Marcelo Paiva Pereira: 'A Revolução de 64'

Marcelo A. Paiva Pereira

A REVOLUÇÃO DE 1964

Neste mês de março de 2019 muito se comentou sobre a Revolução de 31.03.1964 ocorrida no Brasil.

Enquanto uns afirmam não ter sido instaurada uma ditadura militar, muitos outros afirmam tê-la ocorrido, ao longo de 21 anos (até 15.01.1985) quando da eleição, pelo Colégio Eleitoral, de Tancredo Neves para presidente do Brasil.

Referida Revolução ocorreu num contexto sócio-político bem maior – de amplitude mundial – denominado Guerra Fria, em que Estados Unidos da América (EUA) e a União Das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) disputaram a hegemonia militar e política ao redor do mundo.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945) ressurgiu o temor pelo avanço comunista, existente desde o sucesso da Revolução Russa (1917) até a eclosão da mencionada guerra.

A consolidação dos ideais marxistas sob a forma do Estado Soviético (URSS) amedrontou a população dos demais países, que não queria a estatização dos bens de produção, da propriedade privada nem a redução da personalidade individual (convertendo-os em camaradas). A “capitis diminutio” não era opção.

A Guerra Fria (1945 a 1991) foi o período em que a URSS quis conquistar os países capitalistas em geral e os EUA em especial, com vistas a converter o mundo numa sociedade comunista, em que todos fossem iguais (camaradas) em todos os lugares.

Dentro desse panorama o Brasil foi governado pelo presidente João Goulart (1961 a 1964), conivente com as forças políticas socialistas e comunistas. A administração dele as favorecia em detrimento das forças de oposição (de direita). Havia um clima social e político de desconforto por vários segmentos da população, que temiam o avanço comunista no Brasil, assim como ocorreu na Europa após a revolução bolchevique (1917).

Um segmento muito grande da sociedade brasileira não queria ser camarada de ninguém, muito menos ser subserviente a Marx ou a Nikita Khrushchev (1953-64) nem ao sucessor, Leonid Brejnev (1964-82). As liberdades individuais eram muito queridas pela população brasileira e estavam ameaçadas.

O golpe militar ocorrido em 31.03.1964 teve a finalidade de restabelecer a ordem social e política do país e garantir o exercício das liberdades individuais que estavam sob a ameaça socialista e comunista (ideologias de esquerda). Milhares de pessoas saíram às ruas para comemorar o golpe militar e o fim do governo vigente.

As mais diversas pessoas ostentavam a bandeira nacional, outras a bandeira estadual, enquanto ainda outras expunham faixas e cartazes de felicitação e apoio aos militares. O clima de felicidade e alívio foi contagiante e propagou-se por todo o país.

Os ativistas de esquerda, contudo, ofereceram resistência ao movimento militar que expulsou da administração pública os dirigentes e coniventes daquela ideologia e o novo governo reagiu às sucessivas atividades tidas ilegais (à luz da legislação do período), por vezes premidas de terrorismo, que visavam derrubar o governo mediante a desestabilização da ordem social e política do país.

O resultado foi o período conhecido e rotulado de ditadura militar. Independente de qualquer rotulação (ou denominação), referido período foi muito bom a quem nada devia à lei, à Justiça nem à ordem política e social. À quem a elas se opunha, delas era expulso (Brasil: ame-o ou deixe-o) ou prestava contas às autoridades. Nada a mais.

 

Marcelo A. Paiva Pereira
O autor é advogado




Celso Lungaretti: 'Eremias Delizoicov temia a eventualidade de ser lembrado como mais um que fraquejara na hora da verdade. Mas foi muito além do que dele se poderia exigir, morrendo como um bravo!'

QUE SEJAM ESTES A SERVIREM DE EXEMPLO PARA AS NOVAS GERAÇÕES

Meu saudoso companheiro…

E

Mesmo sendo muito jovens, percebíamos quanto desprestígio acarretara à esquerda a frouxa reação ao golpe. Sentíamos sobre os ombros a responsabilidade de resgatar a credibilidade do nosso lado, provando ao cidadão comum que também tínhamos brios para sangrar pela causa.

Então, quando o Eremias, já militante da VPR, foi cercado pela repressão num sobrado de subúrbio do RJ, não hesitou: mandou bala. Tinha munição e gastou-a quase toda. Aí lançaram uma bomba de gás lacrimogênio e, aproveitando seu atordoamento, invadiram. Um cabo monstruoso, que era judoca e pesava 140 quilos, deu-lhe uma gravata. 

Mas o Eremias se recuperou o suficiente para atirar no braço que enlaçava-lhe o pescoço, libertando-se. Depois, disparou nos outros militares, acertando dois nas pernas. E recebeu 35 balaços no corpo.

Estava com 18 anos. Tinha verdadeiro horror da eventualidade de ser lembrado como mais um que fraquejara na hora da verdade, tal qual os burocratas de 1964 (era assim que os chamávamos). Acabou, pelo contrário, indo muito além do que se poderia dele exigir. Foi um bravo.

Também nunca esquecerei o que o comandante Carlos Lamarca disse a vários de nós certa vez: que, se fôssemos surpreendidos pela repressão ao ar livre, jamais deveríamos misturar-nos com a multidão, usando-a como escudo. 

Poderíamos morrer ou ser presos e torturados, mas não tínhamos o direito de macular nossos ideais, causando a morte de civis. Era essencial mantermos a nossa superioridade moral, como lutadores do bom combate, mesmo nas situações extremas.

Vargas tinha muitos defeitos, mas covarde não era

Minha avaliação sempre foi a de que o Lamarca, sabendo muito bem que nossas últimas chances haviam se esvaído em 1970, só continuou na luta porque não suportava a ideia de por-se a salvo no exterior enquanto tantos de seus seguidores haviam encontrado a morte ou o inferno dos porões. 

Chegou um momento em que passamos a ter vergonha de não compartilhar a sina dos companheiros tombados. Daí havermos marchado insensivelmente para o matadouro. Que diabo faríamos no exterior?!
Por que lembro isto? Para que os mais jovens fiquem cientes do espírito de luta e da disposição para o sacrifício daquela geração. Para que fiquem sabendo que já houve quem arriscasse tudo, inclusive a vida, por aquilo em que acreditava. Que sejam estes a lhes servirem de exemplo.  (Celso Lungaretti, jornalista, escritor e anistiado político, sobrevivente do extermínio da VPR)

aquiassistir ao vídeo de Cantiga Brava, interpretada por Geraldo Vandré

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