Victório Nalesso foi só mais um dos ‘caipiras’ que lutaram na 2ª Guerra (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
O ex-soldado da Força Expedicionária Brasileira (FEB) Victório Nalesso, de 92 anos, esteve de 1944 a 1945 na Itália em combate durante a 2ª Guerra Mundial. Nesta sexta-feira (8), data em que se completam 70 anos do fim da batalha, Nalesso relembra o período e comenta: “Foi a guerra dos caipiras e cablocos, mas todos corajosos. A maioria vivia nas roças, longe das cidades que não eram tão grandes como hoje. Gente de todo interior de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul”, afirma o morador de Itapetininga (SP).
Ex-soldado escreveu livro contando histórias
vividas na guerra (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
O “caipira” que nasceu e sempre viveu na cidade, que hoje tem 155 mil habitantes, conta que mal esperava a hora de voltar para casa, um sítio na zona rural. Assim como ele, muitos dos combatentes também queriam retomar a vida simples do interior. “Sempre tinha alguém com uma sanfona ou uma viola para animar, cantando músicas da nossa terra.”
Nalesso foi convocado a participar da viagem ao continente europeu aos 21 anos junto com um amigo e um primo da cidade. Sem nenhuma experiência militar, o trio primeiro passou por treinamentos por dois meses no Rio de Janeiro. Em 22 de setembro de 1944, Nalesso partiu rumo à Itália em um navio junto com outros 5 mil combatentes de várias regiões do país. Eles chegaram após 15 dias viajando pelo Atlântico.
Desembarcaram em Livorno no norte do país, onde se agruparam com a base da FEB junto com outros 10 mil brasileiros. Logo após 12 dias, saiu rumo à primeira missão junto com sua equipe e teve sua primeira experiência de guerra.
Entrei em um túnel. Lá dentro, encontrei cerca de 20 brasileiros sentados no chão e apoiados na parede. Fui puxando conversa até perceber que eles não respondiam. Quando mexi, eu vi que estavam todos mortos. Foi meu primeiro contato com a morte na guerra”
Victório Nalesso, ex-soldado da 2ª Guerra
“Andávamos por uma estrada de terra no meio da madrugada.O objetivo era chegar a outro ponto de brasileiros. Cada homem andava separado a alguns metros de outro, isso porque se jogassem uma bomba na estrada, iria pegar uma pessoa só. Uma granada acertou o chão a alguns metros de mim. O impacto no ar fez com que eu fosse jogado ao chão e desmaiasse. Como era o último da fila, o resto da equipe seguiu. Acordei minutos depois, sozinho no escuro na mata. Voltei à base onde fui orientado a me encontrar com outro grupo. No meio do caminho entrei em um túnel. Lá dentro, encontrei cerca de 20 brasileiros sentados no chão e apoiados na parede. Fui puxando conversa com eles até perceber que não respondiam. Quando mexi, vi que estavam todos mortos. Foi meu primeiro contato com a morte na guerra, algo que me deixou abalado”, descreve.
Veterano mantém espaço dentro de casa para
acervo histórico (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
Diversos quadros exibem diplomas e certificados
da guerra (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
Mas haveria ainda muito contato com a morte durante o período. Houve mortes de brasileiros e de aliados, além dos alemães. A batalha mais sangrenta de qual participou foi em Montese, a partir de 14 de abril de 1945. “Em três dias de guerra calcularam centenas de mortes. Atuava repondo munição de uma metralhadora ponto trinta junto com outro soldado. Lá, cada um tinha uma função. Um atirava, outro usava a bazuca. Precisávamos ter cuidado, sempre se arrastando ao chão. Ninguém saía correndo em campo aberto, arriscando a vida.”
Do período não guardou só as lembranças ruins, mas algumas boas como os momentos de cantoria e as amizades. Em sua casa mantém um espaço com objetos, livros e revistas sobre a Segunda Guerra Mundial. “Em uma rendição de inimigos, eu guardei comigo um cantil de um sargento alemão chamado Kroger, feito prisioneiro. Guardei também munições, um capacete e minha marmita, além de diversos arquivos. Anos depois no Brasil, depois de me aposentar, resolvi escrever um livro sobre minhas histórias, minha experiência nesse momento importante da história”, ressalta Nalesso.
Durante os oito meses em que ficou no país, o ex-soldado calcula que tenha andado mais de 400 quilômetros, atravessando o norte da Itália até a cidade de Alessandria. Quando estava lá, foi declarado o fim da guerra na Itália, em 2 de maio, e a rendição da Alemanha, em 8 de maio. “Não acreditávamos que tudo tinha acabado, que iríamos embora. Festejamos, fizemos passeata, a alegria era muita. Voltei ao Brasil com várias medalhas, sem nenhum arranhão, a vida inteira pela frente e uma noiva: a irmã do meu amigo que foi à guerra comigo”, finaliza.
Victório Nalesso tem três filhos e foi casado por 67 anos com Lucinda Nunes Nalesso, até ficar viuvo em 2013. O livro que escreveu chamado “Diário de um Combatente” foi publicado em 2005.
Victório também tem fotos que registraram momentos na Itália (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
Balas de metralhadora e fuzil, cantil alemão e revistas são algumas relíquias (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)
Nalesso exibe com orgulho medalhas conquistadas no combate (Foto: Caio Gomes Silveira/ G1)