelectuais de vários países.
• Cadernos, Diários e a Disciplina do Saber
Seus cadernos pessoais registram as mais diversas leituras: poesia, filosofia, química, matemática, história natural, política e até manuais astronômicos.
Documentos mostram que chegava a ler mais de 200 páginas por dia.
II. O SOBERANO DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA
Um Monarca Cientista em Pleno Século XIX
Dom Pedro II foi um dos governantes mais abertos à tecnologia de seu tempo. Ele não apenas conhecia invenções modernas – frequentava laboratórios, patrocinava pesquisas e buscava aplicar novidades no Brasil.
• O Encontro Histórico com Thomas Edison
Durante viagem aos Estados Unidos, visitou pessoalmente o laboratório de Thomas Edison. Ao testar o fonógrafo, encantou-se imediatamente. A imprensa americana relatou o assombro do imperador e destacou sua capacidade de compreender detalhes técnicos da máquina.
• Fotografia e Documentação
Foi um dos primeiros monarcas do mundo a ser fotografado, mas não se limitou a posar:
- Fotografava pessoalmente,
- Desenvolvia imagens em laboratório próprio,
- Incentivava fotógrafos profissionais,
- Registrava expedições científicas e eventos nacionais.
Seu apoio à fotografia ajudou a consolidar o Brasil como um dos primeiros países do mundo a possuir documentação fotográfica sistemática.
• Instituições Científicas e Pesquisadores
Sob seu patrocínio avançaram projetos como:
- Observatório Nacional
- Museu Nacional
- Comissão Geológica do Império
- Expedições naturalistas estrangeiras
- Estudos sobre astronomia, meteorologia e geografia física
Seu nome figurou em mais de 50 academias científicas internacionais, incluindo prestigiadas sociedades europeias.
III. O MECENAS DAS ARTES E DAS LETRAS
O Imperador que Conversava com Gênios
A cultura foi um dos eixos centrais do reinado de Dom Pedro II. Ele acreditava que a arte civilizava e que o conhecimento preenchia o espírito humano.
• Relações com Personalidades Globais
Trocou cartas e visitas com grandes nomes da literatura e da música:
- Victor Hugo admirava sua postura humanitária,
- Richard Wagner agradecia seu incentivo às artes,
- Franz Liszt o recebeu em recitais privados,
- Ernest Renan e Camille Flammarion discutiam ciência e filosofia com o Imperador.
Ele também apoiou artistas brasileiros como Pedro Américo, Vítor Meireles, Rodolfo Amoedo, Porto-Alegre e muitos outros.
• Instituições de Cultura
Durante seu reinado, fortalecem-se e modernizam-se:
- Biblioteca Nacional (o maior acervo das Américas no século XIX),
- Museu Nacional,
- Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,
- Academia Imperial de Belas Artes,
- Escolas de música, teatro e pintura.
IV. EDUCAÇÃO COMO PILAR DO FUTURO
A Obra de um Imperador Professor
Dom Pedro II percebia a educação como a verdadeira força da modernidade. Era defensor de escolas públicas, incentivo aos professores e pesquisa científica.
• Reformas e Ações Estruturais
• Reformas e Ações Estruturais
Entre suas contribuições:
- Ampliação da instrução básica,
- Envio de estudantes brasileiros para Europa,
- Modernização de colégios e liceus,
- Financiamento pessoal para professores e pesquisadores.
Ele dizia:
“A instrução é a base da liberdade. Sem educação, o Brasil não poderá ser grande.”
V. O IMPERADOR HUMANISTA E A ABOLIÇÃO
A Consciência Moral de um Líder
Dom Pedro II era abertamente contrário à escravidão desde a juventude. Considerava o sistema “degradante” e contrário aos princípios cristãos e civilizatórios.
• Atuação e Influências
Embora não pudesse abolir por decreto, apoiou medidas gradualistas, como:
- Lei do Ventre Livre (1871),
- Lei dos Sexagenários (1885),
- Incentivo à libertação voluntária,
- Participação indireta no movimento abolicionista.
Sua filha, Princesa Isabel, recebeu forte influência de sua postura, culminando na Lei Áurea (1888).
VI. EXÍLIO, SOLIDÃO E UM AMOR QUE NÃO SE APAGOU
O Fim de Um Reinado e a Memória do Brasil
Derrubado pelo golpe militar de 1889, Dom Pedro II embarcou para a Europa sem resistir. Levou consigo poucos pertences: essencialmente livros, cadernos e memórias.
• Uma Vida Modesta em Paris
Recusou pensão do governo republicano e viveu de forma simples em hotéis europeus. Sua rotina no exílio era marcada por leituras, passeios discretos e saudades profundas do Brasil.
• A Morte e o Regresso
Faleceu em 1891, aos 66 anos. Ao seu lado, havia um saco com terra brasileira, que foi depositado sob sua cabeça no caixão – símbolo comovente de sua conexão eterna com o país.
Seu corpo retornou ao Brasil apenas em 1921, já em tempos republicanos.
CONCLUSÃO – UM IMPERADOR PARA ALÉM DA MONARQUIA
Dom Pedro II permanece como uma das figuras mais admiradas da história nacional. Seu reinado deixou marcas profundas na ciência, na cultura, na literatura, na educação e na identidade do Brasil. Em um período em que muitos monarcas europeus viviam para o luxo e a pompa, o soberano brasileiro vivia para estudar, estimular e construir.
Um intelectual no trono.
Um mecenas em meio à política.
Um homem simples que carregou um império.
E um brasileiro cuja grandeza continua a inspirar gerações.
REFERÊNCIAS
Obras clássicas e biografias:
- CALMON, Pedro. História de Dom Pedro II. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.
- CARVALHO, José Murilo de. Dom Pedro II: Ser ou Não Ser. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
- SCHWARCZ, Lilia Moritz. As Barbas do Imperador. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
- BARMAN, Roderick. Citizen Emperor: Pedro II and the Making of Brazil, 1825–1891. Stanford: Stanford University Press, 1999.
Documentos e fontes primárias:
- Diários de D. Pedro II – Arquivo Nacional / IHGB.
- Correspondências Epistolares – Coleções da Biblioteca Nacional.
- Acervo Fotográfico Imperial – Museu Imperial de Petrópolis.
Estudos complementares:
- COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República. São Paulo: UNESP, 1999.
- FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 1994.
- HILSDORF, Maria Lúcia. História da Educação no Brasil. São Paulo: Global, 2004.
Alexandre Rurikovich Carvalho
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