Artigo de Ivan Fortunato: 'Este mês jaz um grande professor: tributo a Girafales'

Ivan FortunatoIvan Fortunato – Este mês jaz um grande professor: tributo a Girafales

 

“Somente uma vez me enganei”, disse o grande mestre, “uma vez que pensei estar enganado”. Esta e tantas outras frases proferidas pelo professor Girafales me acompanharam por décadas, desde a premier do programa Chavo del Ocho, na década de 1980, no Sistema Brasileiro de Televisão. Há poucos dias faleceu Rubén Aguirre, o ator que imortalizou os bordões do mestre-linguiça nos quadros de humor pastelão da Vila. A saudade que ele deixa é enorme. Por isso, nos limites desta coluna, pretendo apenas registrar meus pêsames à família, aos amigos e a todos os fãs, pois também pranteio em luto.

Sou admirador declarado de Roberto Bolaños, in memorian, o criador de Chaves, Chapolin e as demais personagens que me divertem por décadas. Importante destacar que a mente criativa de Bolaños não fez nada sozinha, sendo necessário apontar que a dedicada performance de cada um de seus amigos-colegas-atores que deram vida ao Seo Madruga (in memorian), a Bruxa Clotilde do 71 (in memorian), o Quico, o Sr. Barriga/Nhonho, a Dona Florinda/Pópis, o Professor Girafales… o Godines, o Sr. Furtado, o Seo Jaiminho (que sempre quis evitar a fadiga, também in memorian), o Tripa-Seca, o SuperSam (“time is money”), o Homem Nuclear e tantos e tantos outros, incluindo, claro, o Chaves do Oito e o Chapolin Colorado (não contávamos com sua astúcia!).

Assim, com essa tietagem, nunca perco um só momento de recordar as cenas mais célebres, os episódios mais marcantes (como Acapulco, cidade que fiz questão de visitar e de adentrar, eclipsado, no hotel onde a trupe filmou suas peripécias), os bordões, os eternos quatorze meses de aluguel devidos, as canções… e, obviamente, o professor que tanto padeceu na escola com seus queridos, mas bagunceiros, alunos – posso fazer uma observação?

Vaidoso, o mestre nunca aparecia sem terno, gravata e chapéu. Ostentava sempre seu charuto, marca registrada da personagem, que lhe garantia presença e status. Galanteador, jamais visitaria a amada sem um mimo ou, como costumava dizer, um “humilde presentinho”. Não recusava uma xícara de café, se não fosse muito incômodo, claro, e adorava quando havia um delicioso bolo lhe esperando.

Com o Professor Girafales aprendi a contextualizar as contingências da vida, perguntando causa, motivo, razão ou circunstância.

Com o Professor Girafales aprendi que existem alunos bons, regulares, maus, péssimos… e o Quico.

Com o Professor Girafales aprendi a importância da “calistenia” para a prática desportiva.

Com o Professor Girafales aprendi a beleza de se apaixonar, a ponto de perder a fala e o ar na presença da pessoa amada.

Com o Professor Girafales, Chaves, Seo Madruga… Rubén, Bolanõs, Jamón, aprendi a rir mais das coisas banais e prosaicas do cotidiano, pois são elas que colorem a própria vida, aumentando o bem-estar e a sensação de estar vivo. Talvez por isso, a Vila do Chaves e as aventuras do Chapolin Colorado ainda façam rir quem assiste, mesmo sabendo repetir todas as falas e antecipar seus movimentos: de uma forma bastante simples, sutil até, essas pessoas e suas personagens conseguiram fazer de suas trapalhadas momentos de diversão. Por isso, neste momento soturno, é preciso lacrimejar o luto. Não obstante, jamais podemos nos olvidar do júbilo manifesto em suas estripulias que, mesmo sem querer querendo, tanto nos ensinaram sobre a alegria de viver. Esse será o melhor reconhecimento de que sua jornada nesta passagem terrena foi cumprida. Com êxito.