O silêncio é uma forma de amor

Ella Dominici: ‘O silêncio é uma forma de amor’

Ella Dominici
Ella Dominici
Imagem criada por IA do Grok

Em ressonância com Léopold Sédar Senghor

Silêncio.
É nele que o amor se reconhece.
Não no grito, nem no toque,
mas naquilo que pulsa quando o mundo cala.
O silêncio é um corpo que respira entre dois corações —
um sopro antigo, herdado da terra.

Sou mulher feita de luz e sombra,
como a árvore que recorda o chão e ainda assim deseja o céu.
A minha pele carrega memórias de séculos,
areias de mulheres que dançaram sobre a mesma dor e esperança.
Em mim, há o sangue das que não se ajoelharam
e a ternura das que ensinaram o perdão com o olhar.

Tu me olhas, e em teus olhos reconheço a ancestralidade da noite.
Há um continente inteiro entre nós —
mas o amor atravessa oceanos invisíveis.
Teu silêncio me fala em língua de tambores,
onde cada batida é um nome,
cada pausa, uma oração.

Amo-te não como quem possui,
mas como quem devolve ao universo o que era dele.
Teu corpo é território e templo,
é tambor e travessia.
Quando te toco, não busco a carne:
procuro a lembrança da vida.

O amor é uma forma de resistência.
Ser mulher negra é guardar dentro do peito
a geografia inteira do tempo —
é ser pátria e poema,
vento e raiz, voz e eco.

E se o destino me reduzir em cinzas,
como temeu Senghor,
que minhas cinzas fertilizem o solo da ternura.
Que minhas palavras cresçam como flores negras sobre o medo,
e que cada pétala diga: “Eu amei, e por isso vivi”.

Ella Dominici

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Jairo Valio: 'Negra'

Jairo Valio

Negra

Altiva, bela, cativante, só sorrisos,

Porte esbelto, desperta até invejas,

Pelo andar, corpo escultural, perfeita,

Como se fosse por artista desenhada,

Nas formas curvilíneas com caprichos,

E nas telas expusesse as perfeições.

 

Não tem reinados ou exuberâncias,

Sua moradia pode até ser na periferia,

Pela condição social que discrimina,

Mesmo sendo genuinamente brasileira,

Mistura de raças que resultou num primor,

Tantas são as graças que mostra sorrindo.

 

Poderia desfilar em passarelas seus encantos,

Brilhando altiva em espaços que lhe negam,

E se algumas conseguem objetivos tão sonhados,

São exceções num mercado que discrimina,

Que escolhem manequins pela cor de suas peles,

Ou pelos olhos da cor do mar ou azul do céu.

 

Não precisariam ter um dia para identidades,

Consciência Negra para serem reconhecidas,

Bastaria reconhecer nelas suas igualdades,

Negras, brancas, amarelas, até mulatas,

Todas iguais para as mesmas oportunidades,

E condições dignas até mesmo em moradias.

 

Negra altiva que caminha tão despretensiosa,

Mas que olhares furtivos notam seus encantos,

Pela maneira sutil que desfila suas graças,

No gingar de corpos que nenhuma se compara,

Só ela tem os trejeitos que Deus lhe agraciou,

E mesmo não tendo espaços sorri e é feliz.

 

Jairo Valio

20-11-2009