Nosferatu de Eggers

Bianca Agnelli:
‘Nosferatu de Eggers: a alma sombria de um clássico Imortal’

‘Nosferatu di Eggers: l’ anima oscura di un classico intramontabile’

Card do filme 'Nosferatu de Eggers: a alma sombria de um clássico Imortal'
Card do filme ‘Nosferatu de Eggers: a alma sombria de um clássico Imortal’

Lá fora a chuva tamborila nos vidros, o vento sibila pelos becos como um lobo faminto, e há aquela estranha eletricidade no ar que apenas algumas noites conseguem evocar. A Toscana parece ter se despido de todo calor humano…

Qual melhor cenário para se sentar à escrivaninha, acender uma vela (mais para cena do que por necessidade) e escrever um artigo para o Jornal Cultural Rol sobre o filme gótico do ano, Nosferatu?

O nome por si só evoca toda uma estética. É impossível não pensar na iconografia expressionista, nas mãos enluvadas projetadas nas paredes, no rosto cadavérico de Max Schreck no filme de 1922. O filme sobre o qual escrevo hoje carrega consigo todo esse peso e essa história, e visualmente é uma obra-prima. Cada cena é um quadro gótico perfeitamente elaborado. Mas também é um filme que, por mais fascinante que seja, deixa para trás algumas sombras de incerteza.

Nosferatu: Uma história de direitos autorais violados e sobrevivência (do filme, não das vítimas)

Robert Eggers está de volta, e desta vez ele decidiu ressuscitar Nosferatu, o primeiro verdadeiro vampiro do cinema. Um vampiro que, ironicamente, nem deveria ter sobrevivido até os dias de hoje. O Nosferatu original, dirigido por F.W. Murnau em 1922, era, na verdade, uma imitação descarada de Drácula de Bram Stoker. Tão descarada que os herdeiros de Stoker processaram e venceram, ordenando a destruição de todas as cópias do filme.

Todas, exceto uma. Porque, como se sabe, os vampiros são notoriamente difíceis de matar.

Essa cópia sobrevivente continuou a assombrar o cinema por um século, viajando pelo mundo, e o filme se tornou um mito, influenciando gerações de cineastas; inspirando, em 1979, o remake mais naturalista de Werner Herzog e, nos anos 90, o melodrama barroco de Francis Ford Coppola com seu Drácula.

Hoje, Eggers nos traz uma nova reencarnação da lenda, com seu estilo hipnótico e uma atenção maníaca pelos detalhes.

O diretor lida com esse legado com um respeito quase obsessivo e, se há algo em que o filme se destaca incontestavelmente, é sua total e absoluta devoção à estética gótica.

A história, em linhas gerais, é sempre a mesma: estamos em 1838 e o jovem Hutter (Nicholas Hoult) parte para uma viagem de negócios na Transilvânia, deixando para trás a esposa Ellen (Lily-Rose Depp), que – com uma certa perspicácia – não está nada entusiasmada com a ideia. Ele, obviamente, ignora os pressentimentos da esposa e segue em direção ao seu destino, que spoiler: inclui um vampiro cadavérico e uma série de decisões péssimas.

Visualmente, o filme é uma joia. Eggers cria uma estética fria e espectral, brincando com o contraste entre a morte iminente e a beleza decadente dos cenários. As cores vão se apagando à medida que Hutter se aproxima do castelo do conde, e o filme mergulha cada vez mais em uma atmosfera de pesadelo.

E falando em cenários, Eggers não poupou gastos: as filmagens externas do castelo de Nosferatu foram feitas no castelo de Corvin, na Romênia, que – detalhe importante – é o mesmo lugar onde o verdadeiro Vlad, o Empalador, foi preso. Drácula docet.

As cenas internas foram filmadas no castelo de Pernštejn na República Tcheca, que já havia sido usado no Nosferatu de Herzog, de 1979, e a cidade imaginária de Wisborg foi reconstruída do zero, com cinco ruas completas inspiradas na arquitetura alemã e romena da época, nos Barrandov Studios, em Praga — só para dar uma ideia da grandiosidade, os mesmos estúdios hospedaram filmes como Casino Royale e The Bourne Identity.

Por fim, algumas cenas foram filmadas no complexo Invalidovna, em Praga, um antigo dormitório para veteranos de guerra construído em 1730 – porque se há um lugar perfeito para evocar uma energia de condenação eterna, é com certeza esse.

Robert Eggers não é do tipo que leva as coisas na leveza. Sua obsessão pelo folclore o levou a explorar as origens menos glamourosas do mito dos vampiros. Esqueçam os caninos elegantes e o charme de Bela Lugosi: os primeiros vampiros eslavos não se limitavam a beber sangue, frequentemente estrangulavam ou… tinham encontros sexuais letais com suas vítimas. Eggers explora esse lado sombrio, conectando-o até mesmo aos fenômenos de paralisia do sono, aquele momento aterrador em que você está acordado, mas incapaz de se mover, com a sensação de que algo maligno está pressionando seu peito.

Sem revelar muito, o filme de Eggers brinca com esses elementos, adicionando um subtexto de obsessão, desejo e culto à morte que o torna mais do que um simples horror: é uma tragédia gótica, um pesadelo febril, uma história de paixão e perdição.

Em resumo, Nosferatu, de Eggers não é apenas um filme de terror, é uma experiência cinematográfica, uma descida aos cantos mais obscuros da lenda. Para quem ama o gótico, o folclore e os vampiros menos polidos, é uma jornada que vale a pena fazer.

Mas vamos falar sobre o elenco:

Nicholas Hoult, no papel de Hutter, é eficaz, conseguindo transmitir aquela mistura de ingenuidade e terror crescente que o papel exige;

Willem Dafoe é, como sempre, magnético em seu papel secundário, trazendo uma intensidade que seria suficiente para sustentar um filme inteiro;

Lily-Rose Depp, com sua interpretação de Ellen, deveria ser o coração emocional do filme, a figura ao redor da qual gira a obsessão do vampiro e o destino de Hutter, mas a atriz oferece uma interpretação distante, e seu olhar enigmático funciona principalmente na superfície;

E então, temos ele: Nosferatu.

Bill Skarsgård tem o physique du rôle. Ele é alto, afilado, com um rosto que parece ter nascido para o horror. A maquiagem o transforma em uma criatura espectral, e alguns momentos são realmente perturbadores. Mas também há algo involuntariamente grotesco em sua interpretação.

Outro ponto fraco é a trilha sonora. O original de 1922 era um filme mudo, e a música tinha o papel de guiar a emoção do espectador. Eggers, talvez para manter a fidelidade àquela atmosfera, escolheu uma trilha sonora mínima. É uma escolha estilística interessante, mas que tira impacto de muitas cenas. O horror vive do som, e aqui falta aquele crescendo de tensão que teria tornado algumas sequências inesquecíveis.

Eggers criou um novo clássico?

Nosferatu, de Eggers é um filme potente, visualmente majestoso, uma obra que se enraíza na história do cinema e na mitologia dos vampiros. É um filme ao qual se assiste com admiração, que transporta para outra época.

Mas também é um filme que me deixou um leve senso de insatisfação.

Talvez seja a ausência de uma verdadeira alma emocional. Talvez seja seu rigor estético, que corre o risco de sufocar a visceralidade do horror. Ou talvez seja apenas uma questão de expectativas: eu esperava um filme que me deixasse sem fôlego, e em vez disso, me vi admirando-o à distância, sem nunca me sentir realmente absorvida. Um conto de fadas cruel, como um cálice de sangue a ser bebido aos poucos, em um prazeroso masoquismo.

Uma experiência cinematográfica que recomendaria a todos, mas se você perdeu o filme no cinema: não se preocupe, porque em breve Nosferatu estará disponível nas principais plataformas on-demand!

Uma oportunidade imperdível para se encher de arrepios e apreciar a arte visual de Eggers… Mas, como sempre com filmes desse calibre: não se esqueça de deixar pelo menos uma luz acesa. Nunca se sabe quem pode tocar à porta!

‘Nosferatu di Eggers: l’ anima oscura di un classico intramontabile’

Fuori la pioggia tamburella sui vetri, il vento sibila tra i vicoli come un lupo affamato e c’è quella strana elettricità nell’aria che solo certe notti riescono a evocare. La Toscana sembra essersi spogliata di ogni calore umano… 

Quale miglior scenario per mettersi alla scrivania, accendere una candela (più per scena che per necessità) e scrivere un articolo per il Jornal Cultural Rol sul film gotico dell’anno, Nosferatu?

Il solo nome evoca un’intera estetica. È impossibile non pensare all’iconografia espressionista, alle mani adunche proiettate sui muri, al volto cadaverico di Max Schreck nel film del 1922. Il film di cui vi scrivo oggi porta con sé tutto quel peso e quella storia, e visivamente è un capolavoro. Ogni inquadratura è un quadro gotico perfettamente studiato. Ma è anche un film che, per quanto affascinante, lascia dietro di sé qualche ombra di incertezza.

Nosferatu: Una storia di copyright violato e sopravvivenza (del film, non delle vittime)

Robert Eggers è tornato, e questa volta ha deciso di rispolverare Nosferatu, il primo vero vampiro del cinema. Un vampiro che, ironicamente, non sarebbe nemmeno dovuto sopravvivere fino ai giorni nostri. Il Nosferatu originale, diretto da F.W. Murnau nel 1922, era infatti un’imitazione fin troppo spudorata del Dracula di Bram Stoker. Talmente spudorata che gli eredi di Stoker fecero causa e vinsero, ordinando la distruzione di tutte le copie del film.

Tutte, tranne una. Perché si sa, i vampiri sono notoriamente duri a morire.

Quella copia sopravvissuta ha continuato a infestare il cinema per un secolo, viaggiando per il mondo, e il film divenne un mito, influenzando generazioni di cineasti; ispirando nel 1979 il remake più naturalistico di Werner Herzog e, nei ‘90, il melodramma barocco di Francis Ford Coppola con il suo Dracula

Oggi, Eggers ci porta una nuova reincarnazione della leggenda, con il suo stile ipnotico e un’attenzione maniacale per il dettaglio. 

Il regista si confronta con questa eredità con rispetto quasi ossessivo e se c’è una cosa in cui il film eccelle incontestabilmente, è la sua totale e assoluta devozione all’estetica gotica.

La storia a grandi linee è sempre quella: siamo nel 1838 e il giovane Hutter (Nicholas Hoult) parte per un viaggio d’affari in Transilvania, lasciando a casa la moglie Ellen (Lily-Rose Depp), che – con una certa lungimiranza – non è per niente entusiasta della cosa. Lui, ovviamente, ignora i presentimenti della moglie e si avvia dritto verso il suo destino, che spoiler: include un vampiro cadaverico e un sacco di pessime decisioni.

Visivamente, il film è un gioiello. Eggers crea un’estetica fredda e spettrale, giocando con il contrasto tra la morte che incombe e la bellezza decadente delle ambientazioni. I colori si spengono man mano che Hutter si avvicina al castello del conte, e il film diventa sempre più immerso in un’atmosfera da incubo.

E parlando di ambientazioni, Eggers non ha badato a spese: le riprese esterne del castello di Nosferatu sono state fatte nel castello di Corvin in Romania, che – dettaglio non trascurabile – è lo stesso luogo dove il vero Vlad l’Impalatore fu imprigionato. Dracula docet.⠀

Le scene degli interni sono state girate nel castello di Pernštejn, in Repubblica Ceca, che era già stato usato nel Nosferatu di Herzog del 1979, e la città immaginaria di Wisborg è stata ricostruita da zero, con cinque strade complete ispirate all’architettura tedesca e rumena dell’epoca, nei Barrandov Studios di Praga — tanto per dare un’idea del calibro, gli stessi studi hanno ospitato film come Casino Royale e The Bourne Identity.

Infine, alcune scene sono state girate nel complesso Invalidovna a Praga, un ex dormitorio per veterani di guerra costruito nel 1730 – perché se c’è un posto perfetto per evocare un’energia da dannazione eterna, è senz’altro quello.⠀

Robert Eggers non è uno che prende le cose alla leggera. La sua ossessione per il folklore lo ha portato a scavare nelle origini meno glamour del mito dei vampiri. Dimenticatevi i canini eleganti e il fascino di Bela Lugosi: i primi vampiri slavi non si limitavano a bere sangue, spesso strangolavano o… avevano incontri sessuali letali con le loro vittime. Eggers esplora questo lato oscuro, collegandolo persino ai fenomeni di paralisi del sonno, quel momento terrificante in cui si è svegli ma incapaci di muoversi, con la sensazione che qualcosa di maligno stia premendo sul petto.

Senza rivelare troppo, il film di Eggers gioca con questi elementi, aggiungendo un sottotesto di ossessione, desiderio e culto della morte che lo rende più di un semplice horror: è una tragedia gotica, un incubo febbrile, un racconto di passione e perdizione.

In definitiva, Nosferatu di Eggers non è solo un horror, è un’esperienza cinematografica, una discesa negli angoli più oscuri della leggenda. Per chi ama il gotico, il folklore e i vampiri meno patinati, è un viaggio che vale la pena fare.

Ma parliamo del cast: 

Nicholas Hoult nei panni di Hutter è efficace, riesce a trasmettere quel misto di ingenuità e terrore crescente che il ruolo richiede;

Willem Dafoe è, come sempre, magnetico nel suo ruolo secondario, portando un’intensità che sarebbe bastata a reggere un film intero;

Lily-Rose Depp con la sua interpretazione di Ellen dovrebbe essere il cuore emotivo del film, la figura attorno a cui ruota l’ossessione del vampiro e il destino di Hutter, ma l’attrice offre un’interpretazione distante e il suo sguardo enigmatico funziona per lo più in superficie;

E poi c’è lui: Nosferatu.

Bill Skarsgård ha il physique du rôle. È alto, affilato, con un viso che sembra nato per l’horror. Il trucco lo trasforma in una creatura spettrale, e alcuni momenti sono davvero inquietanti. Ma c’è anche qualcosa di involontariamente grottesco nella sua interpretazione.

Un altro punto debole è la colonna sonora. L’originale del 1922 era un film muto, e la musica aveva il compito di guidare l’emozione dello spettatore. Eggers, forse per rimanere fedele a quell’atmosfera, ha scelto una colonna sonora minima. È una scelta stilistica interessante, ma che toglie impatto a molte scene. L’horror vive di suono, e qui manca quel crescendo di tensione che avrebbe reso certe sequenze indimenticabili.

Eggers ha creato un nuovo classico?

Nosferatu di Eggers è un film potente, visivamente maestoso, un’opera che affonda le radici nella storia del cinema e nella mitologia del vampiro. È un film che si guarda con ammirazione, che trasporta in un altro tempo.

Ma è anche un film che mi ha lasciato un leggero senso di insoddisfazione.

Forse è l’assenza di una vera anima emotiva. Forse è il suo rigore estetico, che rischia di soffocare la visceralità dell’orrore. O forse è solo questione di aspettative: speravo in un film che mi avrebbe lasciata senza fiato, e invece mi sono ritrovata ad ammirarlo a distanza, senza mai sentirmi davvero trascinata dentro. Una fiaba crudele, come un calice di sangue da buttar giù assaporandolo a sorsi, in preda ad un piacevole masochismo.

Una visione cinematografica che consiglierei a tutti, ma se vi siete persi il film al cinema: niente panico, perché a breve Nosferatu sarà disponibile sulle principali piattaforme on-demand! 

Un’occasione imperdibile per fare il pieno di brividi e godervi l’arte visiva di Eggers… Ma, come sempre con i film di questo calibro: non dimenticate di lasciare almeno una lucina accesa. Non si sa mai chi potrebbe suonare alla porta!

Bianca Agnelli

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Marcus Hemerly: 'O centenário de uma sinfonia de horrores'

Marcus Hemerly

O centenário de uma sinfonia de horrores

Nosferatu (1922, Dir. F.W. Murnau)

Desde a invenção do cinetoscópio, até a possibilidade de captação e transmissão mais sofisticada de imagens, a movimentação das formas amolda-se a uma das mais populares expressões artísticas. Concebida originalmente de forma rudimentar, o mecanismo de captar imagens viabilizava apenas um espectador a cada visualização, e, num segundo momento, o invento foi aprimorado pelos irmãos Auguste e Louis Lumière, realizando-se a primeira transmissão coletiva em 22 de março de 1895. O filme, “La Sortie de L’usine Lumière à Lyon” (A saída da Fábrica Lumière em Lyon), retratava a saída dos funcionários do interior da empresa Lumière, na cidade de Lyon, na França, deflagrando o vindouro ritual de agrupamento para apreciação cinematográfica.

Certa feita, o grande crítico já falecido, Rubens Ewald Filho, quando comentando acerca do cinema mudo, disse que não poderia sentir saudades daquilo que não viveu/conheceu, ressaltando a quase impossibilidade de dissociação da trilha sonora sobre os filmes. Decerto, existem algumas correntes de pensamento pelas quais o verdadeiro cinema, a verdadeira arte da película, seria a sua modalidade silente, pela qual as emoções e a trama deveriam ser transmitidas ao público, tão somente, pela pantomima intercalada por eventuais caixas de texto inseridas entre os quadros de cenas; a habilidade de atuação na interpretação sem o auxílio da fala.

O início do século 20 foi marcado pelos períodos/movimentos do expressionismo, impressionismo, surrealismo, neorealismo, nouvelle vague, film noir – atualmente classificado como um subgênero autônomo – cada qual, retratando, por meio de suas peculiaridades, a verve criativa em suas nacionalidades e influências.

Atualmente, assistir a uma produção sem a expressividade sonora, pode ser um exercício, no mínimo, pouco usual àqueles que não o fazem sob um viés científico, rotulado de excêntrico aos panoramas contemporâneos. De outro giro, observado como fonte de pesquisa em uma ótica apurada, revela-se uma experiência extremamente prazerosa, ao passo que o cinema mudo abarca períodos extremamente importantes à sétima arte, tais como os já citados impressionismo russo, (O encouraçado Potemkin, 1925) e expressionismo alemão, cujas principais produções são os inovadores, “O Gabinete do Dr. Caligari, 1920”, “Nosferatu, 1922” e “Metrópoles, 1927”.

Pondera-se que, por óbvio, os oitenta minutos da película que assombrou os espectadores em 1922, “Nosferatu, Uma sinfonia do Horror (Eine Symphonie des Grauens)”, primeira adaptação (ainda que não creditada) da obra Drácula, publicada em 1897, pode não causar maiores calafrios passados cem anos de sua realização. No entanto, as particularidades analíticas atreladas ao pano de fundo histórico permanecem igualmente fascinantes, em paralelo às dificuldades de realização e impressão de efeitos como técnica de narrativa no início do século passado.

Ainda que o título “Aurora”, produzido já em terras americanas, seja o trabalho mais pessoal do excêntrico diretor F.W. Murnau, Nosferatu, a despeito do excelente “Vampir” (1932), de Carl Theodor Dreyer, ainda é considerado o primeiro grande filme do gênero. Na trama, Hutter (Gustav von Wangenheim), agente imobiliário, viaja até os Montes Cárpatos para diligenciar a venda de um imóvel ao conde Graf Orlock (Max Schreck), que na verdade é um milenar vampiro que ominosamente, leva a morte até Bremem, na Alemanha.

Lançado nos cinemas para um público selecionado há exatos 100 anos, trata-se de uma obra enigmática, com a primeira sessão em 4 de março de 1922 em um zoológico em Berlim, (Berlim Zoological Gardem). Tal a intensidade da interpretação de Schreck, que existiu a lenda de que o ator, de fato, tratava de um vampiro – afinal, tratava-se do início do século 20 – inclusive inspirando o filme “A Sombra do Vampiro”, de 2000. Na película, o ator é vivido por Willen Dafoe, e retrata o set de filmagens da obra de 1922. Imprescindível ainda fazer referência à refilmagem de 1979, dirigida por Werner Herzog (de Fitzcarraldo), intitulada O Vampiro da Noite, qual a interpretação fabulosa de Klaus Kinski, honra os intensos traços stanislavskianos do primeiro intérprete do Conde Orlock.

Klaus Kinski, como o Conde Orlock, em Nosferatu – O Vampiro da Noite, (1979).

A produção é cercada de pontos curiosos. Consoante mencionada acima, é uma adaptação não autorizada da obra de Drácula, escrita por Bram Stoker, o que culminou num processo judicial pelo qual foi determinada a destruição de todas as cópias. Felizmente, algumas remanesceram e a obra-prima pode ser apreciada nos dias atuais, no entanto, o estúdio Prana foi levado à falência em sua primeira produção, como decorrência das despesas da ação movida pelos herdeiros de Stoker.

As belas locações na Romênia, Alemanha e Tchecoslováquia, com seus fortes contornos mórbidos são um ótimo exemplo do movimento expressionista. É hipnotizante a atmosfera realista em paralelo ao tom onírico, formado, ainda que indiretamente, pelos parcos recursos da época.

Exortemos a tecnologia, mas de igual modo, aqueles que a desenharam em seus primórdios, possibilitando projetos impensáveis quando da sessão de cinema e o terror impingido às audiências no lançamento de 1922. Afinal, um clássico nunca cai de moda.