Carlos Carvalho Cavalheiro: 'Entre o fascismo e a decepção'

Governos fascistas foram desaparecendo ao final da 2ª Guerra Mundial. Alguns resistiram, como o regime de Salazar e Franco, desaparecidos somente na década de 1970.”

 

Benito Mussolini

O fascismo é um fenômeno político que surgiu primeiramente na Itália, por volta de 1919, tendo como liderança máxima Benito Mussolini. Após a Crise de 1929 e a consequente descrença na capacidade da democracia liberal burguesa em superá-la, subiram ao poder em diversos países governos com algumas características similares, entre as quais se destacam a valorização do nacionalismo, o autoritarismo (ditadura), a perseguição ao comunismo, ao anarquismo e ao socialismo, crença no militarismo e no uso da força e da violência como maneira de atingir os seus objetivos, desprezo pelos direitos humanos, perseguição aos intelectuais e artistas, e o uso da religião como embasamento político.

Assim, ascenderam ao poder os governos nazista (Alemanha), salazarista (Portugal), franquista (Espanha), Estado Novo (Brasil) entre outros, impondo uma ditadura de extrema-direita em que a tônica foi a perseguição e a censura. Esses governos eram chamados genericamente de “fascistas”, tendo em vista o modelo original surgido na Itália de Mussolini.

Governos fascistas foram desaparecendo ao final da 2ª Guerra Mundial. Alguns resistiram, como o regime de Salazar e Franco, desaparecidos somente na década de 1970. Governos ditatoriais – que não possuíam todas as características do fascismo – surgiram, outros se mantiveram, como foi o caso do stalinismo na União Soviética. Na América Latina, nas décadas de 1960 a 1980, prevaleceram governos militares que se aproximaram demasiadamente do fascismo.

O Brasil é um país cuja estrutura agrária e o passado escravocrata reflete um atraso político sem precedentes. Países desenvolvidos preocuparam-se, antes de tudo, em resolver a questão agrária. Em 20 de maio de 1862 o presidente Abraham Lincoln sancionou o Homestead Act (Lei da Fazenda Rural), que limitava o tamanho dos loteamentos, evitando o latifúndio. A Inglaterra já havia feito a sua reforma agrária no século XVIII. Não se trata, portanto, de um preceito socialista, mas antes uma necessidade para o desenvolvimento do próprio capital.

No caso do Brasil, a manutenção do latifúndio representa o atraso, não somente econômico, mas, sobretudo, no pensamento político. Por isso, costumeiramente, grupos que representam os interesses dos latifundiários ligam-se a tendências de extrema-direita, ou seja, fascistas. Isso porque os discursos se alinham aos objetivos de manutenção da mesma estrutura agrária, bem como a legitimação da violência para reprimir os movimentos que lutam pela distribuição justa das terras ociosas.

Por outro lado, os movimentos sociais no Brasil, que se agruparam na esperança de mudanças promovidas por uma legenda partidária, perceberam que as lideranças estavam mais interessadas em participar de esquemas fraudulentos do que promover as reformas que o Brasil tanto necessita. Dentro de uma lógica do fisiologismo, as decisões políticas foram tomadas para favorecimento pessoal e da legenda.

Esses equívocos de percurso afastaram as massas de uma proposta mais avançada de sociedade. Parcela significativa da população esperava, ao menos, uma autocrítica que pudesse revelar a boa intenção na retomada do percurso. Mas não foi isso o que aconteceu e a descrença se converteu em ojeriza. Chegou-se a uma encruzilhada e a decisão do rumo a ser tomado é difícil. Ou apela-se para o que há de mais atrasado no campo do pensamento político ou arrisca-se em apostar novamente em quem cometeu equívocos, mas não teve a humildade de reconhecê-los.  

Apesar de tudo, a democracia ainda é um avanço. Garanti-la como sistema político, neste momento, é um dever.

Carlos Carvalho Cavalheiro – carlosccavalheiro@gmail.com

17.10.2018




Carlos Carvalho Cavalheiro: 'A luta antifascista na região'

Carlos Carvalho Cavalheiro:

‘A LUTA ANTIFASCISTA NA REGIÃO’

 

Nos dias 23 e 24 de junho passados a cidade de Sorocaba sediou um evento que se propôs a comemorar o centenário da Greve Geral de 1917 e os 80 anos da luta antifascista que teve como palco aquela cidade. Ambas as efemérides surgem num momento em que a memória desses eventos se torna de suma importância, tanto para o melhor conhecimento da época em que vivemos, como também como reflexão sobre as raízes históricas das lutas dos trabalhadores, bem como da resistência ao avanço do fascismo.

Nos últimos anos, o Brasil tem observado o crescimento de organizações de extrema-direita, crescimento esse que se coaduna com o comportamento e ação de correntes políticas que apresentam propostas de retirada de direitos conquistados historicamente pela classe trabalhadora.

Esse crescimento da extrema-direita já era um fenômeno observado há muito na Europa. Ana Paula Tostes, em seu artigo “A intolerância desavergonhada: por que a nova extrema-direita cresce”, ao se debruçar sobre o caso europeu afirma que “o crescimento dos votos em partidos de extrema-direita em todas as eleições nacionais ocorridas desde o surgimento destes partidos até o ano de 2008 na Europa ocidental (Portugal, Espanha, Irlanda, Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Itália, Luxemburgo, Reino Unido e Suécia). O resultado é que o crescimento da média de votos em partidos da nova extrema-direita cresceu de 1,36% em eleições do começo da década de 1980 para 7% em eleições de 2008.

Após o deslinde do processo de Impeachment da Presidente Dilma Rousself, em 2016, o que se tem observado é um crescimento no Brasil de organizações de extrema-direita e um avanço de forças política reacionárias sobre os direitos dos trabalhadores. De outro lado, a perspectiva de candidatos de extrema direita para as próximas eleições presidenciais demonstra a necessidade de se proporcionar a reflexão, tanto sobre como se deu o processo histórico de conquistas de direitos dos trabalhadores, quanto o que representa o crescimento e a possibilidade de instauração de um governo fascista e autoritário.

Em 1917 os operários de São Paulo realizaram uma Greve Geral de proporções extraordinárias. Dentre as diversas reivindicações dos operários constavam a redução da jornada de trabalho – que se estendia a mais de 12 horas diárias – a melhorias nas condições de trabalho, além do aumento do poder aquisitivo dos salários que eram carcomidos pela inflação causada em boa parte pela ocorrência da Guerra Mundial (1914 – 1918). Isso demonstra que os direitos trabalhistas não foram resultados de benevolências ou mesmo de caridade ou, ainda, por intervenção divina, mas sim conquistas árduas resultantes das lutas de trabalhadores, muitos dos quais doaram sua vida para que tais melhorias ocorressem. É importante que isso seja salientado, pois vivemos hoje um tempo em que os direitos trabalhistas são atacados de forma pouco cerimoniosa, como se tivessem sido concedidos deliberadamente por aqueles que se colocam no lugar do patronato.

Por outro lado, a iminência de candidaturas com propostas autoritárias, bem como a difusão de movimentos que se colocam como defensores de políticas de exceção, com exclusão de parte da sociedade nas decisões políticas, contrariando os princípios até da democracia burguesa e do liberalismo, exige de nós uma reflexão sobre o que foram os fenômenos do nazismo e do fascismo – e todas as suas vertentes como o integralismo, o salazarismo, o franquismo – para que possamos ter a real dimensão do que são de fato essas propostas. Como dizia a letra de uma música da década de 1980: “o fascismo é fascinante, deixa a gente ignorante e fascinada”.

 

 

Carlos Carvalho Cavalheiro

27.04.2017