Glenda Brum de Oliveira: 'Aprendendo com o Príncipe'
Aprendendo com o Príncipe
Durante muitos anos critiquei o livro ‘O Pequeno Príncipe’. Achava-o fútil e sem maiores interesses além de uma fábula para crianças. Eu precisei revisitá-lo, por conta de um trabalho escolar do meu filho. E alguns trechos do livro me despertaram para análises que há muito não fazia. Minha maneira de vê-lo modificou-se.
Algumas frases do livro têm efeito devastador, quando compreendemos sua profundidade. Passamos pela vida com o desejo de felicidade e amor. E por mais que se negue, temos a necessidade da aceitação do outro. Por vezes, ficamos tão centrados nas próprias necessidades e desejos egoístas, que esquecemos que temos responsabilidades, com aqueles que cruzam nosso caminho; com aqueles que andam ao nosso lado. Como diz o livro, “somos eternamente responsáveis por aqueles que cativamos”, por exemplo.
Essa responsabilidade é maior quando cativamos o afeto dos que convivem conosco. A vida não para, os cenários e o cotidiano mudam e as pessoas seguem seus rumos. E nem sempre são iguais aos nossos. Mesmo na distância, pequenos gatilhos de lembranças nos fazem recordar as pessoas que nos cativaram e foram por nós cativadas.
Impossível ser indiferente àqueles a quem o carinho ficou guardado no coração. Impossível não perceber que algo está errado só de olhar, quando olhamos com o coração. E não é de estranhar quando uma lágrima rola, pois somente nos emocionamos com aqueles que nós deixamos nos cativar.
A profundidade das nossas responsabilidades, com aqueles que cativamos, passa batida num mundo superficial e materialista. A Bíblia, há milênios, diz que devemos fazer aos outros aquilo que queremos que nos façam. Se a solidão nos assola, nos esmaga, e por vezes parece nos sufocar, porque não olhar para dentro e encontrar a quem perdemos pelo caminho!?
Podemos começar por encontrar a nós mesmos. Depois, encontrarmos os afetos que ficaram pelo caminho da vida; nos interessarmos pelos seus caminhos; prestarmos atenção naqueles que partilham ou partilharam nosso caminhar.
Por que não abrirmos as janelas do coração e permitimos que o sol das emoções entre e aqueça? Que retire o bolor das mágoas e a sujeira dos rancores? Se nada há para ser resgatado, então plantemos novas mudas, cultivemos novos afetos, acarinhemos novos corações. Porque convivência trata-se de cultivar sentimentos, também muito bem colocado pelo livro. Muitos correm o mundo atrás de algo especial, sem perceber que tinham ao seu lado um tesouro. Às vezes é possível resgatar essas relações perdidas; em outras situações, as perdemos para sempre.
A dor pode durar uma noite ou uma vida inteira, depende de como a olhamos e cultivamos nosso coração. A dor pode originar muitos espinhos e multiplicar as dores, mas também pode suavizar o olhar e a cobrança sobre o outro; pode trazer o perdão e novas perspectivas. Podemos olhar as rosas, sentir seu perfume e nos encantarmos com suas diversas cores; ou vermos somente seus espinhos e as mágoas por eles causadas. A beleza ou a dor depende dos olhos que as miram.
Impossível não sentir dor, mas passado a aflição, é um sentimento que podemos abandonar a beira do caminho, a fim de superarmos. De cada dor, deve-se carregar apenas a sabedoria. A amargura deve ser abandonada pela estrada, como pavimentação da nossa jornada de vida. Apenas as rosas e seus perfumes das boas amizades, do companheirismo, do aprendizado e das vitórias devem ser levados, como bagagem de vivência. E somente o calor do amor deve aquecer nosso espírito.
Glenda Brum de Oliveira
glendabrum@gmail.com
Glenda Brum de Oliveira: 'Ucrânia'
Ucrânia
Chora criança assustada.
Chora jovem de esperança destroçada.
Chora mulher, que olha a estrada.
Chora homem, com a família separada.
Chora ancião vendo a terra, novamente devastada.
A guerra não poupa.
Resultado de humanidade louca.
De horda, que se diz douta.
De líderes, que a audição parece mouca.
Não ouvem população, que grita rouca.
Suplicam em coro, que tenham clemência.
Que acabem com a louca divergência.
Evitem as demonstrações de prepotência.
Não tratem o povo com displicência.
Não arrisquem do povo a sobrevivência.
Ucranianos não dormem, por causa da adrenalina.
Vivenciam, na guerra, a carnificina.
Lares em montouros estão em ruína.
Infelizmente a história se repete, não ensina.
Governantes ainda destroem, como aves de rapina.
Glenda Brum
glendabrum@gmail.com
Glenda Brum de Oliveira: 'Narciso e a era digital'
Narciso e a era digital
O mito grego de Narciso fala de uma vaidade exacerbada, acrescida de arrogância e orgulho. Narciso, ao contemplar seu rosto na superfície de um lago, fica tão embevecido com a própria imagem, que não consegue parar de mirá-la. E ali perece de inanição, pois não consegue sair e viver sua vida. Torna-se vítima de uma narcose fatídica, que o impediu de ter a vida longa e plena, profetizada pelo oráculo Tirésias, quando nasceu. Morreu cedo, como escravo e vítima de sua própria beleza, que se tornou sua algoz.
Todos os dias, as mídias derramam conteúdos diversos de diferentes influencers, inundando as redes sociais. A atividade que abre a intimidade, a vida privada torna-se pública e não há limites de exposição. Toda essa exibição busca admiração, seguidores e em alguns casos, suprir a necessidade de segurança em relação a própria imagem. E o pior, muita mentira. Ficção montada para agradar. Tornando-se até roteiro de filmes.
Pode-se argumentar que é apenas trabalho, uma nova profissão, mas por trás há vários pontos a serem considerados, tanto para quem expõe-se, quanto para quem acompanha a exposição alheia.
A realidade difícil e limitada da maioria das pessoas é ‘desinteressante’, diante da vida ‘emocionante’ vivida por celebridades digitais. A ‘monotonia’ da vida cotidiana fica mais colorida, quando ganha as cores da vida alheia contemplada. Olhar as aventuras, o glamour das celebridades nas redes sociais, ‘supre’ a necessidade de emoção e coloca os seguidores num mundo paralelo de realidade virtual. Sentem como se vivessem a vida de quem estão seguindo. E tão absortos ficam nessa praxe, que se esquecem de viver a própria vida. Entram em um estado de narcose, como o Narciso do mito; não paralisados pela própria beleza, mas pela ‘bela vida’ de quem seguem.
Essa contemplação torna-se muitas vezes doentia, tanto para quem segue, como para os que são seguidos. Igualmente há o ego exacerbado, a inércia contemplativa, presentes no mito grego.
Muitos seguidores tornam-se frustrados diante da impossibilidade de vivenciar as mesmas experiências, desfrutar da mesma fama e atenção. Uns se tornam inconvenientes e há os apáticos, pois acham-se derrotados e incapazes.
Os que produzem conteúdo, frustram-se pelo vazio das relações interpessoais; sofrem de ansiedade, pois necessitam sempre ter novidades atrativas e emocionantes, para manter e aumentar a audiência de seguidores ávidos e assim obter seus ganhos financeiros ou suprir o seu egocentrismo.
Seja qual for o caso, o estupor soporífero causado pela nova realidade midiática, impede a análise, o questionamento e ação por parte dos seres humano atualmente. Estão sujeitos à intervenções e direcionamentos da mídia e suas celebridades, e são carregados na avalanche de opiniões e achismos alheios, que lhes moldam as vontades e saberes. Estabelecendo um perigoso fim para a autonomia e individualidade, bem como para as divergências de perspectivas de como viver a vida, de leitura de mundo. Podendo ser massa manipulável diante de interesses escusos e más intenções.
Estamos diante de uma nova forma de narcose fatídica social. Basta saber se o final diferirá de Narciso ou seguirá a mesma conclusão trágica. A escolha ainda depende de cada pessoa.
Glenda Brum
glendabrum@gmail.com
Glenda Brum: 'A magia de viver'
A magia de viver
A criança sorri despreocupada e feliz, vivendo o presente. Também sonha e tem mil planos para o futuro. Há espaço para os dois em seu coração. E faz as duas coisas de forma muito intensa.
Da mesma forma, os anciãos vivem seu presente o melhor possível, pois não sabem quanto tempo ainda terão. Querem aproveitar ao máximo a vida, pois reconhecem o seu valor inestimável. Sabendo que o tempo é limitado, deleitam-se em recordar e tentar acertar pendências deixadas no passado. E a esperança os faz ainda projetar um futuro, que não sabem se chegará.
Entre um e o outro grupo, se encontram adolescentes e jovens, que se apegam ao não saber, ao ser difícil, a ideia de que há um tempo enorme e tudo pode ser deixado para depois. E os adultos, que possuem a certeza de que o tempo é limitado e tudo precisa ser feito para ontem. Correm o dia inteiro, às vezes a noite também, para fazer, construir, multiplicar, mostrar, aparecer e se exaurir. Esses três grupos, adolescentes, jovens e adultos, não possuem a perspectiva de que viver plenamente o hoje, seja o mais importante.
Esse viver plenamente, que crianças e anciãos conhecem, deveria ser resgatado e vivido por todos. Eles amam sem restrições. Expressam suas emoções sem envergonhar-se delas, e principalmente, sem colocar dificuldades à frente de tudo pelo caminho.
Aprender a viver plenamente, sem supervalorizar as tristezas e os problemas, encarando-os como desafios normais da jornada e como oportunidades de melhorar e crescer na experiência de viver, são o maior desafio de cada ser humano que vive.
Viva! Viva plenamente!
Sorria! Sorria até das desgraças, porque elas ensinam.
Ame! Ame sem reservas, porque é o ingrediente mágico, que faz a vida valer a pena.
Glenda Brum
glendabrum@gmail.com
Glenda Brum de Oliveira: 'Altruísmo o ano inteiro'
Altruísmo o ano inteiro
Talvez você tenha visto um vídeo que circula pela internet sobre um entregador de água que está no cumprimento do seu dever, mas é barrado ao tentar entrar num elevador.
Uma mulher carrancuda e de olhar duro tenta evitar que o trabalhador, com um galão de água enorme no ombro, entre no elevador. Ela alega que já está lotado e não há mais espaço. Asperamente, cospe as palavras para ele esperar o próximo.
Uma jovem imediatamente sai e pede que o homem, com semblante cansado, tome o seu lugar, dizendo que ela irá subir no próximo. A cena é cortada e o vídeo retoma a história, com a jovem chegando a um escritório e se desculpando, porque está cinco minutos atrasada para a entrevista de emprego.
O executivo, que a aguardava para a entrevista, ao vê-la sorrir, diz que o emprego já é seu; que ela se dirija ao setor de recursos humanos, para preencher a papelada da contratação. A jovem fica sem entender nada. E o vídeo retoma a imagem inicial. O novo chefe estava no elevador e viu o gesto de bondade da jovem, ao ceder seu lugar ao entregador de água.
É comum ouvirmos o termo “idiota”, quando alguém se exaspera com o outro, mas poucos compreendem o significado desse termo na sua raiz grega; que significa uma pessoa egoísta, egocêntrica, que pensa apenas em si mesma; incapaz de ter empatia pelo outro. No lado oposto dessa atitude temos o altruísmo, que revela uma total preocupação com o seu semelhante, ao ponto de não pensar na própria necessidade ou segurança; como a jovem da nossa história. Mesmo sabendo que o chegar atrasada poderia acabar com suas chances de conseguir o trabalho que desejava, não pensou, antes de ceder seu lugar no elevador, para o entregador de água.
A vida no século XXI trouxe mais idiotismo, do que altruísmo. Porém, nesses tempos de pandemia, viu-se o altruísmo ressurgir em muitos lugares. Jovens se disponibilizando a auxiliar idosos, para que esses não se expusessem saindo à rua, para fazerem suas compras de mercado ou farmácia.
Pessoas doando-se em campanhas para arrecadar alimentos, os embalar e entregar para famílias e pessoas, que tinham perdido seu modo de sustento. Ou ainda, houve quem se disponibilizasse a fazer pães por preço simbólico; ou preparar sopas e entregar na rua, aos que não conseguiam mais comprar o próprio alimento.
Vimos uma legião de médicos e enfermeiros incansáveis, trabalhando até a exaustão, ou até indo além, dando suas vidas no cumprimento do dever de tentar salvar vidas alheias. Numa manifestação de que seguiram um exemplo mais antigo de amor a humanidade; o exemplo do personagem, que marca a divisão da história desse mundo: Jesus Cristo.
Todos os anos, milhares de campanhas publicitárias e humanitárias são feitas no final de ano. Mas conforme os anos passam, o motivo originador das festas de final de ano é esquecido. Ele, o maior exemplo de altruísmo que o mundo já viu. O Filho do Deus Criador, deixou as cortes celestiais, para estar com seres humanos obstinados em fazer o mal. E Seu amor por essa raça decadente foi tal, que deu Sua vida para que seres, não merecedores, pudessem viver.
Nesse encontro entre Deus e o humano, vemos o antagonismo entre o egoísmo humano e o altruísmo divino. Fica-nos a lição de que sermos altruístas é imitarmos o divino. E essa atitude não deve ficar restrita a épocas específicas do ano, como Páscoa ou Natal, mas deve ser prática constante em todos os dias do ano.