Sergio Diniz da Costa: 'A revolta das conjunções'

Sergio Diniz. Foto por Teófilo Negrão Duarte

“A falação ia se prolongando e, dentre as indignadas senhoritas, já estavam na fila pra reclamar as donas Não Obstante e Apesar Disso…”

Segunda-feira, logo pelo início da manhã. O grupinho das donas Conjunções estava reunido e, pelo que se percebia mesmo a certa distância, numa calorosa conversa tendo como assunto e reclamação contra dona Mas.

Do alarido, destacava-se a indignação por parte da dona GGG Entretanto.

— Só dá ela! E isso, seguramente, porque é esbelta, magrinha, tamanho P, fácil de usar! É um tal de ‘Mas daqui’, ‘Mas dali’ o texto inteiro, o livro inteiro!

Dona Todavia, pondo fogo na conversa, arrematou:

— Pois é, com ela o texto fica chaaaato, cansativo!

Dona Contudo, não querendo ficar à parte da reclamação, deu o seu pitaco:

— Eu, apesar de ser do tamanho GG, me julgo toda garbosa. Poderia muito bem aparecer mais.

— E eu, que tenho apenas duas letrinhas a mais do que ela? — interveio dona Porém, toda cheia de si.

A falação ia se prolongando e, dentre as indignadas senhoritas, já estavam na fila pra reclamar as donas Não Obstante e Apesar Disso, quando ouviu-se uma voz ainda mais indignada no fundo do grupo. Era a dona Porque!

— Um aparte! Um aparte! E o que vocês me dizem da lambisgoia da dona Pois? É outra magrinha metida! Tem livro que de cabo a rabo é cheio dela!

— É isso mesmo!  — corroborou dona Por Conseguinte, secundada por dona Visto Que e Nesse Caso.

E o tumulto, já tumultuado demais, parecia que ia continuar, quando uma voz quase sobrenatural se fez ouvir:

— Calma, minhas amigas, grandes e elegantes colaboradoras dos magníficos livros e textos em geral! A dona Mas não merece tanto rancor assim, uma vez que não tem culpa alguma por ser empregada feita um tsunami redacional.

A voz pacificadora vinha de um aparteante já idoso, o senhor Dicio Nário, que desde o início da agitação redacional a tudo ouvia, pacientemente, à margem da confusão.

— O grave problema — continuou o sereno ancião — é causado por aquelas pessoas que se autointitulam escritores e até mesmo têm alguns livros publicados.

São pessoas, a maioria delas, de boa intenção e que muitas vezes querem tão somente realizar o sonho de lançar um livro. Entretanto, têm uma formação acadêmica mínima ou, mesmo em a tendo em nível superior, tiveram dificuldade ou não souberam aproveitar as lições básicas da Língua Portuguesa, desde os primeiros anos escolares.

Mais ainda: independentemente de terem alcançado estudos superiores, não mergulharam, desde as primeiras letras, na leitura dos bons livros; livros que, se lidos de forma atenta e com espírito de aprendizado, por si já são verdadeiras aulas de Português!

Terminando sua intervenção, o senhor Dicio Nário enfatizou:

— Vocês, minhas caras amigas Conjunções, não são as únicas prejudicadas no universo dos livros e dos textos em geral. Os Sinais de Pontuação também são vilipendiados pelos escritores despreparados para o seu mister. E, cá entre nós, permitam-me destacar, com um gravame muito maior, porquanto a sua utilização incorreta ocasiona a dificuldade de entendimento de um simples texto ou de um livro.

Diante da reflexão ponderada do venerável senhor, as Conjunções, agora acalmadas, como num acordo tácito olharam para um canto daquele local e se depararam com a tímida dona Mas. E imbuídas do espírito de compreensão e de solidariedade, se dirigiram até ela e a abraçaram como se abraça a uma amiga, a uma irmã!

Leia, também: A revolta da crase. http://www.jornalrol.com.br/sergio-diniz-da-costa-a-revolta-da-crase/

Sergio Diniz da Costa

  jornalculturalrol2@gmail.com




Élcio Mário Pinto: 'Língua falada'

“Blá, blá, blá, blá…” (no sentido de chatice e constrangimento)

 

Falar de um jeito simples não quer dizer falar sem respeitar as regras.

Nossa Língua Portuguesa é rica, riquíssima, diria Ariano Suassuna citando Miguel de Cervantes.

Se nos dá muito trabalho entendermos a Língua falada e corretamente escrita dentro das regras estabelecidas e aceitas, entendidas como norma culta, então, não faz o menor sentido, depois desse trabalho todo, com dedicação e leitura, fazer uma escrita contrária ao que ensina a escola em muitos anos de estudo.

Retomando a fala, já que na escrita, apesar de todos os erros e absurdos cometidos, as pessoas se preocupam um pouco mais, quando se fala parece que não existe preocupação alguma.

E por falar nessa despreocupação com a norma culta da nossa Língua, pensei nos filmes.

Quando são traduzidos, é verdade, algumas coisas podem ficar diferentes, especialmente, quando não há semelhança entre a fala original e a fala traduzida.

Acontece que os costumes e os hábitos podem ser muito diferentes! Também as brincadeiras, as piadas, as citações de pessoas e lugares, enfim, uma infinidade de coisas, até opostas, ao que acontece no ambiente original do filme em relação ao nosso ambiente, Brasil.

Isto não quer dizer que se é superior, melhor, inferior ou pior aqui ou lá, nada disso. Quer dizer que são situações diferentes, nada mais.

Mas, quando dizemos da nossa Língua falada, as diferenças entre elas, especialmente inglesa e portuguesa do Brasil, não se deveria usar estas expressões:

“pegar ele”

“ver ela”

“amar ele”

“filmar ela” e outras construções consideradas erradas pela nossa norma culta.

Se temos uma língua falada tão bonita, e temos, por que fazer esse tipo de construção?

Pode-se responder que o povo fala assim e as pessoas gostam que sejam dessa forma. Ora, os meios de comunicação não deveriam, também, valorizar a Língua falada e ensinar nosso povo a fazer construções linguísticas de acordo com o que rege a fala formal, oficial e corretamente aceita?

Confesso que me sinto incomodado com os diálogos nos filmes: fazem construções fracas, ruins, pobres de sentido e cheios de vícios, que em comum têm uma total falta de consideração pela Língua que deveriam defender.

Se posso dizer: avisá-lo, por que dizer – “avisar ele”?

Se posso dizer: tê-la, por que dizer – “ter ela”?

Se posso dizer: pegá-lo, por que dizer – “pegar ele”?

Se posso construir diálogo que faça sentido e com vocabulário enriquecido, por que falar poucas palavras que nada explicam e apresentam uma construção feia da própria Língua?

Fico pensando se em outros países também acontece essa desconsideração.

Em tudo o que disse até aqui, sequer tratei do gerundismo.

Num dia desses, eu e Adriana, minha esposa, fizemos por capricho e zombaria, a construção de uma frase com 6 palavras que nada concluíam. Seria mais ou menos assim:

Vamos estar procurando tentar fazer valer…”

Por favor, que ninguém repita esta ofensa à nossa rica e bela Língua, falada e escrita. O exemplo destacado, como disse, é para zombar do absurdo imposto ao nosso belo e rico modo de falar.

E agora, desejo que o cotidiano do informal não contamine professores que devem primar pela Língua formal, porque se a escola entrar nessa onda de “ver ela”, não restará esperança para a nossa Língua Portuguesa do Brasil.

ÉLCIO MÁRIO PINTO

30/07/2018




Nicanor Filadelfo Pereira: 'Valorize o seu texto – Saiba como – ver, vir ou vier: eis a questão!'

Nicanor Filadelfo Pereira: ‘Valorize o seu texto – Saiba como – ver, vir ou vier: eis a questão!’

 

VALORIZE O SEU TEXTO SAIBA COMO:

Um país se faz com um território, um povo e um idioma.

 VER, VIR OU VIER – EIS A QUESTÃO!

 

O uso dos verbos “ver” e “vir” tem sido motivo de muitas dificuldades a grande número de pessoas.

 É comum as pessoas dizerem ou escreverem, por exemplo: “Quando eu vir novamente à sua casa…”, ou  p. ex. “Quando eu ver fulano…” — Aqui estão duas frases propositadamente construídas com erros gramaticais — veja:

  1. No primeiro exemplo, com o uso do verbo VIR, este deveria ter sido conjugado na 1ª pessoa, singular, no futuro, do modo subjuntivo: QUANDO EU VIER, SE EU VIER.

Observação: A mesma forma deve ser empregada quando se referir à 3ª pessoa do singular, no futuro, do modo subjuntivo:  Ex. “Quando ele VIER…” / “Se ele VIER…”

  1. No segundo exemplo, com o uso do verbo VER, este deveria ter sido conjugado, na primeira pessoa, singular, do subjuntivo, ou seja, “quando eu VIR fulano…”, ou na 3ª pessoa, singular, no modo subjuntivo: por exemplo: “Se ele VIR o artigo que eu escrevi…”

APÊNDICE: O verbo INTERVIR conjuga-se com as desinências do verbo VIR. A razão é simples, o vocábulo “intervir” é composto, ou seja: inter-vir, significando  vir entre, vir em meio a.

Ex. Eu intervenho nessa discussão… / (1ª pessoa, singular, do presente, no modo indicativo)..

Ex. Ele interveio naquela discussão. (3ª pessoa, singular, do pretérito perfeito, no modo indicativo).

 

Prof. Nicanor Pereira, é licenciado em Letras, com pós-graduação em didática do ensino superior, atua profissionalmente como revisor de textos.

Contatos: nicanorpereira@gamil.com

 




Nicanor Filadelfo Pereira: 'Canto à Língua Portuguesa'

Lembrando que o dia 05 de maio é uma das datas em que se comemora a Língua Portuguesa – a sexta mais falada no mundo – , o colunista e poeta parnasiano Nicanor Filadelfo Pereira presta sua homenagem a ela por meio de um belíssimo soneto

Canto à Língua Portuguesa

Oh! Língua portuguesa amada e bela,

Cantada foras tu, com grã nobreza,

E que a alma brasileira tanto anela

Proclamar ao mundo a tua grandeza.

És, do Lácio, a derradeira flor,

Que Bilac, o teu poeta, já cantava,

Nos sonoros versos, o teu valor,

Tal qual Camões, que a ti amava.

És um hino, no oceano agreste,

Que a tudo e as tormentas enfrentaste,

Por cá vir pousar, no grande Oeste.

Com tal sonoridade augusta e mansa,

Aqui, na terra dos brasis, puseste

O teu canto doce, e tua pujança!

Nicanor Pereira 06/05/2017 – 00h06m

LÍNGUA PORTUGUESA

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Olavo Bilac (1865 – 1918)

 




Nicanor Filadelfo Pereira: 'Valorize seu texto – saiba como

Nicanor Filadelfo Pereira: ‘VALORIZE O SEU TEXTO SAIBA COMO:’

 

A forma como você escreve personifica o seu trabalho, seja em prosa ou em versos. A observação das regras básicas da gramática de nossa língua ajuda o leitor a aquilatar o seu nível intelectual e cultural.

Por que preocupar-se com os porquês?

ACOMPANHE:

Uma das grandes dificuldades que as pessoas encontram ao escrever está no uso dos porquês. — Vejamos:

1 – A conjunção porque é empregada quando se quer dar uma razão, uma causa, uma explicação.

Exemplo: Não fui à aula hoje porque havia greve dos motoristas de ônibus.

2 – Já no caso de se perguntar sobre a razão, sobre a causa, ou querer uma explicação sobre um fato, usa-se a locução por que, se estiver no início da frase:

Exemplo: Por que você não foi à aula hoje?

3 – No entanto, se na construção da frase, a sua indagação estiver no final da pergunta, esse por que, separado, recebe uma sinalização que o diferencia, ou seja, o acento circunflexo (^), que a crianças costumavam chamar de ‘chapeuzinho’. Lembram?

Exemplo: Você não foi à escola hoje, por quê?

4 – Temos agora uma quarta situação:

Se você utilizar o termo porque como objeto na construção frasal, precedido pelo artigo masculino “o”, ou associado a uma preposição (do) ele já não mais será uma conjunção, mas sim um substantivo.

Exemplo: Vou explicar-te o porquê não fui à aula hoje, porque não havia ônibus. (notaram a diferença dos porquês, na mesma frase?).

Exemplo: Qual a razão ‘do porquê’ no exemplo acima?

Prof. Nicanor Pereira, é licenciado em Letras, com pós-graduação em didática do ensino superior, atua profissionalmente como revisor de textos. Contatos: nicanorpereira@gamil.com

 

 




Ivan Fortunato: 'Particularmente, penso que o mesmo é um problema'

Particularmente, penso que o mesmo é um problema (*)

            Para introduzir este breve ensaio, devo esclarecer o leitor mais arguto, e os críticos de plantão, que não sou um escritor livre de erros – de qualquer natureza. Por isso, caro ledor, venho aqui contrapor não os erros de escrita que se dão na dubiedade da própria língua, na falta de atenção de quem publica um texto com uma palavra mal digitada, ou apresenta uma sentença com erros de concordância. Aqui, tenho a intenção de abordar erros de linguagem que surgem propositadamente na tessitura de uma ideia, escrita ou falada, quando se busca a erudição.

Um desses erros, que têm incorrido com certa frequência, é o uso da palavra mesmo(a). Claro que não me refiro à sua utilização como adjetivo, tendo o sentido de igual (p. ex.: eu quero o mesmo lanche que o meu amigo pediu) ou repetido (p. ex.: fui atendido pelo mesma funcionária de sempre).

O erro acontece quando o mesmo é utilizado como sujeito ou predicado, na intenção de substituir um desses termos utilizados na frase anterior. Raramente essa prática é falada, mas reiteradamente aparece na comunicação escrita. Os exemplos são facilmente encontrados: placas, comunicados, memorandos, ofícios, notícias, circulares, e-mails, e assim por diante. Da mesma forma, praticamente todos os trabalhos acadêmicos que recebo de meus estudantes para correção, carregam o mesmo erro em sua redação. Não raro, a justificativa pela opção do mesmo ou da mesma, é que a repetição do termo anterior deixaria a redação feia, empobrecida e/ou repetitiva. A explicação é válida, contudo, o mesmo não resolve o problema: piora.

Eis um pequeno exemplo:

  • Um cartaz manuscrito em letras garrafais tinha o nobre propósito de alertar que as vagas em frente a um condomínio de classe média não deveriam ser utilizadas. Isso porque o veículo correria risco de danos materiais, pois o prédio estava, naquele momento, sendo pintado. O cartaz dizia: Motorista, cuidado! Não estacione na frente do prédio, porque o mesmo está sendo pintado. Vê-se uma linguagem complicada, utilizada em uma mensagem que poderia e deveria ser simples: Motorista, cuidado! Não estacione na frente do prédio, porque o mesmo que está sendo pintado. Ou, ainda, mais simplificado: Motorista, não estacione. O prédio está sendo pintado.

O mesmo, além de reduzir a qualidade da escrita, dificulta a comunicação. Por isso, a saída é bem simples: deixar de escrever mesmo ou mesma para substituir termos já utilizados no texto.

Enquanto o mesmo é um problema da linguagem escrita, a linguagem oral tem sofrido com a combinação de duas palavras que incorrem num erro tautológico básico. Trata-se dos dizeres “eu, particularmente”. Ora, tanto o pronome eu, quanto o modo particular (particularmente), dizem respeito à pessoa que fala. Nesse sentido, “eu, particularmente”, é tão redundante (e errado) quanto dizer descer para baixo, ou subir para cima.

Em conclusão, eu, particularmente, tenho alertado meus estudantes e colegas a respeitos desses erros que, cada vez mais, se tornam comuns nos escritos e nas falas. Muitas vezes, os mesmos parecem penduricalhos, que somente atrapalham a compreensão e a comunicação. Ao fim e ao cabo, este último parágrafo apresenta dois erros. Que tal tentar reescrevê-lo?

 

(*) Ivan Fortunato é doutor em geografia pela UNESP, professor do Instituto Federal em Itapetininga, membro do IHGGI e secretário da Academia de Letras de Itapetininga (2017/2018). Contato: ivanfrt@yahoo.com.br

 

 




Professora de Bariri retoma o hábito da correspondência com seus alunos

BOAS PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO INOVAM
O APRENDIZADO DA LÍNGUA PORTUGUESA

No universo virtual, onde as mensagens são instantâneas, escrever cartas à mão parece ser um hábito tão remoto e ultrapassado, que fica impossível pensar que a prática pode se tornar uma ferramenta para o aprendizado e aprimoramento do uso da língua portuguesa no ambiente escolar. Tudo começou como uma brincadeira e hoje o projeto “De carta em carta… encontrando caminhos” tem sido aplicado como metodologia de ensino em escolas do interior paulista. A iniciativa tem a assinatura de Meire Cristina Fiuza Canal, educadora e professora de português do Ensino Fundamental. A iniciativa foi reconhecida nacionalmente e apresentada no 4º Seminário Nacional Investigando Práticas em Sala de Aula, promovido pela Editora Positivo, em parceria com a Universidade de Lisboa, em Curitiba (PR).

No final de 1990, Meire começou a trocar cartas entre seus alunos e os de uma amiga da capital paulista. “A ideia era só brincar com as cartas, provocar interação. Ainda não era um projeto. A partir de 2000, fui morar em Bariri, interior de São Paulo, e conheci uma orientadora pedagógica. Ela me incentivou a trocar cartas com uma professora de uma cidade vizinha, que organizou o Clube de Correspondência. Passei a entender a dinâmica da iniciativa, objetivos e procedimentos”, lembra. “E assim nasceu o ‘De carta em carta’, em 2005. Queria criar situações de aprendizagem para os alunos aprimorarem o uso da língua portuguesa e melhorarem o domínio da norma padrão”, assinala.

Para a professora, o Clube de Correspondência surgiu como uma solução para motivar seus alunos à leitura, à escrita e à participação de outras atividades escolares. De acordo com Meire, os alunos escrevem sobre o que desenvolvem em sala de aula e outras informalidades. “Descobri que o interesse é despertado quando a atividade é significativa. E nada mais interessante para o jovem que conhecer pessoas diferentes”, avalia. O projeto foi tão bem-sucedido que a professora passou a adotá-lo como uma atividade permanente em sua prática pedagógica. Assim, outras professoras foram convidadas a participar.

A metodologia do projeto é bem simples, como as cartas, revela Meire. “Um aluno escreve para outro sem conhecê-lo, até que, após a troca de algumas correspondências (cerca de quatro), realizamos um encontro. Na produção dos textos, trabalhamos os procedimentos de escrita, revisão e reescrita, buscando sempre escrever do modo mais interessante, claro e inteligente”, explica. Entre os resultados práticos do “De carta em Carta”, a professora destaca a solução de problemas de escrita, como ortografia, concordância, coesão e coerência. “É muito mais significativo ensinar a língua portuguesa fazendo uso real dela. Enquanto os alunos aprimoram seus textos revisando-os e refletindo criticamente sobre eles, a aprendizagem da língua acontece naturalmente. Mas não posso me esquecer de mencionar sua grande contribuição na motivação para a escrita e aprendizagem de outros saberes”, ressalta.

Atualmente, o projeto está sendo aplicado em salas de aula do ensino fundamental da Escola Municipal Professora Joseane Bianco, em Bariri, e da Escola Estadual Professora Edir, de Boraceia. Neste ano, Meire fez uma experiência com alunos de Ensino Médio da Escola Estadual Professora Ephigênia Cardoso Machado Fortuanaro, em Bariri. Eles escreveram para pacientes de um hospital especializado no tratamento de doentes com câncer. Em 2010, foi feita a troca de correspondências com alunos de Vilhena, em Rondônia.

O “De carta em carta” já envolveu centenas de alunos e dezenas de professores. Neste ano, dois professores participam com duas turmas cada um, totalizando 60 estudantes. “Como o projeto mantém os mesmos moldes do início, o futuro dele está sempre em nossas vistas. Quando acabamos uma edição, já há colegas pedindo para fazer parceria conosco para o próximo ano. Os alunos também já incorporaram a atividade não apenas aguardam para realizá-la, como cobram para que o “De carta em carta” aconteça todos os anos. Quem participa faz uma propaganda do projeto e quer participar novamente”, orgulha-se.

Segundo Meire, todas as escolas, independentemente de suas peculiaridades, práticas pedagógicas e conteúdo, poderiam aderir ao projeto. “Quem participa não se arrepende. Sempre agrega aprendizado, possibilita engajamento dos alunos com a própria aprendizagem, com outros adolescentes e professores, que aprendem a trabalhar juntos”, observa. A professora acredita que o “De carta em carta” contribuiu para encontrar novos caminhos de ensinar. “Por isso, fico feliz quando posso compartilhá-lo. Muitos professores buscam diferentes e significativas maneiras de ensinar. Os alunos encontram o caminho de aprender a aprender e descobrem o poder que possuem com o uso da nossa língua, cujo domínio é direito de todos”, avalia. “É essencial ao professor de língua portuguesa garantir ao aluno as habilidades de aprimorar o uso de sua língua e dominar a variedade padrão da mesma, independentemente de suas condições sociais, étnicas, culturais, regionais. Língua é patrimônio. Quero que meu aluno conheça a sua e domine seu uso e recursos”, argumenta.