O passado é uma roupa que não me serve mais?

Letícia Mariana:
Crônica
‘O passado é uma roupa que não me serve mais?’

Leticia Mariana
Letícia Mariana
A Tristeza de ser sozinha
A tristeza de ser sozinha
Criador de imagens do Bing

Recordo a infância. Barulhos, crianças correndo, mesas gigantes no recreio. Todos saem de perto. Ninguém quer conviver com a criança chata que fica lendo livros no intervalo.

Chegou a adolescência. Repleta de tribos, panelinhas, jovens fumando cigarros e baseados como se não houvesse amanhã. Lá no cantinho, sou eu. Sozinha e sentindo a dor de ser diferente. Abro meu livro e suspiro. De repente, surge um grupo. Ele quer que eu experimente, que eu vá e que eu tente. Que eu viva o que ele chama de vida.

Tento educadamente não ser ainda mais vista como o patinho feio, mas ainda há muita amargura e solidão em mim. Com risadas e atitudes cruéis, meus dias são os piores dias que uma adolescente poderia viver. Só queria estudar. Só queria ler. Só queria me divertir do meu jeito. Só queria ter amigos.

Alguns meninos me chamam pra sair, mas temo que eles me levem para caminhos que não quero. Evito. Algumas meninas me chamam para festas recheadas de drogas e álcool. Não posso, não devo e nem sequer desejo. Perco a oportunidade de ser alguém para eles.

São várias as piadas. Eu não acho graça de nenhuma. Vou ao banheiro chorar – um cheiro terrível que não reconheço se é cigarro ou maconha – e meu nome escrito no banheiro com ‘careta’ e ‘vadi” ao lado.

Os dias são difíceis. Os dias são tristes. Os dias são solitários.

Mas eu só quero ser como sou. Eu não quero ser como eles. Eu só quero viver feliz. Mas na minha felicidade. Não na felicidade deles. Mas o passado é uma roupa que não me serve mais.

Será mesmo?

Letícia Mariana

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A menina atípica e o hiperfoco: e agora?

Letícia Mariana: Crônica ‘A menina atípica e o hiperfoco: e agora?

Leticia Mariana
Letícia Mariana

Mais um dia comum. Acordo cedo, escovo os dentes, coloco um pó compacto no rosto seguido de um batom. Sim, seria apenas mais um dia. Busco uma roupa fora de moda que mais parece a da minha avó e corro para tomar um pingado e encher minha mente de cafeína. Pingado é como chamam o café com leite, acho engraçado. É apenas uma manhã monótona, isso se eu não fosse uma menina com espectro autista.

Estou medicada e com alta dose de serotonina. Minha amiga do colégio diz que tenho ‘cara de felicidade’, mas já fui muito melancólica. Parece que estou numa época de ouro, mas mais do que isso: estou hiperfocada. O hiperfoco no autismo poderia ser traduzido como um interesse obsessivo, tipo aquele em dinossauros que muitas crianças autistas têm – não é o meu caso. Meu interesse extraordinário é estudar.

Oras! Isso está me deixando absurdamente chata. Nunca mais escrevi crônicas, contos ou poemas, só escrevo temas de redação, pois o Enem está próximo. Algo dentro de mim sabia que este hiperfoco bateria à porta, então deixei vários livros prontos e alguns adiantados ano passado, assim teria tempo para o último ano do Ensino Médio.

Sempre fui a nerd da classe. Infelizmente, por culpa das circunstâncias da vida, me atrasei nos estudos. Acreditei que ficaria num supletivo qualquer e teria pouca base, mas encontrei um colégio com ensino de alta qualidade, público e que requer bastante disciplina. Fiz amizades e virei, novamente, a nerd da escola.

Numa tarde que seria normal, ouço gargalhadas da minha nova amiga. Ela tem dezoito anos e tudo pra ela é festa! Quando pergunto o que houve, a resposta vem depressa:

– Você precisa ver o seu rosto! – diz a menina. – Está com os olhos vidrados neste livro gigante, muito nerd!

Ela é muito amigável, então levei na brincadeira e aceitei o elogio. Mas o meu vício em estudos está me preocupando.

Não consigo mais assistir às novelas, nada me parece interessante. Tirei os fins de semana para namorar e descansar, ainda assim anseio pela segunda. Nunca gostei de Matemática, mas me animo na hora de estudá-la. Física nunca foi o meu forte, mas adoro quando há um assunto novo para mergulhar e aprender. O que está havendo?

Quanto mais sou elogiada, mais vontade eu tenho de tirar boas notas. Se tiro uma nota baixa – o que é raro – estudo o triplo para gabaritar na próxima.

Até o meu wallpaper do celular é sobre estudos. Gosto de acordar e lembrar que o motivo da minha existência é estudar. Falo para a bibliotecária que estava com saudades da biblioteca, estudo como a minha mãe estudava antigamente, só assisto a videoaulas em último caso.

– Você é muito inteligente! – diz uma colega da escola.

– Ela é a nossa aluna escritora! – diz a professora.

– Nosso orgulho! – afirma outra mestra.

– Quando vai fazer prova da minha matéria? – pergunta um professor.

– Com certeza você passa no provão! – disse a fada em forma de professora, muito animada e orgulhosa.

Esses elogios me animam de tal forma que meu vício apenas aumenta. Era para ser um dia comum, mas é um dia de hiperfoco. É um dia de uma jovem autista que não sofre quando a semana inicia, apenas quer devorar mais e mais livros didáticos. É um dia lindo de uma jovem estranha.

Letícia Mariana

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A fragilidade forte do amor

Letícia Mariana: Crônica ‘A fragilidade forte do amor’

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Letícia Mariana

Respirei. Senti que estou viva e, apesar das circunstâncias, jamais me senti tão viva! Fiz meu chá de maçã com canela, peguei um livro da Jane Austen e pensei em você. Ouvi as músicas que você gravou para mim, cantando e tocando com delicadeza, senti os anjos me atordoando de tanta saudade!

Parece irônico pensar no amor. Nós nos sentimos frágeis, tão frágeis e vulneráveis em nosso destino. E parece que escolhemos isso de forma conscientemente irracional. Sonhamos com um vestido de noiva e uma valsa romântica, imaginamos como seria acordar todos os dias ao lado da pessoa amada, preparar seu café, trabalhar e estudar com a certeza de que fez a melhor escolha!

Certos homens nos causam a sensação de paixão rotineira. É como se você aceitasse, por ele, ser um pouquinho submissa. Mimar, adorar, servir. Por outro lado, esses homens, geralmente, são aqueles que apoiam seu crescimento profissional, suas conquistas financeiras e pessoais, sua evolução diária. O que te deixa com mais vontade de se entregar e amar sem medo. Esses garotos estão em falta na humanidade; por isso, não quero largar a sorte!

A minha vida tem sido um normal romantizado. Estudo e tento enxergar a beleza em cada assunto, aprendo a cozinhar e resolvo usar a louça mais bela da casa, vou ao mercado e passo batom vermelho. Escrevo… Bem, não há motivos para romantizar a escrita; ela já é puramente romântica!

É engraçado pensar nesse menino. Uma fortaleza frágil se enche em meu peito, praticamente um paradoxo bonito. Sentir amor é viver tranquilamente. Uma mistura de amor-próprio com o amor dele. Parece um sonho! Será que, se por um acaso eu me beliscar agora, acordo sozinha numa madrugada solitária? Estou realmente vivendo isso?

Estou. Amor, paixão, autocuidado. Tudo junto e misturado! E se amar é ser frágil, retrógrada ou antiquada, por ele eu aceito ser – ou parecer – tudo isso! Não somente por ele, mas pela minha essência. Sou feminina, forte e carinhosa. Meu superpoder é ser eu mesma.

A fragilidade forte do amor. A fortaleza de amar! Como já dizia Vander Lee: “românticos são poucos, românticos são loucos, desvairados”! E esse hospício me parece gentil.

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Poeta do Rio

Letícia Mariana: Poema ‘Poeta do rio’

Letícia Mariana

Poeta do Rio Poeta carioca,
Que escreve ao sol de si mesma,
Que chora ao perceber a solidão dos versos – não há praias,
Que não é modelo, mas desfila no ardor de sua alma infeliz.

Poeta carioca,
Troca o biquíni pelo maiô de larvas,
Transcreve passados intensamente sórdidos,
Troca o sol pela cafeína das cafeterias,
E leva um caderno para a zona sul do Rio.

Poeta carioca,
Mora em Copacabana e inveja o subúrbio,
Inveja os lugares distantes que ninguém percebe,
Assim como ninguém a percebeu.
Ama seu bairro nesta solitude,
E transforma-o em unidade.

A beleza está mais nela do que no calçadão.
Multidão do Rio,
Tem uma estranha escrevendo.
O caminho é sensível,
E eu tenho medo de ondas.

Multidão do Rio,
Quanto mais dito versos, mais mergulho nos números incontáveis de tristezas,
Poeta do Rio,
Coração do arpoador,
Cansaço divino,
Meu livro ressuscitou.

Letícia Mariana
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