Celso Lungaretti: 'Homicídios bestiais como o do Carrefour têm de despertar nosso mais veemente repúdio, qualquer que seja o perfil da vítima'
Homicídios bestiais como o do Carrefour têm de despertar nosso mais veemente repúdio, qualquer que seja o perfil da vítima
Como revolucionário que sou desde os 17 anos e como jornalista desde os 22, sempre detestei o maniqueísmo e as versões panfletárias dos acontecimentos, provenham de que lado provierem, o deles ou o nosso.
Por quê? Simples. Porque revolucionários existem para despertar a consciência dos explorados e oprimidos, não para manipulá-los de maneira diferente da manipulação que sofrem da classe dominante, ou seja, fazendo quase a mesma coisa com os sinais trocados.
Se os explicarmos da maneira correta, na grande maioria desses acontecimentos as mazelas da exploração do homem pelo homem são o motivo último.
Então, para que exagerá-los, analisando-os de forma tendenciosa e estereotipada? É uma distorção desnecessária e que, ademais, nos sujeita ao risco de sermos desmentidos e perdermos nossa credibilidade.
Vide o chocante assassinato de João Alberto Silveira Freitas pelos capangas do Carrefour. Elio Gaspari acertou em cheio na sua coluna dominical:
“Desigualdade não explica esse tipo de assassinato. Eles são produto da demofobia, onde o racismo tem um papel funcional, pois a cor identifica as pessoas sem direitos“.
Percebe-se claramente que as bestas-feras foram tomadas de fúria desmedida por ele ter reagido com um mísero soco, como quem atinge um gigante com uma pedrada de estilingue e recebe de volta uma rajada de metralhadora.
Então, por ele ser negro, ou pobre, ou ambos, aqueles ferrabrases sentiram-se à vontade para descarregarem no Beto todas as suas frustrações de indivíduos medíocres e perdedores das batalhas da vida, relegados a uma função que muitos cidadãos teriam vergonha de desempenhar.
Agora, ficaremos nessa guerrilha virtual de interpretações polarizadas e mutuamente excludentes, uns vendo racismo demais no episódio e outros fingindo que não houve racismo nenhum.
E o principal acaba sendo escamoteado, embora devêssemos, pelo menos nós da esquerda, proclamá-lo em alto e bom som, ao invés de priorizarmos a capitalização de efemérides:
Nenhum ser humano, seja negro ou branco, homem ou mulher, gay ou hetero, rico ou pobre, esquerdista ou direitista, compatriota ou estrangeiro, merece ser massacrado e exterminado como aquelas imagens dantescas nos mostraram.
(por Celso Lungaretti)