Democracia comunista

Marcelo Paiva Pereira: ‘Democracia comunista’

Marcelo Paiva Pereira
Marcelo Paiva Pereira
Imagem gerada pela IA do Bing -  9 de setembro de 2024 às 4:45 AM
Imagem gerada pela IA do Bing –  9 de setembro de 2024 às 4:45 AM

Notícias divulgadas na internet e nos telejornais tem informado que o governo da Venezuela revogou, aos 7 de setembro, a autorização concedida ao governo brasileiro para assumir a custódia da Embaixada da Argentina em Caracas (capital venezuelana), na qual estão seis opositores ao governo de Maduro, notoriamente comunista.

A decisão do governo daquele país foi em razão do surgimento de (supostas) provas de que, naquelas dependências, havia ‘atividades terroristas’ e ‘tentativas de homicídio contra o presidente Nicolás Maduro e a vice Delcy Rodriguez. Fundamentaram-na os preceitos de justiça do País e as Convenções de Viena, sem outros esclarecimentos.

Desde o dia anterior, mencionada Embaixada encontra-se cercada por duas patrulhas da Agência de Inteligência (Sebin) e outras duas da Polícia Nacional Bolivariana (PNB), além de haver um posto de controle instalado nos arredores por agentes do governo de Maduro, com a finalidade de verificar a identidade dos transeuntes.

O local está sob a custódia do Brasil desde o início de agosto, quando o governo da Venezuela expulsou do país o embaixador argentino após o presidente argentino Javier Milei ter afirmado que foram fraudadas as eleições de julho, em que Maduro foi reeleito presidente.

Contra esse impasse diplomático o governo argentino pediu, ao procurador do Tribunal Penal Internacional, solicitar uma ordem de prisão contra Nicolás Maduro e outros líderes venezuelanos. O governo brasileiro, por sua vez, informou que somente deixará a custódia da Embaixada da Argentina após o governo da Venezuela determinar outro país para custodiá-la.

Referido impasse diplomático que envolveu a Argentina e o Brasil contra a Venezuela mostra a verdadeira imagem do regime político (ou de governo) lá existente. Em vez de democracia, exerce a autocracia (ditadura), sem espaço para as liberdades individuais (inclusive políticas).

O comunismo é um modelo econômico de distribuição de riqueza em que a distribui ao povo sem distinção de classes sociais e as iguala pelo mesmo padrão econômico, assim tornando-os comuns uns aos outros. Os direitos individuais são limitados – até mesmo tolhidos – em benefício dos direitos sociais e da tutela do bem comum praticada pelo Estado.

Sem a tutela dos direitos individuais desaparece a democracia e surge a ditadura, mascarada de revolução popular (ou bolivariana, como aconteceu na Venezuela), na qual os líderes controlam o povo conforme os interesses do Estado e não mais conforme a vontade popular. Esta é a democracia comunista que ocorre na Venezuela, um país sem garantias às liberdades individuais (e políticas) e sem segurança jurídica contra a opressão do Estado ao povo e aos opositores do governo.

Conclusivamente, o comunismo se opõe à democracia por faltar a liberdade individual. Sem esta o Estado se torna injusto, por reduzir os indivíduos ao controle da vontade estatal. Este é o exemplo dado atualmente pela Venezuela, sob o governo de Nicolás Maduro, cujas condutas políticas desde julho de 2024 têm sido contestadas pelos governos de vários países da América do Sul, da Europa, dos Estados Unidos da América e pela ONU. Nada a mais.

Marcelo Augusto Paiva Pereira

Contatos com o autor




Artigo de Celso Lungaretti: 'RECADO AO FERREIRA GULLAR: OS LUGARES COMUNS DOS DESINFORMADOS NÃO RENDEM POESIA QUE PRESTE…'

FERREIRA GULLAR VIAJA NA MAIONESE. PRECISA TOMAR CUIDADO, OU VIRARÁ UM REINALDO AZEVEDO QUALQUER!

 
Náufrago da Utopia

 

Gente desiludida é um bicho mais complicado ainda…

O

– O que esse jornal afirma –disse-lhe eu– dá a entender que o comunismo não acabou.

– E não acabou mesmo –respondeu ela. O que acabou não era o comunismo verdadeiro.

Ou seja, como ela necessitava acreditar no sonho marxista, tudo o que ocorreu, desde a revolução soviética de 1917 até hoje, era falso comunismo. Nem Lênin, nem Stalin, nem Mao Tsé-tung, nem Fidel Castro: nenhum deles era comunista de verdade. Só ela e seu pequeno grupo de universitários.

Por isso, digo que gente é bicho complicado. Claro que nem todo mundo chega ao exagero dessa jovem carioca, mas cada qual à sua maneira inventa uma realidade que só existe em sua mente.

Livros para principiantes há aos montes

Para encurtar o assunto:

  • Gullar ignora que, de acordo com Marx, o socialismo (não o distante comunismo) chegaria com a superação do capitalismo, começando pelas nações economicamente mais desenvolvidas, que arrastariam as restantes na sua esteira, pois são as pujantes que determinam a direção para a qual se encaminham as demais. Então, longe de ser uma realidade que só existe na sua (da jovem carioca) cabeça, faz todo sentido falarmos que a URSS de Stalin, a China de Mao e a Cuba de Fidel não eram socialistas de verdade, pois nelas a revolução precisou cumprir uma etapa anterior (eram tão atrasadas que os revolucionários precisaram, antes, criar, ou tentar criar, a infra-estrutura básica de uma economia moderna), e tendo de fazê-lo sob ataques militares, bloqueios, embargos e ameaças terríveis dos gigantes capitalistas, acabaram por resvalar inexoravelmente para o totalitarismo.

este texto). 

O certo é que o capitalismo teve a oportunidade de instalar-se plenamente e construir uma sociedade à sua imagem e semelhança: o inferno pamonha que está aí, na definição ferina do Paulo Francis.

Não se iguale aos anticomunistas profissionais, Gullar!

Até agora as tentativas de construção do socialismo se deram nos países que Marx considerava os mais inadequados para tanto, havendo um abismo entre o sonho marxista do advento do reino da liberdade, para além da necessidade e as toscas ditaduras que invocaram o nome do velho profeta em vão.

Recomendo ao Gullar que passe a opinar apenas sobre aquilo de que realmente entende. Se não, acabará se igualando a qualquer Reinaldo Azevedo da vida. 

[Aquele que já papagaiou centenas de vezes que os resistentes armados não queriam libertar o Brasil da ditadura, mas apenas instalar outra ditadura, como se tais intenções remotas tivessem qualquer importância no contexto das lutas contra o despotismo e o terrorismo de estado, nas quais a regra de ouro, segundo o entendimento civilizado, é que os cidadãos têm o direito e até o dever de pegarem em armas contra uma tirania, pouco importando qual o desenho de sociedade ideal que trazem nas mentes.]

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Artigo de Celso Lungaretti: 'JOVEM MARX x MARX AMADURECIDO, NA ÓTICA DE CELSO LUNGARETTI E DALTON ROSADO.'

UM SAUDÁVEL DEBATE NO CAMPO REVOLUCIONÁRIO

 

“A troca do trabalho vivo pelo trabalho objetivado,

quer dizer, a manifestação do trabalho social sob 

a forma antagônica do capital e do trabalho, é o

 último desenvolvimento da relação do valor e da

 produção baseada no valor.” (Karl Marx)

Entre revolucionários sinceros há sempre alguns pontos em comum:

  • a crença nos efeitos deletérios do capitalismo;
  • a crença num modo alternativo de relação social;
  • a busca incansável, e até o limite das suas existências, da superação do capitalismo, que implica, sempre, numa retomada de eventuais caminhos fracassados ou lutas perdidas.
Estes são os pontos que nos unem, e a mim e ao Celso Lungaretti, embora tenhamos visões diferenciadas sobre alguns conceitos e formas de encaminhamento da luta pela superação do capitalismo. Isto não nos separa, mas nos une, porque nosso objetivo é o mesmo, e tenho a certeza que qualquer um de nós abdicará das suas verdades no momento em que verificar os possíveis enganos nos quais incidia e ver triunfar a viabilidade da emancipação dos indivíduos sociais a partir de uma saciedade fraterna; humanamente exequível; moralmente superior; e prazerosa no ócio produtivo, capaz de concretizar os mais belos voos do espírito humano.
É justamente por este nosso propósito que vínhamos mantendo em off discussões sobre temas sociais que podem, contudo, ser publicizadas sem nenhum constrangimento, num debate público que considero saudável. Vejamos, p. ex., a questão da análise atual sobre a obra de Karl Marx.

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SOBRE A EXISTÊNCIA DE UM DUPLO MARX

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Estou convencido de que há um duplo Marx, ou seja, um Marx da juventude, ainda tateando nas soluções políticas de enfrentamento do absolutismo governamental de sua época, na qual começavam os primeiros sintomas da primeira revolução industrial inglesa que viria a seguir, e outro, derivado de sua análise dos conceitos dos clássicos da economia política, que o levou à elaboração de sua crítica, cujo teor modificou o objeto de seus conceitos sobre o que deveria ser feito revolucionariamente.

 

Na primeira metade do século XIX, o mundo ocidental europeu estava convulsionado pela transição do modelo monárquico feudal para o modelo republicano como reflexo da revolução francesa. Os preceitos filosóficos iluministas, com suas bandeiras pseudo-libertárias de igualdade, fraternidade e liberdade, trazia como leitmotiv a necessidade de introdução do trabalho abstrato como forma de atendimento das exigências da emergente burguesia comercial e industrial.
Marx, profundo conhecedor da filosofia e do direito graças à sua boa formação intelectual, e com seu sentimento de emancipação revolucionária que dividia o campo das ideias anti-monárquicas absolutistas (os socialistas utópicos e socialistas científicos; os jacobinos e girondinos; e por aí vai), interveio com ideias de aglutinação dos trabalhadores, mais numerosos, obviamente, que a classe patronal e seus representantes da política, no sentido de que eles tomassem consciência de suas próprias forças.

É com a idade de 40 anos que têm início os estudos de Marx sobre a crítica da economia política, começando a se aprofundar na compreensão crítica sobre a natureza da forma-valor. Isto se deu a quando passou a residir em Londres, fugindo das perseguições. Teve, então, acesso ao que havia de melhor sobre economia (as obras dos economistas burgueses Adam Smith, David Ricardo, James Stuart Mill, e outros luminares no pensamento econômico e da positivação dos méritos da relação valor-trabalho) na melhor biblioteca do mundo, a British Library (hoje com mais de 150 milhões de itens), na qual passava horas e horas estudando os clássicos da literatura mundial. Assim ele pôde chegar a conclusões admiráveis.

Os Grundrisse são rascunhos escritos por Marx em 1857/1958, com mais de 1.000 páginas, que serviram como base de estudos para a sua magnum opusO capital. Este primeiro estudo, destinado a anotações e reflexões, pela liberdade de exposição dos seus próprios pensamentos (ele não tinha a intenção de publicá-los, pois deveriam servir apenas como informações e conclusões a serem resumidas posteriormente), contém mais elementos de elucidação sobre a forma-valor do que o extrato sucinto contido nos três livros de O Capital. Observe-se que somente após a morte de Marx, em 1883, é que foram publicados os outros livros constitutivos de O Capital, graças aos esforços de Friedrich Engels, seu companheiro de lutas, e os Grundrisse já bem depois da 1ª Guerra Mundial.
As conclusões sobre o conteúdo do O Capital geralmente excetuam a importância da primeira parte, que trata do fetichismo da mercadoria e se constitui num importante elemento da teoria marxiana do valor. O excerto dos Grundrisse, intitulado Contribuição para a crítica da economia política, pouco divulgado (apesar de publicado), é certamente um testemunho da virada de Marx no que diz respeito ao caráter político de suas obras anteriores.


Ali, ele demonstra o quão negativa é a relação social sob a forma-valor e, consequentemente, a sua administração política sob qualquer forma. Aqui, nasce outro Marx, cuja correta interpretação nos dá uma nova concepção de luta contra o capitalismo.
Os marxistas tradicionais que se situam no campo da crítica aos modus operandi pós-revolucionários, avaliam que houve uma deturpação burocrática do combate ao capitalismo por dirigentes como Stalin e Mao Tse Tung; já os adeptos da crítica radical à forma-valor e à dissociação de gênero, adeptos das teses marxianas da crítica da economia política, admitem que o capitalismo de estado praticado pelos revolucionários marxistas-leninistas não poderia gerar outra coisa senão uma inevitável abertura para o capitalismo liberal, graças à necessidade de expansão que os fundamentos capitalistas exigem como forma de sobrevivência. Esta é a divisão de concepções no campo marxista.

A compreensão de Marx sobre a natureza da forma-valor fê-lo compreender que a questão principal não é a luta pela justa distribuição do dinheiro, coisa impossível de acontecer graças à sua essência autotélica, tautológica, e de necessidade de uma eterna acumulação na qual, tal qual um moloch insaciável, ele transforma a riqueza material (o objeto em si) em riqueza abstrata (a mercadoria) e assim encaminha a destruição da sociedade a partir de seu modo de relação social destrutivo e autodestrutivo; fê-lo compreender que a questão é a superação da própria forma-valor (dinheiro e mercadorias) como modo de relação social e não a sua administração.


Esse entendimento muda completamente todas as concepções marxistas tradicionais (e suas variantes trotskistas, anarquistas, etc.) de luta política, que entronizou e endeusou o trabalho e o trabalhador como sujeitos da emancipação. A crítica à forma-valor defende um modo de relação social de produção livre das amarras fetichistas do sujeito automático dessa mesma forma-valor, mensuração abstrata da riqueza material. Tal concepção altera totalmente os métodos de luta revolucionária, sem abdicar dela, mas, ao contrário, tornando-a consistente no longo prazo, ainda que mais difícil de ser compreendida.
A teoria crítica da forma-valor e sua luta revolucionária, embora seja de mais difícil compreensão teórica, agora vê seus postulados se aproximarem da realidade, no momento em que o capital, cujo Deus é o trabalho, nega-o aos seus súditos.


Estamos mais próximos da aurora da emancipação humana, e esperamos que isio ocorra antes de sucumbirmos na barbárie capitalista; e, se assim for, terá sido Marx quem mais contribuiu teoricamente nesse sentido.

CELSO LUNGARETTI
CONCORDAMOS NO FUNDAMENTAL
O (ainda mais) jovem Marx

O companheiro Dalton Rosado considerou que haveria ganho para nossos leitores se tornássemos públicas algumas ideias que vínhamos trocando por e-mail. Não creio que seja o caso de falarmos num debate, pois se trata mais de nuances do que, propriamente, de visões diferentes dentro do campo revolucionário. Mas, vamos lá.

Há um sem-número de polêmicas de schoolars marxistas sobre os méritos relativos do jovem Marx e do Marx amadurecido (eis um exemplo característico dessas pendengas de doutos acadêmicos, que mais parecem teólogos medievais discutindo o sexo dos anjos…).

Temo que, por eu haver feito uma referência um tanto imprecisa a jovem Marx, o Dalton tenha pensado que eu estivesse tomando partido na discussão bizantina acima referida. E, como as posições defendidas pelo grupo Crítica Radical e pelo Dalton em particular se baseiam nos textos de Marx conhecidos como Grundrisse, de 1857/8 (portanto, do Marx amadurecido), seria este o motivo de sua delicada reprimenda.

Ocorre que, mesmo na minha longínqua fase de aprendizado marxista, quando deglutia cada frase do meu novo ídolo como se  estivesse ajoelhado diante da tábua dos dez mandamentos, o único livro marxista importante que não me passou pela garganta foi O capital. Até do igualmente complexo A ideologia alemã consegui terminar a leitura. Mas, depois de umas 50 páginas daquele monumental tratado de economia política, conclui era simplesmente intragável para o meu gosto.

Na minha opinião de leigo assumido no assunto, contudo, nada enxergo de substancialmente errado na leitura que o filósofo e ensaísta alemão Robert Kurz fez de alguns trechos das Grundisse, deles derivando sua crítica do valor.

…e em 1882, um ano antes da morte.

Nem sequer me pareceram uma grande novidade, pois a antevisão que eu tinha do ponto de chegada da longa marcha revolucionária era exatamente a de uma sociedade sem governo nem Estado e muito menos patrões, na qual se produzisse coletivamente o realmente necessário (não o suntuário e o supérfluo) e se distribuíssem equitativamente os frutos do trabalho para as pessoas, atendendo sempre às suas reais necessidades e  deixando-as com tempo livre para buscarem individualmente outras satisfações, de forma a poderem realizar-se plenamente como seres humanos. Valorpreço e dinheiro não teriam lugar numa sociedade dessas.

A minha ressalva ao Marx amadurecido é outra: depois de haver, tanto quanto os anarquistas, acreditado que uma onda revolucionária varreria o mundo, priorizando, portanto, a organização internacional dos trabalhadores, ele foi sendo seduzido aos poucos pela ideia da ditadura do proletariado, lançada pelo jornalista comunista Joseph Weydemeyer em 1852.

Até que o brutal esmagamento da Comuna de Paris (1871) pelos invasores alemães, em conluio com reacionários franceses, impactou profundamente em Marx e ele, quatro anos depois, em sua Crítica ao Programa de Gotha, extraiu conclusões autoritárias do ocorrido. Passou a admitir que a revolução eventualmente ocorresse num só país e tivesse de tomar as medidas necessárias para defender a sua existência.

Engels foi mais explícito ainda nos exageros e radicalismos desta nova visão, ao rebater críticas:

Comuna de Paris esmagada: banho de sangue.

Uma revolução é certamente a coisa mais autoritária que existe; é o ato pelo qual uma parte da população impõe a sua vontade à outra parte por meio de espingardas, baionetas e canhões – meios autoritários, caso estes existam em tudo; e se o grupo vitorioso não quiser ter lutado em vão, deve manter esta regra por meio do terror que as suas armas inspiram aos reacionários. Será que a Comuna de Paris teria durado um único dia se não tivesse feito uso da autoridade armada do povo contra os burgueses?

Idem Lênin, que, no seu O Estado e a Revolução (vide aqui), foi buscar em frases trovejantes de Marx sobre a tragédia dos communards a justificativa para a ditadura do proletariado – afinal, o velho barbudo colocara que “quebrar a máquina burocrática e militar do Estado” era “condição prévia de qualquer revolução verdadeiramente popular”.

Ora, após tal quebra, se faria, evidentemente, necessária a construção de outra máquina burocrática e militar do Estado, para o novo governo resistir aos inimigos internos e externos. Lênin fez a ressalva que a missão do tal governo seria preparar as condições para sua progressiva obsolescência, até a extinção, com as funções da máquina burocrática sendo assumidas pelos cidadãos comuns como parte de sua rotina e a máquina militar sendo desmontada à medida em que não houvesse mais inimigos contra os quais se defender, pois o socialismo aos poucos se estabeleceria no conjunto das principais nações, tal qual ocorrera com o capitalismo.

Estátua do Stalin derrubada pelos húngaros em 1956 

Como anarquistas e até o jovem Trotsky profetizaram, foi por tal caminho que se chegou ao pesadelo stalinista, pois ao invés de o Estado ir minguando aos poucos, cresceu desmesuradamente, sob a égide da nomenklatura que gerou. A previsão sinistra de Trotsky em 1903, quando de sua ruptura com Lênin, acabaria se confirmando integralmente: primeiro, o partido substitui o proletariado; depois, o Comitê Central substitui o partido; finalmente, um tirano substitui o Comitê Central.

Para não nos alongarmos em demasia, Marx abriu uma fresta para o autoritarismo, Lênin a tornou uma porta e por ela Stalin entrou, arrombando-a com um pontapé, para impor um totalitarismo assustador, que tornaria execrável a imagem da revolução para o proletariado das nações cujas forças produtivas estavam mais desenvolvidas – o sujeito revolucionário por excelência, na visão de Marx.

A partir daí, as tomadas de poder se deram em países de desenvolvimento econômico tardio e/ou incipiente, acabando todas essas experiências por fracassarem de uma ou outra maneira (ora resvalando para a barbárie como o Camboja sob Pol Pot, ora esmagadas a ferro e fogo como Allende no Chile, ora se descaracterizando e aburguesando como os governos petistas no Brasil). Marx nisto tinha total razão: são as nações economicamente mais pujantes que determinam para onde o mundo marchará, não as miseráveis e/ou periféricas.

Derrocada petista destruiu ilusões reformistas

A minha visão é inspirada em livros trotskistas como A revolução traída (do próprio) e a trilogia dos profetas (além de várias outras obras) do historiador Isaac Deutscher; Marxismo soviético, do Marcuse; O fantasma de Stalin, do Sartre; Autobiografia de Federico Sánchez, do Jorge Semprún, dentre outros.
Meu enfoque predominantemente político e o predominantemente econômico do Dalton convergem no principal: o capitalismo está nos estertores, devendo ser levado de roldão pelo sinergia da megacrise econômica global que vem engendrando com os desastres ambientais aos quais sua ganância incontrolável nos está arrastando.
Acredito que, em termos imediatos, não devamos participar desse Estado que está podre até a medula, mas sim atacá-lo de fora  – até porque não existem esperanças de aperfeiçoá-lo, corrigi-lo ou atenuar sua perniciosidade (isso é impossível, como os petistas acabaram de comprovar).
Não estão dadas, claro, as condições para tentarmos o assalto aos céus neste instante, mas precisamos acumular forças e preparar líderes que, nos momentos cruciais que teremos pela frente, saibam unir os homens para  a sobrevivência e, depois, para a reconstrução da sociedade sob o primado do bem comum. [Janelas revolucionárias inevitavelmente surgirão. Precisamos aproveitá-las, como em 1917 e 1949, ao invés de deixarmos as chances escaparem entre os dedos, como em 1968.]

 Crítica Radical foi muito atuante na luta por Battisti

Também é mais ou menos o que já faz o Crítica Radical, ao lançar propostas como o fim do trabalho e o Não vote!, bandeiras que por enquanto ainda não têm chances de empolgarem contingentes mais amplos, mas são sementes plantadas para o futuro e servem para o aprendizado na prática daqueles que terão um papel a desempenhar na construção de tal futuro.
Então, mais premente do que discutirmos qual foi o pecado original (se a definição de valores para medir o trabalho humano ou a emasculação do ideal revolucionário pela concepção autoritária de ditadura do proletariado) é somarmos forças para salvarmos a humanidade do capitalismo.

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Artigo de Celso Lungaretti: 'CONY DESEJA QUE DILMA E LULA SE F… RAUL E OBAMA JÁ ESTÃO NUS NA CAMA'

Celso Lungaretti – CONY DESEJOU QUE DILMA E LULA SE F… O TROCO FOI UM CHUTE NA VIRILHA

Por Celso Lungaretti, no blogue Náufrago da Utopia.

 

O jornalista e escritor Carlos Heitor Cony se tornou nonagenário duas semanas atrás.

Como não sou preconceituoso nem grosseiro, descartarei o peso da idade como causa de sua coluna infeliz deste domingo de Páscoa. Apenas lembrarei que celebridades idosas tendem a superestimar a própria genialidade e, às vezes, exageram na dose. Sabem como é, apos passarem tanto tempo sendo bajulados, acabam por acreditar no confete que os áulicos derramam incessantemente sobre eles.

O pomo da discórdia são os parágrafos finais de seu texto tedioso-divagativo O felix culpa. Estes:

A Páscoa é o ponto mais alto do calendário cristão, de certo modo, é a continuação de uma das mais importantes festas do judaísmo, o Pessach, que o próprio Cristo comemorou pouco antes de ser traído e morrer no calvário.

Enquanto a Páscoa cristã celebra a ressurreição de seu fundador, o Pessach relembra a noite em que os judeus se libertaram do jugo egípcio.

É uma festa de liberdade em que um povo inteiro prefere passar 40 anos no deserto, mas se liberta do cativeiro.

Agnóstico por convicção, gosto de comemorar as duas páscoas. Evito o terrível cativeiro de me tornar refém de Dilma e Lula. Desejo que ambos se f…

achado não é tão novo assim. Lembrei-me logo da música “Zebedeu”, que Sérgio Ricado gravou em 1967, quase meio século atrás. Refere-se a um violeiro que canta suas desventuras para os transeuntes, mas acaba irritado por não lhe darem esmolas e, ademais, zombarem dele e dos filhos. Então arremata:

A risada dos presentes, pelo amor de Deus/ Traz o sono à minha gente, pelo Zebedeu/ Eu encerro a cantoria, pelo amor de Deus/ Mandando vocês à merda, pelo Zebedeu.

Achei que Dilma e Lula entraram de gaiatos nessa incomum crônica pascal. Não vi motivo para o Cony citá-los, muito menos de forma tão estridente.

Mas, como sempre faço nesses casos, repudio também os que dão chutes na virilha como troco, assassinando reputações na base do ouvir dizer.

Um daqueles jornalistas que defendem incondicionalmente o petismo correu a comparar a besteirinha atual com dois editoriais golpistas publicados pelo Correio da Manhã (RJ) ás vésperas da derrubada de João Goulart: o Basta e o Fora. Cometeu exagero similar ao que vituperou.

Para começar, editoriais são a voz do dono, ponto final. Pouco importa quem o coloque no papel, tal profissional está apenas expressando a posição do veículo que o emprega.

E tem mais: o rumor de que teria sido ele o escrevinhador de tais editoriais, difundido por Elio Gaspari, foi desmentido pelo próprio Cony, que assim relembrou o episódio:

Até hoje não se sabe quem escreveu o Basta e o Fora, atribuídos a Edmundo Moniz, que era o nosso redator-chefe. (…)

Na crise de 1964, os editoriais eram discutidos exaustivamente pela equipe liderada por Moniz e da qual faziam parte Otto Maria Carpeaux, Osvaldo Peralva e Newton Rodrigues, entre outros.

Eu estava recém-operado, no meu apartamento em Copacabana, e Edmundo Moniz, que ia me visitar todos os dias, telefonou-me para comunicar que Carpeaux desejava pisar forte, com um editorial virulento contra Jango. O próprio Carpeaux sugerira que Moniz me consultasse, uma vez que nós dois éramos afinados, tanto em política como em literatura.

Minha participação limitou-se a cortar um parágrafo e acrescentar uma pequena frase. Hora e meia mais tarde, Moniz telefonou-me outra vez, lendo o texto final que absorvia a colaboração dos editorialistas, e, embora o conteúdo fosse o piloto elaborado por Carpeaux, a linguagem traía o estilo espartano do próprio Moniz.

Quem respeita as boas práticas jornalísticas, nestas situações nunca omite que o acusado negou a acusação. O leitor que tire suas conclusões.

De resto, Cony tem muitos altos e baixos na sua trajetória. Eu mesmo já o critiquei duramente, mas sem cometer injustiças nem fazer-lhe imputações duvidosas. Neste artigo.

Mas, assim agi porque ele tinha atropelado um princípio fundamental para jornalistas e para revolucionários: a firme rejeição a toda e qualquer forma de censura.

Nunca escreveria com tanta indignação na defesa de políticos, ainda mais quando se trata de presidentes e ex-presidentes cujos governos não foram revolucionários.

Talvez eu seja um pouco antiquado, mas sempre esquivei-me de qualquer identificação com o poder e suas benesses. Pois concordo inteiramente com o Millôr Fernandes quanto a jornalismo ser oposição, o resto não passando de armazém de secos e molhados. E, se a independência significa tanto para um jornalista, ainda mais imprescindível é para um revolucionário.

Numa sociedade capitalista o poder realmente corrompe. Fede tanto quanto esgoto, carniça e petrolões.

A LOVE STORY ENTRE CUBA E EUA, SEGUNDO DALTON ROSADO: A FOME DO MOLOCH CAPITALISTA DESNUDA A FARSA POLÍTICA.

 
Por Dalton Rosado.

O convívio fraterno entre os povos deve ser uma condição de coexistência saudável. Neste sentido, a reaproximação de Cuba com os Estados Unidos poderia ser elogiável, se não derivasse de um interesse econômico negativo na sua essência constitutiva original.

Há sutilezas nessa reaproximação que denuncia uma identidade que por 57 anos (1959 a 2016) permaneceu oculta. Trata-se da base capitalista que, durante tal período, permeia as relações de produção nas duas nações.

Ambos os países, embora com orientações políticas diferenciadas no que diz respeito à forma de comando governamental e à propriedade dos meios de produção (empresas produtoras de mercadorias), mantêm uma identidade quanto à forma mercantil da produção; ou seja, ambos os países produzem mercadorias, subordinadas às regras de mercado, à forma-valor e à mediação pelo dinheiro, modo de produção que tem uma lógica própria, fetichista, egocêntrica, excludente e segregacionista, ainda que sejam politicamente diferentes (aspecto de menor monta).

Acaso o enrolador de folhas no tabaco cubano, que produz os seus inigualáveis charutos, recebe, após um dia de trabalho a quantidade de valor que ele produziu na empresa estatal? Evidentemente que não, pois, se isto ocorresse, não existiria o capital estatal comunista.

Acaso o operário estadunidense recebe o valor integral produzido após uma jornada diária de trabalho? Evidentemente que não, pois essa é a fonte da acumulação capitalista privada e de sustentação do Estado liberal capitalista.

É justamente a produção de valor, aliada à apropriação indevida desse valor, aquilo que faz a roda do capitalismo girar, seja ele estatal ou privado, e essa é a identidade capitalista entre Cuba e EUA, razão primeira das suas necessárias aproximações no plano comercial, guardadas as diferenças no plano político.

Não é por acaso que Barack Obama em seu discurso falou da importância do intercâmbio comercial entre os dois países e do incremento de atividades empresariais de pequeno porte, no que foi aplaudido por Raul Castro. É que ambos precisam urgentemente da reprodução do capital nesses tempos de desemprego estrutural mundo afora e de depressão econômica fruto do limite interno absoluto do capitalismo como forma de suas próprias sobrevivências políticas, embora isso seja negativo para o povo.

A fome do moloch capitalista desnuda a farsa política.

O autor, Dalton Rosado, é advogado, escritor e compositor. Foi secretário de Finanças de Fortaleza no governo de Maria Luíza Fontenele.

 

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O REMÉDIO PARA TIRAR O BRASIL DA UTI: ELEIÇÕES LIVRES, GERAIS E LIMPAS!

TEORI NÃO ASSISTIU A “O VEREDICTO”

DILMA, ACABOU. NÃO TEM MAIS JEITO.