O SescTV disponibiliza on demand os episódios inéditos da série Dança Contemporânea. Exibida pelo canal desde maio de 2009, com direção geral de Antonio Carlos Rebesco, a nova temporada da série propõe um olhar plural para a cena da dança contemporânea no país, a partir das poéticas do corpo negro na cena. (Assista em sesctv.org.br). No dia 25 de junho, quinta, às 20h, o canal exibe o programa Mensagens de Moçambique, encenado pela Taanteatro Companhia.
A Nova Temporada da Série Dança Contemporânea é composta por 13 programas, com duração de 52 minutos cada. São eles: Encruzilhada – Fragmento Urbano, Arquivo Negro – Passos Largos em Caminhos Estreitos – Cia Pé no Mundo; Noite de Solos composto pelas apresentações Depoimentos para Fissurar a Pele – Núcleo Djalma Moura e Corredeira – Nave Gris Cia Cênica; Filhxs –da– P°##@ – T O D A – Coletivo Calcâneos; Herança Sagrada – A Corte de Oxalá, com o Balé Folclórico da Bahia; Cria – Cia. Suave; Eles Fazem Dança Contemporânea – interpretado por Leandro Souza; Anonimato- Orikís aos Mitos Pessoais Desaparecidos – Cia Treme Terra; Subterrâneo – Gumboot Dance Brasil; 5 Passos para não Cair no Abismo – Cia Urbana de Dança; Mulheres do Àse.- com Edileusa Santos ; Sons D’Oeste -Trupe Benkady e Mensagens de Moçambique – Taanteatro Companhia.
As novas produções que têm curadoria da artista e pensadora em dança, gestora cultural e cientista social Gal Martins, além de seguirem a mesma proposta das edições anteriores, também propõem uma reflexão sobre os rumos conceituais da dança contemporânea para televisão. (Assista também pela internet em sesctv.org.br/noar).
Para Danilo Santos de Miranda, Diretor do SescSP, que mantém o SescTV como uma das ações digitais da instituição, “a dança, como uma das linguagens artísticas, promove a ampliação de nossas percepções sobre nós mesmos e sobre a sociedade, a partir do senso estético e ético. Para o Sesc, proporcionar ao público a fruição da dança nos meios audiovisuais, é expandir, de forma democrática o acesso aos bens culturais, uma das diretrizes da instituição”.
Segundo Gal Martins, nessa temporada, a série Dança Contemporânea apresenta trabalhos que evidenciam um panorama artístico múltiplo que questiona padrões hegemônicos relacionados a noção de Corpo Negro, Processo e Estética. A dança protagoniza uma trama diversa na qual periferias e centros encontram-se, chocam-se e retroalimentam-se, construindo um território que é multifacetado no que diz respeito aos percursos de concepção. Gal Martins propõe as corporalidades plurais nas danças contemporâneas com o intuito de fazer presente, com a devida dignidade, a multiplicidade de vozes que compõem o universo da dança em todo o país, os quais contemplem o corpo negro, o corpo feminino, o corpo periférico, o corpo gordo, o corpo LGBTQI+ e tantos outros. “A poética desse processo de curadora também evidencia os afetos como ferramenta de resistência, afetos que me afetam e irão afetar também todos os expectadores”, afirma a curadora.
O espetáculo Sons D’Oeste foi gravado no Sesc Belenzinho, sob direção de Flávia Mazal. A apresentação alia o ballet africano a pesquisa de ritmos temáticos, fazendo uso de instrumentos tradicionais como o balafon, os dununs, djembês, kalimbas e berimbaus. “Sons D’ Oeste vem articular memórias, ritmos ancestrais, unindo dança, música, ritmo e corpo”, explica a diretora. Segundo Flávia, o Sons D’ Oeste nasceu com a proposta de unir timbres diferentes porque os espetáculos africanos utilizam o tambor o tempo todo. “Fazemos uma pesquisa de ritmos e outros tons na música fazendo inclusive, uma comparação de situações sociais do que acontece no Brasil e, igualmente, em Guiné, na Costa Oeste da África”, afirma.
Em Mensagens de Moçambique, o diretor, dramaturgo, cenógrafo e figurinista Wolfgang Pannek explica que a aproximação entre ele e o bailarino Jorge Ndlozy foi uma colaboração frutífera por afinidades artísticas que, ao mesmo tempo, trazem experiências sociais e históricas diferenciadas. “A companhia trabalha com a mitologia pessoal dos artistas envolvidos, no caso do Jorge, um moçambicano realizando um trabalho poético e político”, diz o diretor. Segundo Wolfgang é desenvolvido um diálogo sobre que é relevante para o público, de acordo com as experiências de cada um.
Jorge Ndlozy conta que o trabalho da Taanteatro Companhia reúne três continentes diferentes como Europa, África e América. “A coreografia de Mensagens de Moçambique é inspirada na moçambicanidade, costumes de Moçambique e de outras partes do mundo, como consequências do período colonial na África”, explica Jorge.
Em Herança Sagrada – A Corte de Oxalá, os bailarinos reproduzem com fidelidade sequências de movimentos de alguns dos mais importantes rituais do Candomblé, numa coreografia baseada em danças do culto afro-brasileiro. O espetáculo, que já foi aplaudido nos Estados Unidos, Europa, Caribe, Oceania e África, conta com direção geral de Walson (Vavá) Botelho e direção artística de José Carlos Santos (Zebrinha). A segunda parte do espetáculo reúne coreografias clássicas do repertório do Balé, que traduzem as mais importantes manifestações folclóricas baianas, em “Puxada de Rede”, “Capoeira” e “Samba de Roda”, além de “Afixirê”, coreografia inspirada na influência dos escravos africanos na cultura brasileira.
Encruzilhada transita entre as danças urbanas e manifestações artísticas brasileiras, criando um diálogo com a atualidade que ressignifica a ancestralidade. A apresentação é interpretada pelo grupo Fragmento Urbano, ancorado na circulação pelos mais variados espaços da zona urbana, vivenciando, em cada um deles um público distinto. Nessa concepção, Encruzilhada fomenta a pesquisa continuada, que busca encontrar na heterogeneidade social, étnica e cultural, estímulo e inspiração para suas criações.
“Quando o falar de si é tratar de contextos periféricos que se relacionam com a afro-diáspora, com os ameríndios e que dialogam com a ancestralidade e memórias pouco celebradas, o corpo também ganha voz. Dançar se torna palavra. Dançar a contra-história nos faz renascer. O que permite compartilharmos e vivenciarmos o mundo transformado em nossa encruzilhada”, afirma Douglas Iesus, diretor do espetáculo.
Anonimato – Orikís aos Mitos Pessoais Desaparecidos é um espetáculo de dança negra que revela situações do cotidiano brasileiro, e aspectos ligados ao soterramento e aniquilamento das memórias negras no seio de uma sociedade eurocentrada. De maneira poética a obra aborda o genocídio étnico-cultural e suas consequências na vida social urbana. Encenado pela Cia Treme Terra.
A trajetória de personalidades negras como João Cândido, Maria Firmina dos Reis, Luiz Gama, Carolina Maria de Jesus, Abdias do Nascimento e Aleijadinho inspiraram o espetáculo Arquivo Negro – Passos Largos em Caminhos Estreitos. A montagem resgata e reapresenta arquivos históricos sobre uma cultura afro-brasileira que não nos foi verdadeiramente contada. “Com a Cia Pé no Mundo, os bailarinos subvertem a lógica e propõem processos de investigação que pautam as questões contemporâneas que atravessam seus corpos, fazendo alusão a grandes personalidades negras e suas contribuições para a sociedade”, explica a curadora Gal Martins.
Cria investiga a noção de criação e suas possibilidades, como a dança da vida na favela, uma corda bamba onde cada instante é valorizado. O espetáculo retrata uma comunidade e as suas relações com os movimentos e a dança, que transformam a violência do atual contexto brasileiro em potência criativa.
Cria é o segundo espetáculo da Cia. Suave e nasceu inspirado na dancinha, estilo derivado do passinho, através do entrelaçamento do funk com a dança contemporânea e de uma potente pesquisa sonora.
O intérprete Leandro Souza foi buscar na performance e nas artes visuais a inspiração para a criação de Eles Fazem Dança Contemporânea. Em um cenário que reproduz o tradicional cubo branco de galerias de arte, o bailarino busca a relação entre o seu corpo, a fala e um objeto cênico. A apresentação acontece a partir de uma lógica da repetição, sobreposição e transformação de ações, movimentos e produção de imagens. A voz do bailarino, repetindo as mesmas frases (em inglês e português), cria uma espécie de ritmo para a cena, além de uma sensação de quase hipnose junto ao público, enquanto ele executa movimentos que fogem dos sinais codificados da dança.
Em uma sociedade que historicamente considera a agressão como algo normal, o espetáculo Filhxs –da– P°##@ – T O D A, encenado pelo coletivo Calcâneos, tem a intenção de transpor as dores dos corpos dos moradores da periferia, que sofrem com os altos índices de preconceitos sociais. A montagem manifesta-se na pretensão de instigar questões crítico-reflexivas por intermédio de uma obra artística em dança sobre o “ser periférico”, na reverberação dos contextos de opressor e oprimido, a partir das relações que circundam essas atuações dando corpo a assuntos polêmicos.
Em Noites de Solos temos dois espetáculos – Depoimentos para Fissurar a Pele e Corredeira. O primeiro, concebido por Djalma Moura, investiga os arquétipos do orixá Iansã, através de uma coreografia que intenciona criar fissuras no tempo e espaço, a partir das memórias do corpo negro. Iansã é o Orixá que dá corpo para o trabalho. Inserida diretamente nas coreografias, os movimentos de palco concentram-se em seus arquétipos e analogias em relação à natureza — sejam elas dentro do aspecto animal ou de tempo — como os ventos, as tempestades, os raios, o búfalo. Todos esses elementos são utilizados como disparadores do processo criativo das danças.
Concebido e dançado por Kanzelumuka, o espetáculo Corredeira nasce da percepção das águas que correm para o mar e da relação entre ancestralidade, às águas e o corpo feminino. A corporeidade levada à cena tem sua origem nas tradições e saberes banto, em especial nas danças presentes em manifestações religiosas de matrizes africanas. É também um exercício de reflexão em torno do corpo negro que dança. Corredeira é dança mergulhada nas formas de representação próprias das culturas negras de origem banto.
Em 5 Passos Para Não Cair No Abismo, a coreógrafa Sonia Destri Lie e os dançarinos da Companhia Urbana de Dança desenvolveram a apresentação inspirados no texto do Caio Fernando Abreu “Vórtice, voragem, vertigem”, que, de acordo com Sonia, deveria ter se chamado “voragem” – aquilo que sorve ou devora. É assim que a companhia se sente, tanto no abismo dos perigos de ser periférico, quanto os de estrelas falsas e de beijos e desejos. “O espetáculo reflete sobre como lidamos com nossos próprios abismos e propõe uma discussão acerca da realidade vivida pelos integrantes do grupo que driblam suas realidades dentro do contexto social periférico.
Traçando um paralelo entre a experiência dos mineiros africanos do século XIX e a luta e sobrevivência da população negra e periférica das grandes cidades brasileiras, o espetáculo Subterrâneo propõe uma explanação em forma de dança e música, sobre as memórias soterradas de personagens suburbanos, vítimas de um regime de extermínio que avança sistematicamente.
O programa Mulheres do Asè, cujo espetáculo é dirigido e concebido por Edileusa Santos, reúne performance e depoimentos de personalidades do Candomblé da Bahia, em que a dança contemporânea, música, poesia e religiosidade afro estão em cena. Segundo a curadora Gal Martins, o espetáculo é uma performance ritual que nos embala e revela crença, sentimentos e resistências das mulheres que atuam nas religiões de matrizes africanas. “É um espetáculo que evidencia a celebração, percepção, personalidade, fé e àse pelos orixás, inquices, voduns e caboclos, cuja valorização se manifesta na plasticidade da cena e no corpo maduro das intérpretes”, explica.
Curadoria: Gal Martins
Artista da Dança, Atriz, Arte Educadora, Gestora Cultural e Cientista Social. Com 20 anos de pesquisa em dança, em 2002 cria a Cia Sansacroma, grupo paulistano de dança contemporânea preta. No ano de 2007 recebeu o Prêmio Criando Asas (Red. Bull e Instituto Criar de TV e Cinema) pelo projeto: “Imagens de Uma Vida Simples” – espetáculo e documentário abordando a vida e obra de Solano Trindade. No ano de 2011 atuou como vice-presidente da Cooperativa Paulista de Dança. Em 2014 recebe o prêmio “Denilton Gomes” na categoria Difusão em Dança. Em 2016 foi eleita uma das 10 personalidades negras do país pelo canal Pretinho Mais que Básico. Em 2017 recebe o prêmio APCA na categoria Difusão e Memória da Dança pelo projeto “Circuito Vozes do Corpo”. Atualmente além do trabalho com a Cia Sansacroma, criou e compõe a zona AGBARA, projeto destinado a produção em dança de mulheres pretas e gordas e atua como Supervisora Artística Pedagógica do Programa Fábricas de Cultura.
Acompanhe também a programação do #Do13ao20 – (Re)Existência do Povo Negro, que faz alusão aos marcos do 13 de maio e do 20 de novembro, propõe diálogos sobre a condição social da população negra e objetiva reiterar os valores institucionais, bem como o reconhecimento das lutas, conquistas, manifestações e realidades do povo negro.