Interpretar a realidade brasileira antes da Independência

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo: Artigo ‘Interpretar a realidade brasileira antes da independência’

Foto do colunista Diamantino Bártolo
Diamantino Bártolo

A problemática da educação para a cidadania e para os direitos humanos ganhou visibilidade e pertinência maiores a partir da Segunda Guerra Mundial e também em Portugal. Mas se entre portugueses existiram (e ainda existem) graves situações de violação dos direitos humanos, como adiante se anotará, também nos territórios que atualmente constituem a CPLP – Comunidade de Países de Língua Portuguesa, o panorama não será o melhor, todavia, é oportuno, e justo, realçar o esforço que a partir das respetivas “Constituições Políticas”, bem como no domínio da intervenção concreta e diária se vem fazendo para melhorar comportamentos, atitudes e sensibilidades, relativamente ao cumprimento intransigente dos direitos humanos.

Um outro aspeto que importará referir, prende-se com o apelo que fica à sensibilidade de cada um para uma formação da cidadania. Em função das épocas, dos locais, das culturas, da formação e educação dos povos, entre outros fatores, também os valores serão diversos, não opostos, mas diferentes e, mesmo assim, haverá uma panóplia comum a todos os homens ou, pelo menos, é necessário que o seja. Os valores absolutos serão difíceis de se aplicar, contudo, cabe o dever de tentar implementá-los.

É importante, neste breve apontamento, vincar a ideia da tolerância, entendendo-a como fundamental para a compreensão dos demais valores, que visam proteger a cidadania, quando se habita um mundo cada vez mais universal, mais integral e globalizante, em que não é fácil lutar contra sectarismos e etnocentrismos onde, quando convém, consideram-se como bons os próprios atos, como excelentes as suas ideias; porém confrontados com opiniões, contrariedades e interferências nos interesses privados, falta a tolerância para compreender e aceitar os atos e as ideias dos outros concidadãos.

Em síntese: pretende-se com o presente trabalho, fortalecer a ponte Portugal-Brasil, recorrendo-se a um autor comum aos dois países, que se poderá considerar um marco nas semelhanças e diferenças das respetivas filosofias, para uma formação da cidadania, numa perspetiva de defesa dos direitos humanos e no contexto mais vasto dos valores ocidentais onde Filosofia, Educação, Religião, Direito e Política se entrelaçam. 

Está-se perante uma personalidade atenta à sua época, que teve a oportunidade de interpretar, presencialmente, a realidade brasileira, naturalmente afetada de alguma subjetividade e emoção, porquanto o período envolvente à Independência do Brasil, antes e depois, não foi o mais pacífico, devido a divergências entre a solução defendida pelos absolutistas liberais portugueses que pretendiam o regresso do Rei a Lisboa, e a vontade dos brasileiros em continuarem a ter D. João VI no Brasil e aqui se manter o poder central de um futuro Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. 

É possível que as reservas postas por Pinheiro Ferreira ao regresso do Rei a Lisboa, tivessem fundamento, pois outros autores reconheceram, mais recentemente, a existência de problemas de natureza separatista, ocorridos ainda antes da Independência, como acontecia um pouco por toda a Europa, excluindo-se Portugal, cuja independência e soberania datam do século XII. Acresce o fator dinástico que no Brasil constituiu uma razão de cariz unificador.

Quando D. João VI decretou, no Rio de Janeiro, o “Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves”, estava a dar corpo a uma unidade nacional, cuja estabilidade residia no vínculo de lealdade à Coroa, que simbolizava a dinastia. Ainda assim, não se evitaram os movimentos separatistas durante o Império, quantas vezes disfarçados de comportamentos reivindicativos federalistas. 

Esta proposta de Pinheiro Ferreira foi dirigida a D. Pedro II em carta oriunda de Paris, datada de 28 de Janeiro de 1841. Desta forma manifestava, uma vez mais, a sua inequívoca preocupação pelo desenvolvimento, bem-estar e dignidade do povo brasileiro e, para se ser correto, é necessário contextualizar as suas atitudes e alegadas afirmações para se compreender o alcance dos seus projetos, porque o sentido de justiça estará sempre presente no seu espírito. 

É a partir da vida de um luso-brasileiro que se procura sensibilizar a opinião pública para os valores da liberdade, da igualdade e da solidariedade, como fundamentos inalienáveis da Cidadania Democrática. Dotado de uma determinação quase absoluta, no desempenho dos vários papéis, com destaque para a sua caraterística de insaciável curiosidade intelectual, soube posicionar-se na sociedade pela sua vastíssima erudição, refletindo no pensamento e na própria vida o confronto das influências vigentes no seu tempo, buscando com caráter e nobreza de espírito, a conciliação de teorias opostas, como sejam o espiritualismo e o sensismo positivista.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
site@nalap.org

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