Claudia Lundgren: 'Reminiscências'

Claudia Lundgren

Reminiscências

Vão-se os homens e mulheres; ficam os versos, as crônicas, contos e romances. Leitores vêm e vão, mas os livros permanecem.

A sepultura silenciou as bocas, mas não foi capaz de calar as vozes; elas vivem nos vinis, CDs, rádios, aplicativos e na nostalgia dos amores vividos.

A cortina fechou-se para muitos; as luzes se apagaram; os artistas, porém, vivem em filmes inesquecíveis, novelas e séries.

Foi-se o pai de família; boas ou más, ficaram suas memórias.

Foram se as mães, mas ficaram seus frutos e lutas incessantes.

Vai-se o professor, fica a aprendizagem; as formaturas, as graduações, mestrados e doutorados; ficam os advogados, os engenheiros, os funcionários públicos e todas as outras profissões.

Vão-se os médicos e os cientistas; vivem neles os reestabelecidos, as conquistas, os avanços e as doenças erradicadas.

Foram-se os gritos, ficaram os ais. Na luta a favor da independência, da liberdade da emancipação feminina, da equidade salarial, da igualdade social e de outras causas, foi preciso coragem e resistência; muitos deram suas próprias vidas. Mártires famosos e anônimos foram substituídos por direitos.

Ficaram para trás as senzalas, os chicotes e o sangue; ficaram os senhores, o choro silencioso, as humilhações que a menina sofre na sala de aula e a escravidão.

 

Claudia Lundgren

tiaclaudia05@hotmail.com




Leila Alves: 'Lembranças da minha infância'

Leila Alves

Lembranças da minha infância

Tenho lembranças infindas, dessas que nos faz sorrir e chorar, ao mesmo tempo. Sorrir, por não deixar de ser engraçado, chorar, por serem eventos que não voltam mais. Recordo os sobrados antigos, estilo barroco (inclusive morei em um). Posso vê-lo na tela da minha mente, como também lembro das teias de aranhas no sótão, meio às sucatas, que não serviam mais para uso. Também dos morcegos, drapejando, voando janela adentro, remetendo ao medo e pavor.
Lembro-me bem das corujas com seus agouros, piando nos telhados, avisando que alguém iria morrer. (superstição dos mais velhos).
Recordo da madrinha Marinalva arrastando o chinelo no chão, repetindo três vezes:
– Vai comer feijão com arroz! Vai comer feijão com arroz! Vai comer feijão com arroz! Isso, para espantar os maus presságios.
Lembro-me que quando criança, de tudo eu era um pouco: bailarina, atriz, cantora, escritora, artista, enfim. Mas o que mais gostava, era de ir nos finais de tarde à “Biblioteca Rui Barbosa”, única na cidade. Amava sentir o cheiro dos livros e do ambiente colonial. Tudo ali me encantava: dos livros aos retratos pendurados nas paredes. Inclusive, do próprio “Rui Barbosa,” que era o poster central que adornava a parede, de modo que todos que ali chegavam percebiam e conheciam o patrono do recinto.
Hoje senti saudades e dei boas risadas, recordando, claro, meus saudosos tempos de criança… tempos estes que não voltam mais. Sem falar na Praça Pedro Coutinho, berço dos meus eternos madrigais. Foi lá, onde tanto brinquei, onde fui feliz e não sabia. Êita saudade desenfreada, meu Deus! Não esqueço da feira livre, defronte à minha casa. Quando a música soava nos alto-falantes dos postes de luz da rua, só dava eu. Corria aos pulos e, tão logo, começava eu a dançar e a rebolar no centro da feira.
O mais interessante, é que o povo se formava em círculo, tudo isso, para assistir a pequena mocinha dançar. Tinha lá meus três, quatro anos. Esta parte, não lembro bem, cresci escutando a minha família falar. Lembranças estas que me fazem sorrir e chorar. Mas uma coisa é certa: que valeu a pena, isso, valeu!
Leila Alves
 leila.alvesmlc@gmail.com

 

 




Leila Alves: 'Reminiscências'

Leila Alves

Reminiscências

Na secreta solidão, adentro a minha dor

deixando morar em mim a saudade do que

nunca fui, talvez por distração ou esquecimento

do destino.

 

No remanso das horas pego-me oriunda das

promessas que fiz ao tempo, que não se

esquivou em levá-las ao vento, deixando apenas

resquícios de minhas lembranças.

 

Sustento-me pois, nos pilares da tormenta,

ascendendo em mim o álibi da promessa que fiz

e, que subitamente se perdeu na curva abstrata

do infortúnio.

 

Patenteio pois, as minhas dúvidas, brotando em

mim a esperança de nunca estar só, mas

acompanhada desta névoa que sou,

neste emaranhado leito de procura.

 

Nos pilares da saudade reverbero a ânsia de ser

o que não fui, o que não sou e, ainda desejo

porvir, na minha vã

reminiscência.

 

Leila Alves

leila.alvesmlc@gmail.com