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Herzog, assassinado no DOI-Codi em outubro de 1975 |
Dentre as centenas de cidadãos idealistas que, mesmo não tendo pegado em armas contra as ditaduras chilena e brasileira dos anos de chumbo, foram por elas bestialmente assassinados, os mais conhecidos eram, respectivamente, o músico Victor Jara e o jornalista Vladimir Herzog.
Enquanto nove militares responsáveis pela execução do primeiro acabam de ser condenados exemplarmente pela Justiça de lá, os carrascos de Herzog continuam desfrutando a impunidade eterna que lhes foi concedida pelo Legislativo e o Judiciário daqui.
Já a Corte Interamericana de Direitos Humanos aceitou a queixa de Clarice e iniciou o julgamento em maio de 2017, sem prazo para terminar. Mas, embora ela integre o sistema de proteção dos direitos humanos da OEA, o governo brasileiro não está obrigado a acatar a sentença que emitirá. Foi o que fez com a contundente decisão da corte, de novembro de 2010, sobre os extermínios no Araguaia. O peso moral de sua conclusão, contudo, será enorme.
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Jara, assassinado no Estádio do Chile em setembro de 1973 |
CONDENADOS POR SEQUESTRAR, MATAR E ACOBERTAR A EXECUÇÃO DE JARA
Vázquez condenou a 15 anos de prisão os oficiais Hugo Sánchez Marmonti, Raúl Jofré González, Edwin Dimter Bianchi, Nelson Haase Mazzei, Ernesto Bethke Wulf, Juan Jara Quintana, Hernán Chacón Soto e Patricio Vásquez Donoso como autores dos dois crimes.
Os militares –com patentes de tenente, coronel e brigadeiro– também receberam três anos de prisão pelo sequestro das duas vítimas.
O oficial Rolando Melo Silva foi condenado a cinco anos de prisão por encobrir os homicídios, e a 61 dias pelo acobertamento dos sequestros.
NA AUTÓPSIA SE ENCONTRARAM 44 BALAS CRAVADAS NO SEU CORPO
Um dos principais expoentes da chamada nueva canción chilena, movimento musical engajado às causas populares, Jara foi detido em 12 de setembro de 1973, um dia após a derrubada e assassinato do presidente socialista Salvador Allende.
Preso na Universidade Técnica do Estado, da qual era professor, foi conduzido ao Estádio Chile, convertido em campo de concentração e num dos maiores centros de detenção e tortura da ditadura de Pinochet. Lá estavam 5 mil prisioneiros, aproximadamente.
Correu também o boato de que ele haveria tido as mãos amputadas, mas, quando exumou-se o corpo de Jara em junho de 2009, ficou provado que suas mãos foram é esmagadas por golpes de coronha.
A causa da morte foram os tiros disparados contra ele (havia nada menos que 44 balas cravadas no seu corpo!). A autópsia também revelou que vários ossos estavam fraturados.
Em 2016, um tribunal da Florida julgou um processo aberto por parentes de Jara (a viúva Joan, a filha Amanda e a enteada Manuela) com base na Lei de Proteção à Vítima de Tortura dos EUA, que permite ações civis contra torturadores.
O ex-militar chileno Pedro Paulo Barrientos Nuñez, que para lá emigrou em 1990 e acabou adquirindo a cidadania estadunidense, foi condenado a indenizar em US$ 28 milhões a família.
Outro ex-soldado do regimento comandado por Barrientos, Gustavo Baez, disse que teve de empilhar dezenas de cadáveres em caminhões.
Também depuseram dois antigos prisioneiros, que viram Jara ser reconhecido pelos militares, separado dos outros e violentamente espancado.
“O SANGUE, PARA ELES, SÃO MEDALHAS”
Durante os dias em que esteve preso, às vésperas da execução, Jara escreveu um último poema, abaixo reproduzido na íntegra:
Somos cinco mil
nesta pequena parte da cidade.
Somos cinco mil.
Quantos seremos no total,
nas cidades e em todo o país?
Somente aqui, dez mil mãos que semeiam
e fazem andar as fábricas.
Quanta humanidade
com fome, frio, pânico, dor,
pressão moral, terror e loucura!
Seis de nós se perderam
no espaço das estrelas.
Um morto, um espancado como jamais imaginei
que se pudesse espancar um ser humano.
Os outros quatro quiseram livrar-se de todos os temores,
um saltando no vazio,
outro batendo a cabeça contra o muro,
mas todos com o olhar fixo da morte.
Que espanto causa o rosto do fascismo!
Colocam em prática seus planos com precisão arteira,
sem que nada lhes importe.
O sangue, para eles, são medalhas.
A matança é ato de heroísmo.
É este o mundo que criaste, meu Deus?
Para isto os teus sete dias de assombro e trabalho?!
Nestas quatro muralhas só existe um número que não cresce,
que lentamente quererá mais morte.
Mas prontamente me golpeia a consciência
e vejo esta maré sem pulsar,
mas com o pulsar das máquinas
e os militares mostrando seu rosto de parteira,
cheio de doçura.
E o México, Cuba e o mundo?
Que gritem esta ignomínia!
Somos dez mil mãos a menos
que não produzem.
Quantos somos em toda a pátria?
O sangue do companheiro Presidente
golpeia mais forte que bombas e metralhas.
Assim golpeará nosso punho novamente.
Como me sai mal o canto
quando tenho que cantar o espanto!
Espanto como o que vivo
como o que morro, espanto.
De ver-me entre tantos e tantos
momentos do infinito
em que o silêncio e o grito
são as metas deste canto.
O que vejo nunca vi,
o que tenho sentido e o que sinto