No tribunal das sombras
Clayton Alexandre Zocarato: ‘No tribunal das sombras’


às 10:11 PM
Na penumbra da sala onde a fé julga a razão, o homem se ergue — não com armas, mas com ideias.
Giordano Bruno, filho do cosmos e amante da eternidade, caminha entre inquisidores como quem pisa sobre brasas e estrelas.
A toga negra que o observa não vê um corpo, mas uma ameaça, a centelha que ousa incendiar a noite da ignorância.
Ali, entre cruzes e códigos, ele fala. Fala com a ousadia dos que não negociam o infinito.
Seu verbo é vasto, como os mundos que imagina — mundos sem fim, dançando na mente de Deus.
E cada palavra sua é uma afronta, cada visão uma heresia, pois o universo que abriga todos os deuses não cabe numa cela de dogmas.
“Recuas?”, perguntam os juízes, com as chamas já acesas nos olhos.
E Bruno responde com silêncio — não o da submissão, mas o da eternidade que já o reclama.
Condenaram à fogueira, como se o fogo pudesse consumir a luz.
Mas naquele 17 de fevereiro, em Campo de Fiori, não foi um homem que queimou — foi o medo, tentando silenciar o pensamento.
E quando a carne se fez cinza, o espírito se fez constelação.
Vida e morte, naquele instante, se confundiram como irmãos gêmeos: uma entregando o corpo à outra, a outra libertando a alma para sempre.