Educação fim de linha

Renata Barcellos: Artigo ‘Educação fim de linha’

Renata Barcellos
Renata Barcellos
Imagem criada por IA da Meta
Imagem criada por IA da Meta

Findo o ano de 2025 aposentada na matrícula mais antiga da Rede Estadual do Rio de Janeiro. Formei-me em 1996 em Português/Francês. São quase trinta anos de ensino de língua materna e estrangeira. Quando iniciei a docência, ministrava aulas em cursos de línguas no município do RJ e, na baixada, especificamente, no Sargento Roncalli. De lá, tenho ótimas recordações de alunos e fiz amigos. Nesse período, dediquei-me a pesquisas. Fui do curso de extensão ao doutorado. Minha prática pedagógica foi sendo aprimorada à medida que eu ia desenvolvendo pesquisas.                                                                            

     Como a palavra “educação” tem origem no latim e se conecta a duas raízes: educare (“criar”, “nutrir”, “alimentar”) e educere (“conduzir para fora”), a etimologia sugere a ideia de guiar o indivíduo para fora de si mesmo, desenvolvendo seu potencial e preparando-o para o mundo. Essa concepção norteou minha prática pedagógica até hoje. 

     Entretanto, chegar à aposentadoria e ao fim deste ano letivo e constatar o desmonte da EDUCAÇÃO é lamentável. Anos de dedicação, estudo, de práticas inovadoras, matérias, artigos, livros e ebooks publicados para me encontrar em um CAOS: professores doentes, alunos desinteressados, carga horária excessiva, má formação e infraestrutura, assédio moral…                                                                          

     Especialistas alertam que a romantização da docência e a ausência de legislação federal específica criam um cenário de “violência invisível” e impunidade. Isso acarreta o padecimento em massa nas escolas (de todos os envolvidos: do aluno à direção). Na sala de aula, professor se depara com falta de material, desrespeito, muitas vezes, Bullying, a desordem impera. E todos adoecem. Há relato de que o professor passou mal em sala no fim do turno e levou falta por ter saído umas horas antes de findar o horário. Muitas denúncias de assédio moral. A prática vem atingindo “níveis alarmantes”, onde o ambiente escolar TÓXICO está se transformando em um local de adoecimento físico e/ou psíquico.                                                                                                                                          

       A sala de aula se tornou um ringue. Vence quem é o mais astuto. Nós, professores, entramos em um campo de batalha, minado. Por mais que organizemos as atividades, jamais poderemos imaginar o que nos acontecerá. Os nervos vivem à flor da pele. Qualquer barulho abala nosso sistema nervoso. Constantemente, estamos “no limite”.                                                                                             

      Vale ressaltar que o professor não é um missionário. Somos profissionais! Porém, muitas vezes, ainda a sociedade nos vê como “segunda família”. Impera uma visão romantizada da docência. Isso acarreta um mecanismo de silenciamento. Porque somos “SUPER HERÓIS”. Há uma cultura de que a culpa da violência institucional é nossa. Por quê? A que ouvimos e lemos constantemente: não somos competentes, não temos domínio de turma, não organizamos uma aula motivadora, não construímos o conhecimento, não temos capacitação para lidar com as múltiplas deficiências… Triste realidade! Estamos exaustos! Desmotivados! Abalados!                                                           

       O Brasil lidera rankings internacionais de violência contra professores (OCDE). O resultado prático é o esvaziamento das licenciaturas (ainda mais com a reforma da previdência) e o aumento exponencial da Síndrome de Burnout. A escola é uma instituição de construção de conhecimento. Não triturador de sonhos. Este local precisa ser frutífero: disseminador de conhecimentos, realização de descobertas…. Um local de satisfação, contemplação… Jamais de destruição de corpo e alma.                                                                                                                                                 

       Para quem veste a camisa da Educação, diariamente, é desolador, aterrorizante ler notícias de ataques (seja lá qual for a natureza da violência) nas escolas.  Passei minha vida em sala de aula (ora como aluna ora como professora) e jamais poderia imaginar que viveria uma total desordem neste ambiente de construção de conhecimento. Como professora de literaturas, na atualidade, raramente, um aluno lê o texto sugerido. Aliás, até mesmo professor pouco lê muitas vezes. Estamos na Era do Imediatismo, de consulta à IA… Quem “gasta” seu “HD” refletindo…?                                                                                          

      Devemos entender que a vida é um grande palco, interpretamos a todo momento. Mas no palco da sala de aula, ninguém quer ser o “palhaço”. O aluno precisa ser orientado de que estudar é um ato solitário. Precisamos de silêncio para refletir, estabelecer relações. A vida não é uma grande festa 24 horas.                                                                                        

      E, no “apagar das luzes” de 2025, a rede Estadual de Educação do Rio de Janeiro está divulgando uma mudança feita por meio do decreto nº 49.994/2025  decreto assinado pelo governador do estado, Cláudio Castro. Este com o objetivo de reduzir a evasão escolar, o governo do Rio de Janeiro autorizou que “alunos do ensino médio reprovados em até seis disciplinas possam avançar para a série seguinte. Esses deverão cumprir um regime especial de recuperação no ano seguinte, no qual deverá ser concluído até o fim do primeiro trimestre”. 

      No caso dos alunos do 3º ano do Ensino Médio, o limite de reprovações reduziu para três disciplinas. Se aprovados na recuperação, poderão receber o certificado de conclusão do Ensino Médio. Concorda?                                                                                                     

     A questão é: para esta Geração Alpha (2010-2025 – os mais jovens, nascidos em um ambiente digital e imersos em tecnologia), há sentido em estudar? Quem estudará? Alguém prestará atenção no professor? Como preparar os alunos para ENEM, UERJ, PUC RJ com esta alteração? Há 30 anos preparo para exames externos (esses e para ingresso na carreira militar), especificamente os alunos da rede Estadual do RJ, nunca vi tamanho desinteresse já neste ano de 2025. Estou imaginando a partir de 2026 como será.                                                                                                                                           

      Quanto às leis nº 10.639/2003 (estabeleceu o ensino da cultura afro-brasileira) e 1.645/2008 (ampliou essa obrigatoriedade ao incluir a cultura e história dos povos indígenas), urge apresentar escritores, escola literária a qual pertence e seu estilo. Fica a dica para conhecerem outros autores contemporâneos no ebook Navegando nas Literaturas afro-brasileiras e indígenas.  

       Por uma educação de qualidade!!! Os alunos da Rede Estadual do Rio de Janeiro merecem ser bem preparados!!! Abaixo o decreto nº 49.994/2025 !!!!

Renata Barcellos

Voltar

Facebook




Textos literários no Enem 2025

Renata Barcellos: ‘Textos literários no Enem 2025’

Renata Barcellos
Renata Barcellos
Renata Barcellos. Arquivo da autora

Dia 9 de novembro de 2025 foi aplicada a primeira etapa da prova do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de linguagens cuja prova é objetiva, com 45 questões e uma redação com a temática “Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira”. Um dos temas cogitados por mim desde o início do ano letivo. As duas etapas das provas são estruturadas em quatro matrizes de referência. Um dos meus Pós-doutoramento foi na análise das elaborações das questões de análise linguística a partir dessas matrizes.                                                                                                                                                     

      Nesta edição, quanto às questões propostas a partir de textos literários, foram 10 de diferentes escolas literárias.  O primeiro texto foi a contemporânea Ana Elisa Ribeiro (professora titular do CEFET-MG, pesquisadora do CNPq e escritora – poeta e editora – @anadigital) intitulado De próprio punho, publicado no jornal Rascunho, em 2021. Segundo ela, “interessante ter o texto no Enem. Para a escritora, uma grande oportunidade de ser lida e ter um momento para se dedicar ao texto. Enquanto linguista, um texto mais longo para cinco questões propostas com habilidades diferentes. Isso faz com que o candidato leia-o para entender e responder. Considerei uma indução interessante de um texto mais longo em relação aos textos fragmentados para uma questão. Como o Enem propôs isto: ler textos maiores, as escolas precisam reforçar. Se isso for uma tendência do Enem, dar mais atenção a textos mais longos para o desenvolvimento da leitura. Foi uma mudança interessante além de ser um texto meu. Isso pode induzir também a da formação”.                

      O contemporâneo Ruy Castro (jornalista, biógrafo e escritor brasileiro contemporâneo), sempre seus textos estão presentes nas provas de concurso. Em entrevista a Biblioteca Pública do Paraná:

“Certa vez me perguntaram: ‘Ruy, você faz livros e trabalhou a vida inteira como jornalista, sente-se mais jornalista ou escritor?’. Respondi que as duas coisas, dependendo do instrumento que eu estou tocando no momento. Mas trocaria essas duas atividades por uma outra, muito mais importante para mim, que é ser leitor. Eu deixaria de ser escritor tranquilamente para ser apenas leitor, se pudesse. Hoje mesmo dei um pulo num sebo aqui em Curitiba, o Fígaro, e o Paulo, dono do local, pediu que eu autografasse um livro para a loja. Escrevi o seguinte: “Quando morrer, não quero ir pro céu, quero vir pro Fígaro”. E é verdade, após a morte, eu iria para um sebo, para uma biblioteca ou para qualquer lugar que tivesse livros, jornais ou até mesmo bula de remédio para ler”.  Um fragmento do texto proposto no Enem: “Frases feitas são aquelas que entram por um ouvido e saem pelo outro sem um estágio intermediário no cérebro. A boca fala por conta própria, dispensando-nos de pensar. E não tem problema nisso. Ou as ditas frases se incorporam à língua ou morrem e nascem outras. A língua é assim. Simples assim.assim”.                                                                                                                             

      Visconde de Taunay autor de “Inocência”. Um romance que narra a trágica história de amor entre Inocência (uma jovem do sertão de Mato Grosso) e Cirino (um farmacêutico que se passa por médico). O romance acontece no Brasil do século XIX e explora o choque entre o mundo patriarcal do sertão, onde Inocência é prometida a Manecão, e a paixão proibida surge com Cirino. Trata-se de um romance regionalista brasileiro do Romantismo, dividido em 30 capítulos e cada um é introduzido por uma citação – mais um epílogo.                                                                                                                    

      Marcelino Juvêncio Freire (Sertânia, 20 de março de 1967) é um escritor contemporâneo brasileiro e editor – @marcelino_freire_escritore vencedor do Prêmio Jabuti (2006) com o livro “Contos negreiros” no qual apresenta uma releitura moderna do preconceito, dando um novo olhar aos marginalizados da sociedade.                                         

      Gilka Machado foi uma poetisa simbolista brasileira. Ficou conhecida como uma das primeiras mulheres a escrever poesia erótica no Brasil. Hoje, praticamente, apagada das instituições de ensino.  Quando se reporta ao Simbolismo se restringe a abordar Cruz e Souza. Isso ocorre até nas licenciaturas. Ótima iniciativa ser proposto um texto da autora a fim de estimular a leitura de sua obra.                 

       Renato Galvão (escritor, poeta, artista e produtor cultural)
O fragmento proposto foi o da obra Borboletas no Estômago descreve tal efeito através de textos poéticos que nos faz refletir.                                                                                                                             

      Vicente de Carvalho (1866-1924 – advogado, jornalista, político, abolicionista, fazendeiro, deputado, magistrado, poeta e contista brasileiro). É considerado um dos maiores poetas parnasianos brasileiros, conhecido por sua linguagem precisa, rigor estético e temas que incluem o amor, a morte e, especialmente, o mar. Entretanto, pouco é estudado da Educação Básica à Superior.                                     

      Eliana Alves Cruz (escritora contemporânea brasileira, roteirista e jornalista. Prêmio Jabuti de Contos 2022 – @elialvescruz). Nesta prova, é  proposto um fragmento do romance histórico “Água de Barrela”. O livro narra a saga de uma família negra por gerações, desde o período da escravidão no Brasil até os dias atuais, abordando temas como ancestralidade, resistência e as marcas do rascismo cultural estrutural.                                                                                                                                   

       Jorge de Sá (escritor, poeta e diplomata brasileiro contemporâneo). O fragmento do texto proposto de autoria do autor é uma reflexão sobre conto e crônica:  “Sendo a crônica uma soma de jornalismo e literatura (daí a imagem do narrador-repórter), dirige-se a uma classe que tem preferência pelo jornal em que ela é publicada”. Este tema já foi abordado por diversos escritores. Trata-se do recurso linguístico da metalinguagem.            

      Carmen Dolores (pseudônimo de Emília Moncorvo Bandeira de Melo – 1852-1910, uma das escritoras brasileiras mais influentes no início do século XX e também pioneira na luta pelos direitos femininos. Em uma época na qual mulheres sequer podiam votar, Emília tratou, com sua escrita incisiva e corajosa, de temas incendiários, como o direito ao divórcio, à educação e a igualdade no trabalho, além de ironizar o conservadorismo católico. A autora ingressou na imprensa como diletante ao ficar viúva, com seis filhos para criar. Passou a escrever crônicas — assumindo a coluna de Machado de Assis, no jornal O paiz —, artigos de crítica literária e contos até sua morte, tornando-se a colunista mais bem paga no Brasil). Outra escritora proposta “apagada” da historiografia literária. Precisa ser trabalhada da Educação Básica à Superior. Em uma época na qual a mulher não tinha “voz” e era “impensável estes temas”, ela teve coragem de abordar e lutar por temas tão delicados. O Enem propôs um fragmento da sua obra mais famosa é A luta (livro de estética naturalista publicado pela Garnier, em 1911. Anteriormente, publicado em folhetim pelo Jornal do Commercio, em 1909).

      Outra escritora contemporânea de Dolores é Andradina América de Andrada e Oliveira (1864 – 1935: jornalista, escritora, atriz, dramaturga e líder feminista brasileira. Fundou em 1898 o jornal literário Escrínio). Esta também defendeu o direito ao divórcio. Escreveu dentre outras obras, Divórcio, em 1912, na qual defende o divórcio “pleno”, para dar uma nova chance às mulheres subjugadas por casamentos infelizes. Estas duas escritoras à frente de seu tempo devem ser estudadas da Educação Básica à Superior.                                                                                                                                                 

       E a última a ser abordada foi Clarice Lispector (1920-1977 – autora de romances, contos e ensaios. É considerada uma das escritoras brasileiras modernistas mais importantes do século XX). A questão proposta foi um fragmento da obra Aprendendo a viver. Trata-se de uma seleção das crônicas confessionais que a escritora escreveu no Jornal do Brasil, entre agosto de 1967 e dezembro de 1973. Organizado por Pedro Karp Vasquez, o livro reúne uma série de textos em que a escritora conta sua própria vida, na primeira pessoa. Detalha passagens marcantes de sua história ao divagar sobre os temas mais variados e revela particularidades de seu cotidiano e esmiuça seu processo criativo. Neste, por exemplo, ela revela quais foram os livros que marcaram cada fase de sua vida e rejeita o rótulo de intelectual: “Ser intelectual é usar sobretudo a inteligência, o que eu não faço: uso é a intuição, o instinto”. Cabe dizer que tenho alma “clariceana”.                                                                                                                             

      Para concluir, cabe dizer que, cada vez mais, urge explorar textos diversos e das diversas escolas literárias. E de autores “apagados”, “cancelados” também… Não se restringir aos clássicos. Os candidatos precisam comprovar nas provas externas a importância das Literaturas. Como disse Eliana Alves Cruz, a literatura é “uma agulha para costurar a tapeçaria da nossa história”. E como há belas agulhas dispostas a coser as memórias do povo brasileiro. Vale destacar a falta de autores africanos e indígenas nas questões propostas. As Leis nº 10.639/2003 estabeleceu o ensino da cultura afro-brasileira e 11.645/2008 ampliou essa obrigatoriedade ao incluir a cultura e história dos povos indígenas. Fica a dica para conhecerem outros autores contemporâneos no ebook Navegando nas Literaturas afro-brasileiras e indígenas .  Viva as LITERATURAS!!!!

Renata Barcellos

Voltar

Facebook




Projeto Com a palavra o autor

Renata Barcellos: Projeto ‘Com a palavra o autor’

Renata Barcellos
Renata Barcellos
Renata Barcellos e Regina Pouchain

Este projeto consiste em os alunos do Terceiro ano do Ensino Médio do Colégio Estadual José Leite Lopes (NAVE RJ – disponível Link de ebook gratuito) interagirem com os escritores afro-brasileiros e indígenas. Trata-se de um trabalho final de Ensino Médio com objetivo de conhecerem autores contemporâneos das diversas vertentes literárias.  A proposta sugerida foi de apresentarmos uma minibiografia, redes sociais, foto, uma breve entrevista acompanhada da técnica da retextualização cuja definição é “o processo de transformação de uma modalidade textual em outra […]. Reescrita de um texto para outro, processo que envolve operações que evidenciam o funcionamento social da linguagem” (DELL’ISOLA, 2007, p. 10).                                                                                                                                                   

    As literaturas contemporâneas abordam temas instigantes e complexos, refletindo a realidade e as preocupações do nosso tempo. Entre os temas mais relevantes, destacam-se a diversidade e inclusão, as questões sociais e políticas, a memória e a identidade, o meio ambiente e a tecnologia, além da exploração da experiência humana em um mundo globalizado e em constante transformação. Urge adotarmos a leitura de autores contemporâneos também em nossas práticas pedagógicas da Educação Básica à Superior.                                                                                                                                         

     Na poesia, especificamente, na vertente literária da Poesia Visual, vertente datada de 300 a.C, ganhou impulso a partir das vanguardas estéticas como movimento artístico do século passado. A Poesia Concreta, parte desse movimento, de forma singular promoveu a ruptura da tradição artística pelas inovações estéticas com uma linguagem poética inaugural de sólida base teórica e de procedimentos planificados, visuais e sintéticos. Apropriou-se de princípios estéticos de diversas tendências artísticas, teorias, autores e obras e desdobrado em poema-processo e a videopoesia, definindo a poesia visual contemporânea. Por exemplo: a obra de Regina Pochain está pautada pela visualidade e tecnologia, a fim de suscitar questões referentes à metalinguagem, intertextualidade e intersemioticidade, compondo uma multiplicidade de relações, de uma polissemia poética vetorizada a uma abstração plástica da palavra, numa relação de procedimentos contemporâneos Pós-Modernos.  

  Assim, a partir do uso d as linguagens: verbal (escrita) e não verbal (imagens) e sua fusão semissimbólica, forma-se um novo código: a Poesia Visual. A poesia vinculada a elementos imagéticos compõe uma estética híbrida própria de uma parte da produção literária contemporânea. A visualidade, como elemento semiótico constitutivo do poema, suscita aos leitores novos caminhos interpretativos.          Quanto a uma das escritoras do projeto Com a palavra o autor, REGINA POUCHAIN, realizado por: Camila Oliveira e Iasmim Loranny, da turma: 3001.

MINIBIOGRAFIA: carioca, poeta, designer gráfica, artista intermídia, programadora e diagramadora visual, engajada no poema contemporâneo experimental e na poesia discursiva; produzindo em artes visuais e outros meios; pós-graduada em Artes e Filosofia pela PUC; vem realizando projetos diversificados próprios de criação; curadoria e exposições, publicações de livros e obras tais como, fotopoemas, poema visual gráfico, poemas matemáticos – eletrônicos, poemasobjetos, desenvolvendo trabalhos com mídia mista, colagens, desenhos e pintura, livros-de-artista, participando em diversas revistas eletrônicas e projetos em co-autoria com o poeta gráfico Wlademir Dias-Pino.

REDES SOCIAIS:

Facebook: https://www.facebook.com/rpouchain

 Instagram: @reginapouchainhttps

 Blog: wwwlambuja.blogspot.com/?view=flipcard

Entrevista

1.Qual foi a sua primeira obra?

R. Minha primeira obra escrita e publicada chama-se Partitura Maghinética. Trata-se de um romance na linha tradicional.

2. Qual a obra que você já fez e foi a mais “difícil”?

R. Minha obra mais “difícil” de ser trabalhada foi Partitura Maghinética, por ter sido a primeira.

3. Qual a sua motivação?

R. Minha motivação em escrevê-la, está relacionada ao meu projeto de vida, que seria o de me tornar uma escritora e na medida do possível uma poeta de importância para a literatura brasileira. 

4. LIVROS RECOMENDADOS: LITERATURA TRADICIONAL

R. Invenção de Orfeu, de Jorge de Lima (que considero a obra de poesia mais importante escrita no Brasil) 

Grande Sertão Veredas, de João Guimarães 

Rosa Qualquer, de Clarice Lispector 

A Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar 

NO POEMA VISUAL 

Conhecer a obra do poeta e artista gráfico carioca Wlademir DiasPino, especialmente o poema A AVE. Conhecer Hana Hatherly, poeta e artista plástica portuguesa nascida em Lisboa. Conhecer os trabalhos da poeta Regina Pouchain 

5. MENSAGEM AOS ALUNOS:

R. Para quem pretende tornar-se poeta ou escritor, assim como professor de literatura brasileira, é imprescindível ler/conhecer, tanto o tradicional quanto a vanguarda brasileira. E para quem não pretende nem uma coisa nem outra, a leitura/ cultura é indispensável para qualquer tipo de formação.

Análise de Poema Visual: Poesia

Por: Renata Barcellos

Ebook Poesia Visual: https://bit.ly/4dYXPHt

Poesia virtual

Neste poema, Regina brinca com a palavra “poesia”. Trata-se da figura de linguagem metalinguagem a forma textual poesia com o mesmo conteúdo no qual as letras são desordenadas como se estivessem no ar.  Há também o verbal “ver” no infinitivo e o pretérito “vi” que, juntamente, com o icônico a imagem do cadeado remete a algo oculto. O leitor pode estar diante de alguma imagem e remeter a outro sentido. Afinal, como disse Humberto Eco, a “obra é aberta”. Cada leitor imprime um sentido de acordo com sua vivência.

Renata Barcellos

Voltar

Facebook




Influência maçônica nas Literaturas Brasileiras

Renata Barcellos e Raimundo Campos Filho

‘Influência maçônica nas Literaturas Brasileiras’

Raimundo Campos Filho, Renata Barcellos e Jorge Eduardo Magalhães
Raimundo Campos Filho, Renata Barcellos e Jorge Eduardo Magalhães

A maçonaria nasceu como organização de ajuda mútua e, ao longo do tempo, constituiu-se também como espaço de sociabilidade, oferecendo rede de apoio político, social e simbólico a seus membros e à sociedade. A maçonaria moderna surgiu em 1717, na Inglaterra, com a fundação da Grande Loja de Londres, marcando a transição das guildas de pedreiros medievais (maçonaria “operativa”) para uma sociedade filosófica e filantrópica.

    Por convenção, muitos pesquisadores do tema adotaram como marcador histórico maçônico a Constituição de Anderson (elaborada na segunda metade do século XVIII). O documento é um compilado de registros maçônicos que reúne informações relativas aos direitos e deveres dos iniciados. A Constituição de Anderson regula os Franco-Maçons desde 1723 e é considerado o principal documento e a base legal da Maçonaria Especulativa que, aos poucos, foi substituindo os preceitos tradicionais que até aquele momento regulavam as atividades da Maçonaria Operativa.

    Embora os autores brasileiros não tenham criado personagens abertamente maçons com frequência, a temática e os ideais da maçonaria influenciaram o contexto histórico no qual as Literaturas Brasileiras foram produzidas, principalmente no período do Império. Escritores como Machado de Assis e Jorge Amado mesmo não sendo comprovado o vínculo como maçons, suas obras e contextos estão relacionados ao ambiente cultural no qual a maçonaria se desenvolveu no Brasil. Sendo assim, no que se refereao Machado de Assis: trata-se de um dos maiores mistérios das Literaturas Brasileiras. Não há um documento que comprove a iniciação do escritor. Entretanto, há evidências de que Machado era um profundo conhecedor ou um ‘maçom sem avental’. Obras como Esaú e Jacó, com seus personagens e a tábua de logosofia, são repletos de simbolismo maçônico. Além disso, ele era amigo íntimo de maçons notórios, como o Visconde do Rio Branco.                                                                                                                

    O bruxo do Cosme Velho, escritor brasileiro, considerado por muitos, o maior nome das Literatura Brasileiras. Ele escreveu romances, contos e crônicas. Em uma série denominadas “Balas de Estalo” (1883), escritas sob o pseudônimo de “Lélio”, ele conta que recebeu uma correspondência remetida pela Maçonaria (correspondència do Grande Oriente do Brasil). Como considerou “muito estranho” a forma da escrita em abreviaturas, este escreve:

“Como por uma grat∴ sup∴ Suponho que o leit∴ não é maç∴ Não me dig∴ que é, porque não prec∴ que não seja, para saber se, não sendo, recebeu também uma folh∴ cor de tijolo, contendo os estat∴ de uma Assoc∴ de Benf∴ e Previsão do Gr∴ Or∴ do Br∴ … – [… ] Assim, por exempl∴ o § 8 do art. III diz que farão parte dos fundos da assoc∴ “todos os metais e mais valores existentes nas oficinas que, por qualquer motivo, abaterem colunas”. Eu suponho que todos os maç∴ sabem o que isto quer dizer; mas, em suma, eu não sou maç∴ e, se me mandaram…”.                                                                                           

     Já o poeta dos escravos, Castro Alves, emprestou sua genialidade à causa da abolição, um ideal fortemente defendido pela Maçonaria no Brasil. Sua participação na irmandade reforçou seu compromisso com a liberdade e a igualdade. Registros históricos apontam sua iniciação na “Loja Amizade e Segredo” em São Paulo.

Autores maçons:

    Além da representação em obras de ficção, a própria biografia de escritores brasileiros pode ter conexões com a maçonaria, mesmo que a afiliação não se reflita diretamente em seus personagens.

Da Camino: maior escritor Maçônico Brasileiro – Eterno Mestre Maçom Gaúcho. De juiz a escritor, Da Camino é reconhecido como uma das maiores figuras da Maçonaria brasileira, deixando um vasto legado literário e uma carreira que inspirou gerações. Com mais de 60 obras publicadas, muitas delas essenciais para o estudo da Maçonaria. Entre suas mais renomadas publicações, destacam-se títulos como “A Maçonaria”, “O Maçom e a Intuição”, “Dicionário Filosófico de Maçonaria” e “Simbolismo do 1º Grau – Aprendiz”. Seu trabalho refletia sua profunda compreensão dos mistérios maçônicos, da ritualística e da filosofia que permeia a prática maçônica. Sua produção literária continua a ser um importante referencial para estudiosos e praticantes da Maçonaria no Brasil e no mundo.

Joaquim Nabuco: o escritor abolicionista e diplomata foi maçom. Apesar disso, o foco de sua obra literária e política era o abolicionismo, não a maçonaria.

José do Patrocínio: jornalista e escritor, foi uma figura importante do movimento abolicionista no Brasil. 

Luiz Gama: o poeta e advogado abolicionista também era maçom. Seus textos e poemas defendiam a causa abolicionista e os direitos civis, ideais que eram compatíveis com a atuação de alguns setores da maçonaria. 

Rui Barbosa: advogado, jornalista e escritor, é uma figura central na história do Brasil e membro da maçonaria. 

Tomás Antonio Gonzaga: poeta e jurista, autor de “Marília de Dirceu”, é considerado um dos grandes nomes do Arcadismo brasileiro e, como muitos de sua época, era maçom. 

Zildo Pacheco: um dos grandes nomes da literatura maçônica no Brasil. O escritor ocupa a cadeira nº 7 da Academia Maçônica Brasileira. Autor de diversas obras que abordam a filosofia, a história e os ritos da Maçonaria. Seus trabalhos, como o Volume XXVI “Explorando a Filosofia da Ordem”, são considerados importantes para o estudo e aprofundamento dos irmãos maçons. 

Comparação com a literatura estrangeira

A ausência de personagens maçons explícitos nas Literaturas Brasileiras contrasta com a abordagem de autores estrangeiros, que, frequentemente, incorporavam o tema em suas obras.

Alexander Pushkin: maior poeta da Rússia, considerado o fundador da literatura russa moderna, foi iniciado na Maçonaria durante seu exílio em Quichinev. Seus ideais de liberdade e seu espírito rebelde encontraram eco nos círculos maçônicos, que na época eram vistos com suspeita pelo regime czarista. Há registros de sua filiação à Loja “Ovídio nº 25”, em Quichinev (hoje na Moldávia).

Arthur Conan Doyle: criador do detetive mais lógico da literatura, Sherlock Holmes, era um homem fascinado pelo misticismo e pela espiritualidade. Conan Doyle foi um maçom ativo e via na ordem uma irmandade que promovia a moralidade e a caridade. Embora Holmes seja um personagem puramente racional, a vida de seu criador era rica em interesses esotéricos. Registros da “Phoenix Lodge No. 257” em Southsea, Inglaterra e diferentes biografias sobre o autor sustentam sua participação na maçonaria.

Johann Wolfgang von Goethe: gênio alemão, autor de Fausto, foi um maçom ativo e dedicado. Ele via na ordem uma via para o aperfeiçoamento moral e espiritual do ser humano. Muitos analistas veem um profundo simbolismo maçônico em suas obras, especialmente em Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister, que descreve a jornada de um jovem em busca de conhecimento e autodesenvolvimento. Registros da Loja “Amalia” em Weimar, Alemanha, indicam que Goethe foi membro a partir de 1780.

Mark Twain: O icônico escritor americano, autor de As Aventuras de Huckleberry Finn, foi um maçom durante boa parte de sua vida. Embora tenha se afastado em seus últimos anos, suas cartas e discursos mostram familiaridade com os ritos e ideais da ordem. Ele foi membro da Loja “Polar Star Lodge No. 79” no Missouri.

Oscar Wilde: O brilhante e controverso autor de O Retrato de Dorian Gray teve uma passagem pela Maçonaria durante seus anos de estudo. Ele foi iniciado em Oxford e parece ter se interessado pelos aspectos ritualísticos e estéticos da ordem, embora sua participação não tenha sido duradoura. Registros da “Apollo University Lodge No. 357” da Universidade de Oxford tratam de sua participação na Ordem.

Rudyard Kipling e Leo Tolstoy: escritores estrangeiros são conhecidos por explorar o ritual e o simbolismo maçônico em obras como O Homem Que Queria Ser Rei e Guerra e Paz

Voltaire: filósofo e escritor francês, um dos maiores nomes do Iluminismo, foi iniciado na Maçonaria em seus últimos dias. Sua iniciação foi um evento lendário, com a presença de figuras como Benjamin Franklin. Para Voltaire, a Maçonaria representava a materialização dos ideais de liberdade, tolerância e combate ao fanatismo que ele defendeu por toda a vida. Registros históricos da Loja “Les Neuf Sœurs” (As Nove Irmãs) em Paris, confirmam sua iniciação em 7 de abril de 1778.                                                    

Essa distinção reflete a particularidade da maçonaria no Brasil, que teve um papel mais discreto na cultura popular. Mas influente na política e na história, em contraste com a maneira como a irmandade foi retratada em outros países. Existem pesquisadoras e autoras que escrevem sobre a Maçonaria, como Eliane Lucia Colussi, autora do livro A maçonaria brasileira no século XIX. Na atualidade, há escritores maçom como:

   Zara Paim de Assis (membro da Ordem dos Capelões, presidente da Academia Mundial pela Paz, Letras e Artes, do Instituto Brasileiro de Culturas internacionais. Membro de diversas Academias de Letras, já obteve prêmios literários. Publicou poemas, crônicas, ensaios, artigos de opinião em antologias e periódicos. Ensaios em Coletâneas brasileiras, portuguesas, francesas e italianas) que não aborda questões referentes à maçonaria. Em 2013, escreveu o ensaio “Gonçalves Dias”, o Romantismo e seus poemas amorosos”. Em 2016, o ensaio “José Bonifácio de Andrada e Silva” com o título: “Sesquicentário de Euclides da Cunha – Esboço de sua trajetória”…  

    E Jorge Eduardo Magalhães (membro da Grande Loja: Baden Powell VII 35, professor, ensaísta, romancista, contista, cronista e autor teatral, colunista do Portal Polo de Notícias e apresentador do quadro Baú do Samba, programa SAMBA À VERA. Fomentador da Cultura Carioca, é diretor da harmonia da Sociedade Recreativa Escola de Samba Lins Imperial membro de diversas Academias de Letras…) escreve artigos e já ganhou concursos Literários, por exemplo, com o artigo Graciliano Ramos e José Lins do Rego: adaptações para o cinema e a televisão, texto teatral Uma janela para Euclides…

Renata Barcellos e Raimundo Campos Filho

Voltar

Facebook




Desafios de um professor de Língua Portuguesa

Desafios de um professor de Língua Portuguesa: perspectivas globais e o contexto angolano e o ‘impossível duplo acento’ nas palavras da Língua Portuguesa

Renata Barcellos
Renata Barcellos

De acordo com Fernando Chilumbo, a docência de Língua Portuguesa traduz “desafios complexos no mundo de hoje, que vão além da mera gramática ou literatura. Estes envolvem aspectos pedagógicos, tecnológicos e, essencialmente, socioculturais. Em Angola, país plurilíngue com o Português como língua oficial, o ensino desta língua assume um papel central não só como meio de comunicação, mas como instrumento de inclusão social, preservação cultural e mobilidade educativa.

Em escala global, professores de Português enfrentam transformações educacionais aceleradas. A digitalização, a literacia multimodal, as exigências de competências comunicativas, e os sistemas educativos que procuram conciliar tradição e inovação pedagógica são realidades comuns. Há também uma preocupação crescente com o crescimento demográfico nos países lusófonos, o que colocará pressão adicional sobre os sistemas de educação nas próximas décadas. Por exemplo, o Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP) reporta que, segundo projecções da ONU, o português poderá vir a ser língua materna de cerca de 400 milhões de pessoas em 2050, especialmente pelo crescimento populacional em Angola e Moçambique.

Angola possui várias línguas nacionais que coexistem com o Português. As línguas mais faladas além do português incluem o kikongo, kimbundu, cokwe, ngangela, oshikwanyama, entre outras.

Em 2025, há um projecto experimental para introduzir o ensino formal de seis línguas nacionais (umbundu, kimbundu, cokwe, kikongo, nganguela, ocikwahama) na primeira classe, com professores, coordenadores e material pedagógico dedicado.

O Instituto de Línguas Nacionais (ILN) tem como missão institucional estudar línguas nacionais, suas variantes, promover sua preservação e valorização, conforme Decreto Presidencial n.º 159/21.

O governo angolano implementa iniciativas como o Plano Nacional de Formação de Quadros’, que inclui formação de professores em metodologias de ensino de línguas, educação infantil, etc. Por exemplo, uma edição do plano resultou na formação de mestres em educação infantil e ensino primário, com especialidades em Metodologia de Ensino de Línguas.

Um estudo recente (‘Análise dos conteúdos de Língua (Gramática) nos programas e manuais de Língua Portuguesa do Ensino Primário angolano’) mostra que os programas e manuais de Língua Portuguesa nem sempre reflectem as necessidades reais sociolinguísticas dos alunos, pois há grandes interferências das línguas nacionais (L1) e uma discrepância entre os conteúdos gramaticais previstos e a actual prática de comunicação linguística dos estudantes.

Falta de professores qualificados para ensinar algumas das línguas nacionais e para aplicar metodologias que reconheçam variações linguísticas locais é um problema real.     

    O projecto para ensino de línguas nacionais prevê a formação de docentes para essas línguas, o que indica actualmente a escassez de pessoal treinado.

Há necessidade de revisão dos manuais e programas de Português para que estes considerem as variedades linguísticas angolanas e as práticas comunicativas reais dos alunos (oralidade, fala, influência de línguas maternas).

A valorização das línguas nacionais (na prática, no estatuto escolar, nos currículos, no material pedagógico) é um tema presente nas discussões públicas em Angola.

Iniciativas recentes procuram formar professores para melhorar a qualidade do ensino primário, mas os desafios institucionais (infraestrutura, acesso ao material pedagógico, coerência curricular) persistem. A notícia “Angola ganha mestres de educação de infância e ensino primário” indica que, embora haja progresso, ainda há muito caminho a percorrer.

    Com base nos dados verificados, podemos afirmar que os professores de Língua Portuguesa em Angola enfrentam desafios concretos e múltiplos:

1. Diversidade linguística: trabalhar num país plurilíngue exige reconhecimento das línguas nacionais, adaptação metodológica e materiais adequados.

2. Formação docente: há progresso, mas ainda há lacunas — necessidade de formação em metodologias específicas, adaptadas ao contexto lingüístico real dos alunos.

3. Recursos didácticos e curriculares: muitos manuais e programas estão desfasados da realidade sociolinguística; é necessário reconhecimento das variedades do português angolano nos materiais didáticos.

4. Políticas de valorização: para que as línguas nacionais sejam efectivamente integradas, o estatuto legal, financiamento, políticas curriculares, material didáctico e formação docente precisam estar alinhados.

5. Motivação dos professores e alunos: identidade linguística, reconhecimento, pertinência cultural do ensino, tudo isso contribui para melhorar a motivação, tanto do docente como do aluno”.

Quanto ao Impossível Duplo Acento nas Palavras da Língua Portuguesa: uma análise fonológica e ortográfica, conforme Fernando, o presente texto tem “como objectivo esclarecer um equívoco recorrente relativo à acentuação gráfica em português, nomeadamente a ideia de que determinadas palavras, como bênção, Estêvão, acórdão, órfão e órgão, conteriam dois acentos. Demonstra-se, com base na fonologia e na ortografia normativa, que cada palavra da língua portuguesa pode possuir apenas um acento gráfico e, consequentemente, uma única sílaba tónica.

A acentuação gráfica em português constitui um dos aspectos mais sensíveis da ortografia, uma vez que reflecte directamente a tonicidade e o timbre das vogais. A confusão frequente entre acento gráfico e nasalização, bem como entre acento e til, leva alguns falantes a supor que certas palavras apresentam ‘dois acentos’.

O presente estudo procura esclarecer, à luz da gramática normativa e da linguística fonológica, que tal fenómeno não ocorre em língua portuguesa. Para tal, são analisadas as palavras bênção, Estêvão, acórdão, órfão e órgão, demonstrando-se que cada uma contém apenas um acento gráfico, o qual indica a sílaba tónica.

Acento gráfico e acento tónico: distinção fundamental

Na língua portuguesa, o acento tónico é a força prosódica que incide sobre uma sílaba, tornando-a mais saliente do que as restantes. Já o acento gráfico é o sinal escrito (´, `, ^) que representa, quando necessário, essa tonicidade, segundo regras ortográficas específicas. O til (~), embora frequentemente confundido com acento, não é um acento gráfico. Trata-se de um sinal diacrítico de nasalização que altera o som da vogal, mas não indica tonicidade. Assim, em palavras como órgão ou bênção, há apenas um acento gráfico (agudo ou circunflexo) e um til, que não deve ser considerado como segundo acento.

Análise das palavras mencionadas:

a) Bênção:  palavra bênção apresenta o acento circunflexo na sílaba bên, indicando que a vogal é fechada e tónica. O ão final contém apenas o til, que assinala nasalização. Portanto, existe um único acento gráfico.

b) Estêvão, o acento circunflexo recai sobre a sílaba tê, marcando-a como tónica. O ão final apenas indica nasalização. Logo, há um só acento gráfico.

c) Acórdão, o acento agudo incide sobre a sílaba cór, assinalando a tonicidade. O ão é nasal, mas átono. Assim, ocorre apenas um acento gráfico, coincidente com a sílaba tónica.

d) Órfão contém acento agudo na sílaba ór, indicando a sua tonicidade. O ão é nasalizado e final, não possuindo acento gráfico. Portanto, há um único acento gráfico.

e) Órgão, o acento agudo incide sobre ór, identificando a sílaba tónica. O ão apenas expressa nasalização. Assim, verifica-se um só acento gráfico.

A estrutura prosódica da língua portuguesa estabelece que cada palavra apresenta apenas uma sílaba tónica. A existência de mais de um acento gráfico seria, portanto, incompatível com a natureza da acentuação do português.

Conclui-se, assim, que é incorrecta a ideia de que palavras como bênção, Estêvão, acórdão, órfão e órgão apresentam dois acentos. Em todas elas, observa-se apenas um acento gráfico, correspondente à única sílaba tónica. O til que nelas aparece serve unicamente para indicar nasalização e não constitui um segundo acento. O rigor ortográfico e fonológico da língua portuguesa impede a duplicação de acentos gráficos ou de sílabas tónicas numa mesma palavra. A distinção entre acento gráfico e sinal de nasalização é essencial para a correcta escrita e pronúncia das palavras, assegurando a clareza e a coerência do sistema ortográfico português”.

Minibiografia de Fernando Chilumbo: estudante dedicado e multifacetado, com formação em andamento em Língua e Literaturas em Língua Portuguesa na Faculdade de Humanidades da Universidade Agostinho Neto. Sua jornada académica inclui o curso de Jornalismo Profissional no Cefojor (Centro de Formação de Jornalistas), onde aprimora habilidades práticas essenciais para a comunicação. Paralelamente, actua como professor do Ensino Primário, demonstrando compromisso com a educação e a transmissão de conhecimento desde cedo.                                                                                                                    

Participou de cursos complementares que enriqueceram sua formação: Língua Russa, cursada no ISCED-Luanda, promovida pelos russos, o que ampliou sua perspectiva linguística e cultural; Teoria e Prática do Comentário Literário, realizado na União dos Escritores Angolanos, sob a promoção do Círculo de Estudos Linguísticos Literários e Litteragris, aprofundando seu conhecimento em crítica literária e Editores, Diagramadores e Capistas, promovido pelo Jornal O Estandarte e o curso de Língua Portuguesa e Comunicação da Universidade Metodista de Angola.

Rede social: Facebook: https://www.facebook.com/o.nin.guem.2025

Renata Barcellos

Voltar

Facebook




Professor, quais são seus maiores desafios?

Renata Barcellos

‘Professor, quais são seus maiores desafios?’

Renata Barcellos
Renata Barcellos
Imagem criada por IA do Grok
Imagem criada por IA do Grok

Mês de outubro é de comemoração do professor. Antes de ser instituída a data foi criada a lei educacional do Brasil sancionada por Dom Pedro I em 15 de outubro de 1827. Entretanto, você sabia que foi uma mulher a criar a data em Santa Catarina, em 1948? Antonieta de Barros, uma das três primeiras mulheres eleitas no Brasil e a primeira parlamentar negra (apresentou na Assembleia Legislativa de Santa Catarina o projeto de lei nº 145, de 12 de outubro de 1948), autora da lei que instituiu o dia do professor e o feriado escolar no estado.

Na época, Antonieta justificou a importância da criação da data, argumentando que “Não há quem não reconheça, à luz da civilização, o inestimável serviço do professor”. Em 1963, o presidente João Goulart assinou o decreto nº 52.682, de 14 de outubro de 1963, ratificando a criação do Dia do Professor e determinando-o como feriado escolar.    

Dos anos 60 até a contemporaneidade, quem está em sala de aula percebe a drástica mudança da figura do professor. De admirado a respeitado, considerado o “detentor do conhecimento”; hoje, ser desprezado, violentado. Na maioria das vezes, a sociedade e a família não reconhecem mais a função social do professor. Não o valoriza em termos financeiros e nem acadêmico. O cursinho presencial ou online é melhor do que a escola oferece.

Constantemente, ouve do aluno: “depois eu assisto ou eu assisti ao vídeo do professor X”. Na atualidade, a questão é: qual o papel do professor à frente de uma turma? Estamos falando com as paredes? De acordo com pesquisa realizada durante a Semana da Escuta das Adolescências nas Escolas, menos de 40% dos estudantes nos anos finais do Fundamental (6º, 7°, 8º e 9 º anos) respeitam e valorizam seus professores. Por este índice, podemos imaginar a realidade do Ensino Médio.

O desafio inicial é quando se opta pela licenciatura. O que mais se ouve é: “você tem certeza?”, “vai passar fome”, “isso não é futuro para ninguém”… Quando se ingressa na graduação, eis um problema real: a inadequação das grades curriculares. No caso de Letras, quanto à oferta de Latim e das disciplinas de Literaturas africanas e indígenas,  a lei ainda não é uma realidade em muitas universidades públicas e privadas.                          

A “lei de ensino das literaturas africanas e indígenas” se refere à Lei nº 11.645/2008, que tornou obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena em todas as escolas do Ensino Fundamental e Médio. A lei ampliou a obrigatoriedade original da Lei nº 10.639/2003, que tratava apenas do tema afro-brasileiro. Essa legislação exige que os conteúdos sejam integrados ao currículo, com atenção especial a áreas como literatura, história e educação artística, para promover uma educação antirracista e multicultural.

Outro desafio inerente à formação é a questão de como lidar com alunos com necessidades educacionais especiais. Lidar com salas lotadas e com diferentes especificidades é missão impossível! Preparar atividades diversas e, no quotidiano, muitas vezes, administrar bullying com esses alunos e, pior, dos alunos com o professor… Sabemos que as consequências podem ser graves, incluindo problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão, baixa autoestima e, em casos extremos, violência física grave ou suicídio. Com a Lei 14.811/2024, foi criminalizado no Brasil, podendo resultar em multas ou prisão.

Outra conscientização é quanto ao entendimento de como o conhecimento é construído. Definitivamente, a aula não é um espetáculo. E o espaço físico não é um teatro onde ao adentrar o professor encena um “personagem divertido”. Aprendizagem exige um ambiente acolhedor. É um processo solitário. Demanda foco. Atenção no conteúdo a ser estudado. Travar conexões…

Vamos pensar nossa rotina: muitos de nós saímos horas antes para estarmos no horário da aula. É um enorme desgaste físico e psicológico: congestionamentos, expostos à falta de segurança… E, quando se chega à instituição de ensino, muitas vezes, já se ouve de longe: “a senhora veio?” Se estamos passando mal, ouvimos: “Por que veio?”, “Por que não ficou em casa se estava passando mal?”. Ninguém merece ouvir isso! 

Nós, professores, precisamos conviver em harmonia. A sala de aula não deve ser um campo de batalha. Urge um ambiente harmonioso! As relações necessitam ser saudáveis! Jamais hostis – de constantes embates. Não estamos em um ringe! Alunos e responsáveis precisam se conscientizar de que o professor está ali para o desenvolvimento intelectual de cada aluno. No meu caso, das competências leitora e de escrita.                                                                                             

Outro desafio é a escolha (quando no setor público) do material didático. E, na rede privada, a IMPOSIÇÃO de material pronto para a rede. Pior ainda de avaliações já prontas. Fico me perguntando: neste caso, qual o papel do professor? Não tem liberdade para escolher seu material e elaborar suas avaliações? O profissional é monitorado o tempo todo: da câmera em sala de aula, supervisões para assistir às aulas, abordagem de conteúdos e utilização de material didático adotado pelas instituições. Ser professor está se tornando um reality show?

Na atualidade, um dos centros das atenções mundial é o uso do celular. A Lei nº 15.100/2025 restringe o uso de celulares por alunos em escolas públicas e privadas de educação básica, não sendo uma proibição total, pois permite a utilização para fins pedagógicos, em situações de segurança, para garantir acessibilidade, inclusão e para atender condições de saúde.

Sancionada em janeiro de 2025, visa melhorar a concentração, o aprendizado e a saúde mental dos estudantes, cabendo às escolas definir as estratégias de implementação. Hoje, uma das frases mais proferidas por nós é: “desliga ou guarda o celular”.

Nós, professores, estamos EXAUSTOS. Além desses desafios e de outros aqui não mencionados, há as constantes cobranças. Ainda mais neste período do ano: aprovação, índices de reprovados, metas…

Não poderia de deixar de abordar a violência física e ou psicológica e o assédio moral. Os índices só aumentam.  De acordo com uma pesquisa da Nova Escola e Instituto Ame Sua Mente, 8 em cada 10 educadores sofreram agressão em 2023, um aumento de 20% em relação a 2022. A maioria é verbal, mas outros tipos incluem assédio moral, bullying e agressões físicas. Em um estudo comparativo da OCDE, o Brasil apresentou o maior índice de agressões verbais ou intimidação de alunos por semana entre os países pesquisados. Lamentável!!!

E o reconhecimento daqueles que, apesar desses e de outros desafios, ainda fazem a diferença? É preciso valorizar os resilientes, os que vestem a camisa da EDUCAÇÃO, os que burlam o sistema e fazem a diferença na vida de cada um de seus alunos, os que consideram-nos protagonistas e não meros coadjuvantes da construção de seu conhecimento.

No que se refere à realidade da África, de países de Língua Portuguesa, de acordo com o angolano Celso Mariano Kahenda Praia (consultor linguístico e literário), um dos grandes desafios do professor hoje é “ter que ensinar um aluno que vai à escola apenas para cumprir formalidades familiar e social. O aluno vai à escola, mas não sabe o fundo da sua presença na escola, nem o para quê da sua formação.

A partir dali, percebemos o grandioso desinteresse na participação da construção de novos conhecimentos para si. Há alunos que nem sabem que disciplina terão num determinado dia, e ficam surpresos com a entrada do Professor. Portanto, não saber o porquê e o para quê ir e estar na escola é o motivo do insucesso de muitos alunos, e deve ser um dado fulcral na atenção não só dos Professores, mas também dos Pais e Encarregados de Educação”.

Já para Joaquim Einstein (professor de Matemática, Física e Química e escritor), os maiores desafios hoje para os professores estão “ligados a muitos aspectos como: falta de interesse nos estudos por parte dos estudantes, carência de materiais nas escolas, e rendimento débil dos estudantes. Como professores procuramos todos os dias mitigar estes problemas”. Podemos verificar que, apesar de continentes diferentes, os desafios são similares.

Nas literaturas brasileiras, há personagens que representam a figura do professor como:

-Antônio Conselheiro: Embora não seja um professor formal, ele é uma figura que transmite conhecimentos e tem um papel formador para a população do sertão, como aparece em obras de Euclides da Cunha e outros autores.

– Professora Maluquinha , criada por Ziraldo, é a protagonista de Uma Professora Muito Maluquinha. Ela se destaca por sua didática criativa e por ensinar com alegria e amor pela leitura.   

– Professor Heliseu do livro O Professor de Cristovão Tezza. É um professor aposentado que relembra sua carreira e os eventos políticos do Brasil enquanto prepara um discurso de homenagem. Além disso, muitos escritores brasileiros também foram professores.

Eis alguns exemplos: como   

– Ariano Suassuna: O autor de O Auto da Compadecida lecionou por mais de três décadas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde suas aulas de Estética eram consideradas espetaculares.   

– Cecília Meireles: além de ser uma das mais importantes poetisas modernistas, ela foi educadora da primeira infância. Fundou, em 1934, a primeira Biblioteca Infantil do Brasil, no Rio de Janeiro. Em 1953, recebeu o título de Doutora Honoris Causa (entregue a personalidades que se destacaram por sua contribuição à cultura, à educação ou à Humanidade).

– Conceição Evaristo: a professora Evaristo se tornou uma das mais importantes escritoras brasileiras contemporâneas. Sua obra é marcada por temas relacionados à identidade, discriminação racial e o papel da mulher negra na sociedade. Um de seus trabalhos mais significativos é o romance “Ponciá Vicêncio”, onde narra a trajetória de uma mulher negra em busca de sua ancestralidade e liberdade.

-Consuelo Travassos: professora e escritora.

– Jorge Eduardo Magalhães: professor, escritor e diretor da harmonia da Sociedade Recreativa Escola de Samba Lins Imperial.   

– Maria Firmina dos Reis: considerada a primeira mulher romancista brasileira, escreveu também o primeiro livro do Brasil que abordava a questão abolicionista na obra Úrsula.  

– Otto Lara Resende: jornalista e escritor, também atuou como professor universitário.                                                                                                                                      

– Ray Brandão: professora, escritora e idealizadora do Coletivo de Escritores Maranhenses.                                                                                                                              

– Wanda Cunha: professora aposentada, trovadora, presidente da Academia Maranhense de Trovas.  

Urge sermos mais humanos, solidários… Amo minha profissão, sempre estou implementando algo novo, mas a falta de tudo é desolador. Por uma EDUCAÇÃO SEM OPRESSÃO. ABAIXO À VIOLÊNCIA! EDUCAR, para liberdade conquistar. E parabéns ao Sinpro-Rio pela a campanha “Educação Tem Nome, CPF e Impressão Digital”, #EducaçãoTemNome.

Renata Barcellos

Voltar

Facebook




A poesia visual de Clemente Padín

Renata Barcellos: ‘A poesia visual de Clemente Padín’

Renata Barcellos
Renata Barcellos
Clemente Padín
Clemente Padín – https://www.instagram.com/p/DPY_kJYjEpW/

“É poesia tudo aquilo que o poeta quer que o seja; pelo simples fato de ele ser poeta, suas faturas serão poemas” – paráfrase elaborada por Padín da declaração do poeta norte-americano Emmett Williams.

Minibiografia: poeta, artista, designer gráfico, performance, videoartista multimídia. Licenciado em Letras Hispânicas – Hispánicas en la Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación de la Universidad de la República (Uruguay). Nasceu no Uruguai em 1939 e faleceu 3/10/2025.

Primeiro, vale destacar um breve percurso da Poesia Visual desde seu surgimento, datada da antiguidade greco-latina, na qual se situam os poetas considerados precursores – Simias, Vestinus, Dosíadas e Teócrito. Em seguida, passaremos pelas carmina figurata medievais e pelos labirintos barrocos, mas será com o Simbolismo e sobretudo com Stéphane Mallarmé que se inicia a revolução poética do século XX. É a sua obra Un coup de dés jamais n’abolira le hasard a responsável por abrir caminho para as experiências modernistas do Futurismo, Dadaísmo, passando pelo Surrealismo até a contemporaneidade, com AC Khamba, Ana Caetano, Emilia Mendes, Fábio Bahia, Glória Campos, Helder D’Araújo, Heduardo Kiesse, Jairo Fará, Joaquim Branco, Regina Pochain, Suely Farhi…

 Segundo o crítico literário Cláudio Daniel, “partiu Clemente Padín, um dos grandes nomes da experimentação poética na América Latina”. De fato, grande perda. Em entrevista concedida a https://asuntoimpresoediciones.com/noticias/entrevista-a-clemente-padin-164 (tradução nossa), Padín responde ao seguinte questionamento:

A partir da Semiótica e da Semântica, como podemos definir a Poesia Visual?

Clemente Padín:  “a poesia visual se produz com as formas expressivas próprias da dimensão visual da linguagem verbal. E a linguagem, não somente serve para comunicarmos, também tem propriedades físicas: signos, letras, palavras. E também tem una formulação sonora. Essas são formas expressivas adjacentes, digamos, a finalidade fundamental é a referência Semântica do verbal. Formas expressivas existem desde sempre: a visualidade e a sonoridade. Existem outras zonas que poderíamos denominar para-linguísticas que podem integrar a experimentação”.  

A partir disso, cabe mencionar a definição de S. J. Schmidt acerca da Poesia Visual, quando diz que é “o espanto do falante perante a própria língua” (2007:5). Isso pelo fato de este “processo estético” apresentar uma “frágil fronteira” entre o visual e o linguístico. Essa vertente literária baseia-se alguns conceitos fundamentais da Linguística com sua utilidade para a Poesia Visual como a dicotomia: significado e significante (como o poema PAZ) e de suas vertentes: Semântica, Semiótica e Análise do Discurso.

Letra A

Como podemos constatar, o poeta decompõe a palavra em significantes (P A Z). Vale ressaltar o destaque para a letra (A). Isso nos remete ao poeta visual catalão Joan Brossa, que tinha a letra “A” (primeira letra de nosso alfabeto) como a porta de entrada no mundo literário. Já outros poetas visuais assim como Brossa  é capaz  de fazer um poema visual  com apenas uma letra (neste caso, a vogal “A”)  de dar-lhe várias possibilidades expressivas.  

Dentre eles, Fatima Queiros. Conforme ela, “Gosto muito do brossa! Quando conheci o trabalho dele me apaixonei e daí as letras … O ” A ” é o início do alfabeto e foi a que mais brinquei, embora eu tenha brincado com outras letras também”. Fica dica para assistirem ao vídeo dela em homenagem ao Brossa (https://youtube.com/watch?v=1t1SI_u-VQo&feature=shared).       

Cabe ressaltar também a matéria publicada POESIA EXPERIMENTAL por Clemente Padín em https://www.blocosonline.com.br/literatura/poesia/poexpert/2002/poex0202.htm. Nesta, o poeta cita Poema/Processo a cargo de Neide Dias de Sá: “O Poema/Processo foi um movimento fundado em 1967, aconteceu simultaneamente em vários pontos do Brasil: aqui no Rio, em Natal, no Recife, em Minas. Desenvolveu-se de 1967 até 1972 e chegou a ter a participação de cerca de 250 artistas e poetas.

Trata-se de uma exploração planificada das possibilidades encerradas nas cadeias de signos, dando máxima importância à leitura do processo do poema, e não mais à leitura alfabética, verbal e de significantes… O Poema/Processo abriu caminho para a pesquisa semiótica, fazendo do signo matéria-prima transformável pela inauguração e novos processos informacionais, ao operar no nível sobre as estruturas, criando novas linguagens”.    

E, nesta mesma matéria, menciona Wlademir Dias-Pino: “Os poetas do movimento do Poema-Processo (livres do sofisticado do heroísmo) têm a consciência das dificuldades de ser vanguarda e mais do que isso, sabem que ao dissociar a Poesia (estrutura) do Poema (processo), separaram, definitivamente, o que é língua de linguagem dentro da literatura”.

“Diante do uso constante da linguagem todas as línguas passaram a ter um exotismo de dialeto. Poema/processo: a consciência diante de novas linguagens, criando-as, manipulando-as dinamicamente e fundando probabilidades criativas. Dando a máxima importância à leitura do poema (não mais à leitura alfabética), a palavra passa a ser dispensada, atingindo assim uma linguagem universal, embora seja de origem brasileira, desprendida de qualquer regionalismo, pretendendo ser universal não pelo sentido estritamente humanista, mas pelo sentido da funcionalidade”.

“Não se trata, como alguns poderiam pensar, de um combate rígido e gratuito ao signo verbal, mas de uma exploração planificada das possibilidades encerradas em outros signos (não verbais). É bom lembrar que mesmo as estruturas não se traduzem: são codificadas pelos processos que visam a comunicação internacional”. 

Para uma singela homenagem a Padín, depoimento de alguns poetas visuais a seguir:

“O mundo despede-se de Clemente Padín (1939–2025), referência da arte uruguaia e da poesia visual latino-americana. Poeta, performer e pioneiro da arte correio, Padín ampliou fronteiras entre palavra, imagem e ação, deixando marcas profundas na história da arte experimental. Editor de revistas como OVUM e articulador de redes internacionais, conectou gerações e consolidou sua presença como um dos nomes mais ativos da vanguarda.

Sua participação no movimento Poema/Processo, ao lado de artistas brasileiros, reforça sua importância na construção de uma poesia que é gesto, espaço e liberdade. Seu legado resiste como inspiração crítica e estética, vivo em cada obra, performance e correspondência que circulou pelo mundo. Uma despedida que é também celebração da força criadora de um artista essencial da arte uruguaia e da poesia experimental” (texto publicado no Instagram Fernando Assad Abdalla – artista – poeta visual e designer).

“Clemente Padin é um gigante da poesia visual. Não há como sair ileso à sua poesia. É uma poesia que faz pensar e chama a luta. Seus trabalhos têm a beleza do idealismo, a intensidade que só um guerreiro poético pode dar. É um dos últimos remanescentes da guerrilha poética. Sua influência é profunda. Eu carrego em mim seus poemas, como algo vivo que me instiga e me move na busca do poema fundamental” (Jairo Fará – escritor, jornalista e professor da UFSJ. Pós-doutor pela Universidade de Coimbra – Portugal e pela Universidade Estadual de São Paulo – Unesp).

“Quando conheci Clemente Padin, me impressionou seu trabalho e sua pessoa. Me dei conta de que estava conhecendo a história viva do Uruguai, em sua dor e verdade mais profunda. Padin é um guerreiro da utopia” (Jiddu Krishnamurti Saldanha – poeta e artista visual).

Para concluir, escolhemos este poema visual por considerá-lo o mais representativo:

La poesia

Neste poema visual, o poeta reflete sobre a função da poesia. A linguagem não-verbal de um menino com um cesto remete a um pedinte de rua. Como se esta vertente literária não fosse suficiente para a sobrevivência. Infelizmente, retrata a realidade de muitos poetas. Este ofício alimenta a alma mas não o físico, as contas… Podemos supor ser uma crítica social à situação financeira destes profissionais. Não são reconhecidos muitas vezes.

Vale destacar que não é (formalmente) regulamentada no Brasil e no mundo. No caso específico do poeta-repentista, este possui um verbete na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), sendo enquadrado como parte da categoria de Repentista, um profissional que utiliza o improviso rimado como meio de expressão artística.  A atividade foi reconhecida como profissional artística pela Lei nº 12.198/10, que também abrange cantadores, emboladores, cantadores de coco, e escritores de literatura de cordel.

Renata Barcellos

Voltar

Facebook