Antônio Fernandes do Rêgo: 'Flores de amaranto'
Flores de Amaranto
Na vidraça translúcida e orvalhada,
Um vulto nevoento e de bordô
Vi, eras tu em noite de lua plena,
Qual uma sinfonia de Gounod.
À mão esquerda bem transcritas frases
Que escrevíamos a carvão e a giz,
Na mão direita flores de amaranto,
Lembrando o tempo em que se foi feliz.
O que querias em minha janela,
Não precisas dizer, eu mesmo o digo:
Sonhar da juventude o nosso ardor,
A taça que não bebeste tu comigo.
Tu que vens do outro lado, além do rio,
Dos outros ares que o destino quis,
Para trazer-me estes refrãos de amor
Que deixamos nos muros em croquis,
Palavras doces, quantas profecias…
Vem, fala para mim! Sou teu ouvinte,
Desses sonhos risonhos, a canção
Esculpida por nós no século vinte,
Que se eterniza neste coração,
Vem, vem contar os anos que passaram!
Quantos caminhos já por nós trilhados,
Essas lembranças que se me embaçaram.
Nos flocos que do ocaso se levantam
Vejo mensagens, sei que é fantasia,
Mas nos rastros deixados pela estrada
Leio as marcas de tua epifania.
Adormeço e qual um anjo tu levitas,
Isto que todos chamam de ilusões
Eu chamo de vivências de outras eras,
Instantes de sublimes solidões.
Acordo para ver nascer o sol,
Me avisa pela fresta um vento frio
Pra esquecer todas as canções que dizem
“Que não mais voltam as águas do rio,
E que não há mais nada além do arco-íris,
Que toda história de amor tem um final,
Que o fim de um enredo é sempre um ponto,
Que estrada finda lá no terminal”.
Mas se o Sol nos devolve as primaveras,
Esqueço de qualquer canção que diz
Que não retornam vivas emoções,
Que há somente uma vez pra ser feliz.
Antônio Fernandes do Rêgo
aferego@yahoo.com.br