Serenata do cantador

Paulo Siuves: Poema ‘Serenata do cantador’

Paulo Siuves
Paulo Siuves
Imagem criada por IA ChatGPTDALL-E.
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Em noites de luar, caminho sozinho,
Levando no peito um canto calado.
A Lua ilumina um destino mesquinho,
De quem ama o eco de um tempo passado.

Meu coração pulsa em acordes dispersos,
Um piano trêmulo sem maestro ou partitura.
Cada compasso se perde em tolos versos,
Que escrevo ao vento, sem assinatura.

O vento sussurra seu nome em segredo,
Mas já não sei se ele ainda te alcança.
O amor é um sopro, um breve enredo,
Que um dia me aquece e depois se cansa.

Nos campos da vida, entre lutas e glórias,
Te vejo ao longe, em memórias gastas.
Na melodia que embala histórias,
Seu rastro insiste, mas já não basta.

Ó musa ausente, quem te inspira agora?
Em que braços entregas teu sonho e alegria?
Mesmo distante, seu riso me ancora,
E canto em silêncio… pois é tudo o que eu queria.

Paulo Siuves

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A ruiva da brasília amarela

Marcelo Pires: ‘A ruiva da brasília amarela’

Marcelo Pires
Marcelo Pires
Imagem criada por IA do Bing - 18 de fevereiro de 2025, às 22:11 PM
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às 22:11 PM

Os cabelos vermelhos voando ao vento
Acariciando a porta da brasília amarela
Anjo partindo corações em fragmentos
Fios voam, na cor vermelha da aquarela

Brasília amarela, com cor de margarida
Carregando a beldade no tom das rosas
Anjo cativante, aos corações traz a vida
Cena magnífica com mechas preciosas

Descrevem no ar, partituras com os fios
De melodias de admiração à bela musa
Notas musicais divinas, aguçam anseios
Sutilmente, acordes e escalas majestosas

A cena de quadro pintado em vermelho
Na tela amarela da carruagem real
Acirra paixões pela rosa e o carro velho
Passeio divino em um sonho atemporal

A bela passeia na brasília e no coração
A admiração corre nas veias vermelhas
A Cor dos cabelos exalando inspiração
Belos fios ruivos acariciando as orelhas

O guarda é um homem deveras sortudo
Freia a brasília, perguntando seu nome
Muitos queriam saber dela, quase tudo
Ouvir as doces palavras e seu codinome

Deve chamar vênus, a deusa da beleza
Rodando em sua carruagem das estrelas
Quiz mostrar o dom de sua delicadeza
Passeando com as suas madeixas belas

Sem querer, fere corações apaixonados
Única opção, é anotar a placa da brasília
E tentar achar a ruiva dos aficcionados
Fazendo da vida e do amor uma vigília.

Marcelo Pires

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Minha jornada com a superstição e espiritualidade

“Muitas das nossas superstições têm raízes históricas e culturais profundas. Se pararmos para pesquisar, encontramos explicações fascinantes sobre a origem de cada uma delas.”

Superstição e espiritualidade
Imagem criada por IA do Bing - 18 de fevereiro de 2025, às 09:40 PM
Superstição e espiritualidade
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Desde pequena, sempre fui fascinada por superstição e espiritualidade. Cresci em uma casa onde minha avó falava sobre sinais do universo, energias invisíveis e a influência dos astros sobre nossas vidas. No início, tudo parecia apenas histórias bonitas, mas, com o tempo, percebi como esses pequenos rituais e crenças moldavam o meu dia a dia.

Superstições no Dia a Dia

A superstição está presente em todas as culturas. No Brasil, por exemplo, há quem evite passar debaixo de escadas, quem acredite que quebrar um espelho trará sete anos de azar ou que uma ferradura na porta atrai sorte. Mesmo quem se diz cético, muitas vezes se pega batendo na madeira para afastar algo ruim. É curioso como essas crenças se enraízam em nosso comportamento, muitas vezes sem percebermos.

A Conexão entre Superstição e Espiritualidade

Com o tempo, fui descobrindo que, mais do que um conjunto de crenças aleatórias, a superstição anda de mãos dadas com a espiritualidade. Para mim, a espiritualidade não está necessariamente ligada a uma religião específica, mas sim a um sentimento de conexão com algo maior. Seja através da astrologia, do tarot ou mesmo da intuição, sinto que há uma força sutil guiando meus passos.

Minha Experiência com o Tarot

Foi assim que me aproximei do tarot. No começo, via apenas como um jogo simbólico, mas, com o tempo, percebi que as cartas refletiam muito do meu estado emocional e dos desafios que eu enfrentava. Não vejo o tarot como uma resposta definitiva, mas como uma ferramenta de autoconhecimento. Sempre que estou em dúvida sobre algo, recorro a ele para encontrar clareza. Se você quiser experimentar uma leitura, recomendo este site: https://sunrisereading.com/pt-br/ É uma forma interessante de explorar o significado das cartas e talvez encontrar respostas que você nem sabia que precisava.

Os Sinais do Universo

Além do tarot, também acredito em sinais. Já aconteceu comigo várias vezes: penso em alguém e, de repente, essa pessoa me manda uma mensagem. Ou estou com uma dúvida na cabeça e vejo uma frase em um livro ou em um outdoor que parece responder exatamente ao que eu precisava ouvir. Coincidência? Talvez. Mas prefiro acreditar que o universo tem suas maneiras misteriosas de se comunicar conosco.

A História por Trás das Superstições

Muitas das nossas superstições têm raízes históricas e culturais profundas. Se pararmos para pesquisar, encontramos explicações fascinantes sobre a origem de cada uma delas. Por exemplo, o medo do número 13 vem de antigas tradições nórdicas, e jogar sal sobre o ombro esquerdo para afastar o azar tem relação com antigas crenças europeias. Se quiser saber mais sobre a origem de algumas superstições, recomendo este artigo da Wikipedia:  Superstição na Wikipedia.

Conclusão

No fim das contas, acredito que tanto a superstição quanto a espiritualidade nos ajudam a dar sentido ao mundo ao nosso redor. Seja através de pequenos rituais, de sinais do universo ou do tarot, o importante é encontrar aquilo que nos traz conforto e nos faz sentir conectados com algo maior.

E você, já teve alguma experiência curiosa envolvendo superstição ou espiritualidade? Talvez o universo esteja tentando lhe dizer algo.

Sobre a autora

Alice Alves
Alice Alves

Alice Alves é uma mulher experiente que entrou no mundo do marketing digital vinda dos jornais.

Ela se especializou principalmente em questões locais, o que lhe dá uma perspectiva única quando se trata de lidar com histórias que precisam de pesquisa minuciosa e toque pessoal.

Ela tem dotes com pessoas e isso a torna uma excelente especialista em marketing.

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O que são amigos?

Verônica Moreira: ‘O que são amigos?’

Verônica Moreira
Verônica Moreira
Imagem criada por IA do Bing - 17 de fevereiro de 2025 
às 13:12 PM
Imagem criada por IA do Bing – 17 de fevereiro de 2025
às 13:12 PM

Amigos são presentes de luxo que recebemos ao longo da vida. São aqueles que nos ajudam a escrever nossa história.

Há quem diga que não tem amigos… Ah, mas mentem, por falta de sabedoria.

Amigos não são apenas aqueles com quem convivemos diariamente, embora ter um amigo por perto seja surpreendente! Amigos são aqueles presentes que permanecem, mesmo quando distantes; aqueles cuja presença, muitas vezes, não percebemos, ainda que estejam ao nosso lado. Amigos são os que movem montanhas para que sejamos felizes e, também, aqueles que movem um simples grão de areia — e nem percebemos o quanto fomos abençoados por esse gesto.

Quantos livramentos recebemos… E sabe através de quem? Daqueles amigos invisíveis que, muitas vezes, passam despercebidos em nosso caminho.

Sim, amigos não são apenas os visíveis, que nos olham nos olhos e nos envolvem com um abraço sincero. Há amigos que movem montanhas e nem sequer sabemos que existem. Não são anjos que voam, mas caminham entre nós. São anjos terrenos, que nos admiram e, por essa admiração, tornam o nosso caminhar mais leve.

Já aconteceu comigo… Eles existem, para mim. São humanos como eu e você. Não alardeiam o que fazem, nem contam a ninguém o quanto nos querem bem.

Ah, como é bom ter amigos — de farra, de dor, de barriga e de abrigo. Como é bom ter amigos, invisíveis, visíveis e até aqueles desconhecidos.

Abrace seus amigos. Trate com amor os desconhecidos. Porque, por trás de toda conquista, grande ou pequena, sempre há uma mão amiga.

Verônica Moreira

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Na velha estrada

Ismael Wandalika: Poema ‘Na velha estrada’

Soldado Wandalika
Soldado Wandalika
Imagem criada por IA do Bing – 17 de fevereiro de 2025
às 10:52

Nos trilhos
Nos assobios das palavras
Nos sons dos antepassados
Nos abismos que abriga as almas

É o meu caminho
Meu espinho belo
Alimento estético
Sobrevive das mágoas
Ergui meu trono
Não ando à deriva
Edifiquei meus murros
Hoje sou uma vela acessa nessa estrada velha
Trago em meu rosto os sinais de tempos
Não voltará mais, o avanço é urgente
Envelhece o presente ausente do passado
Sua história, sua essência
Guardadas nas bibliotecas vivas
Mortas pela moderna mídia.

Na Velha Estrada

Um presente é sombrio
Assusta o passado nostálgico
Passos lembram os dias de eternas aprendizagens
Um olhar visita o tempo e observa as mudanças

A estrada que trilhamos, porém, precisamos de novos passos para não ficarmos no tempo, e deixarmos que esse tempo mate os bons tempos e os ensinamentos que deixou o nosso antepassado.

Na Velha Estrada

A música repreende
O pastor não prende
O político o povo entende
O povo é crente da lei vigente
Manifesta-se à vontade
A criança vive seus dias paulatinamente
A natureza expande seu encanto brilhante
Na Velha Estrada! Na Velha Estrada! Na Velha Estrada…

Na Velha Estrada

Dançamos ao ritmo da verdade
Com sorrisos, com saudade
Vivemos com intensidade
Olhamos para o passado orgulhosamente!
Na Velha Estrada! Na Velha Estrada! Na Velha Estrada!

Na Velha Estrada!

Soldado Wandalika 🫡

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Lúcio Borges e João Batista entrevistados pelo Jornal ROL

Uma entrevista com dois ícones da música sertaneja!

Logo da seção Entrevistas ROLianas!

MA-Conte nos como a música surgiu na vida de vocês e em que ano.

João Batista: desde os meus primeiros anos (1964) meu pai e familiares já faziam suas reuniões com interpretações de música da época. Participavam de folias de Reis o que me inseriu na música de forma natural. Mas o que me fez querer tocar e cantar foi um momento numa ocasião em que eu estava trabalhando perto de onde estava acontecendo uma cantoria e quando desocupei de minhas atividades, me aproximei dos cantores e pedi para cantar uma música. Um deles me respondeu que aquela música eles já tinham cantado e não iriam repetir. 

Assim eu tomei a decisão de comprar um violão e aprender a cantar e tocar com a promessa de que atenderia os pedidos mesmo que fossem repetidos e para nossa felicidade hoje podemos cantar músicas que fazem parte da nossa história, da nossa cultura e que agradam os amigos que nos dá o prazer de presenciar nossas apresentações.

Lúcio Borges: minha infância se inicia na fazenda, nos 1971, ao lado de meus avós e tios que sempre tiveram tino para música cantando, tocando violões e acordeom. Meu avô por parte de mãe brincava com a sanfona no entardecer no alpendre tendo no auditório os filhos e netos que um a um de um jeito diferente foi engajando nesse prazer que é ver o brilho nos olhos de quem canta e de quem ouve as canções.

João Batista e Lúcio Borges
Banner do show de João Batista & Lúcio Borges

MA- Conte-nos um pouco sobre a infância, adolescência e família de vocês. 

João Batista: minha infância foi de muita luta e junto com minha mãe e irmão para sustentar a família, o que realizamos unidos e perseverantes com fé e dedicação de quem fazia o melhor de cada um para colher os melhores resultados de nosso trabalho. Hoje colhemos os frutos de nossa luta o que nos enche de orgulho e felicidade ver todos bem e encaminhados seja cantando, tocando, ensinando e ouvindo, todos têm alguma ligação com a música.

Lúcio Borges: o inicio de minha infância foi na fazenda do meu avô materno que como já disse, ele era sanfoneiro, contador de causos e muita luta para sustentar a família. Isso faz parte de nossa cultura. Reunir a família e falarmos de nossas alegrias e tristezas, além das labutas da vida. 

Logo na idade de iniciar na escola mudamos para cidade e ali convivendo no meio religioso em que a família foi formada, logo aos 7 anos comecei a tocar violão nas novenas e reuniões familiares. Já aos 15 anos recebi meu primeiro convite para cantar numa banda de nossa cidade de Uberaba-MG (Rudi Banda Show) onde nos apresentávamos numa casa de noturna e também em shows regionais interpretando músicas de sucessos passados e atuais daquele momento (1986). Nos anos 90, dedicado ao trabalho e estudos, tocava e cantava na igreja e outros estilos em reuniões da família e amigos, quando em 1994 foi convidado a tocar contrabaixo numa banda de pagode. Isso foi ótimo, uma grande evolução musical. Mas sempre envolvido com o sertanejo foi convidado a tocar contrabaixo para uma dupla de amigos, João Batista e Paulo Cesar o que também foi um grande aprendizado e prazer, pois interpretavam músicas sertanejas que contam histórias. 

Depois de 6 anos como contrabaixista dessa dupla eu foi me aventurar pelo mundo da sonorização de eventos. Outro aprendizado que agradeço a muito amigos que foram orientadores para o conhecimento naquela época.

Sempre participando de eventos de amigos cantores, fazia participações interpretando algumas músicas. E por fim foi convidado a formar dupla com o João Batista com muito prazer e com quem temos a parceria até hoje.

MA-A trajetória do trabalho de vocês é inspirada em algum cantor? Qual?

A música de uma forma geral nos ensina muito, mas sempre temos nossas preferencias.

Em todos os estilos existem exemplos que aprendemos um pouco, mas a história da boa música sertaneja se inicia em nossas vidas tendo como bons exemplos a dupla Tonico e Tinoco em sua lindas canções e interpretações, Milionário e José Rico com belas canções e vozes destacadas como algumas das melhores para nosso gosto entre tantos outros grandes nomes da música que são referência para nosso trabalho.

Muito obrigada!

Magna Aspásia Fontenelle

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As bonecas

Nilza Murakawa: Conto ‘As bonecas’

Nilza Murakawa
Nilza Murakawa
Imagem criada por IA do Bing - 17 de fevereiro de 2023
 às 09:03 PM
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às 09:03 PM

Vestidos pretos plissados, cobrindo joelhos ralados, em cabidezinhos ambulantes no pátio, davam um ar de elegância e disciplina à mansão que se erguia imponente na Rua Alfred, 666. 

Nos jardins bem zelados, as árvores e flores se perfilavam como soldados em formação, podadas com precisão quase militar. Rente ao chão, a grama curta e sem falhas não acariciava  pés. O portão, com a dureza do ferro, ainda que antigo, abria-se e fechava-se sem um som  sequer. Um caminho de pedras de dolomitas brancas, nas laterais da calçada lisa, conduzia à  porta principal de entrada. 

No interior, o piso de cerâmica fria compunha figuras geométricas de apenas duas cores. Retratos de benfeitores hierárquicos, cujas expressões austeras eram suavizadas por quadros  de paisagens intercalados, adornavam o alongado corredor térreo. A escada de madeira em  caracol aberto, que alcançava o andar superior, também não emitia um único rangido, e seu  corrimão entalhado não guardava digitais de pequenos dedos. 

Três banheiros de cada lado, entre os dormitórios, não incentivavam vaidades. Frases em  latim, gravadas também nas molduras dos espelhos, que mostravam apenas rostos,  lembravam diariamente os valores e princípios que regiam o lugar: superbia vana est, ordo et  disciplina, timor et reverentia, scientia et obedientia, patientia in silentio. As toalhas bege de  felpa baixa, cuidadosamente dispostas nas prateleiras, eram rapidamente corrigidas a  qualquer sinal de desordem. Dispensadores de sabonetes e shampoos, com gotas racionadas,  não exalavam perfumes. 

As camas enfileiradas, encostadas pelas cabeceiras ao longo das paredes cinzas, cheiravam a  meia infância sob lençóis desamassados, colchas dobradas pela metade e travesseiros  expostos sem contos de fadas. Nas janelas altas, com cortinas densas semiabertas, onde  perninhas nas pontas dos pés não alcançavam, mal atravessava-lhes o sol maternal. 

O ar era limpo, e madres vigilantes e madeira nobre muito polidas. As cadeiras, distanciadas a  dois palmos bem medidos entre elas, preenchiam duas mesas compridas e nuas, mantendo a  convivência ordenada. Em silêncio reverente, as refeições eram servidas pontualmente, respeitando as normas e exigindo mãozinhas limpas. 

Raramente mencionada, uma porta trancada a sete chaves levava ao porão. Ali, nas  profundezas da imponência da mansão, residiam os mais bem guardados segredos, certidões  de nascimento e outros documentos tristes, e objetos proibidos de adoração e de luxúria,  envoltos na proteção das sombras e da mudez conventual. 

O tilintar das chaves na cintura, que anunciava com antecedência alguma presença rígida, o coral de vozes miúdas, que promovia autoestima e disciplina, o tradicional e elegante piano de  cauda e o sino de cobre eram os únicos sons que quebravam o silêncio, sempre em horários  religiosamente determinados. 

Blem! Blem! Blem! Às 6 horas, amanheceu, era hora de acordar. Depois, o sino anunciava as  quatro refeições, o início e fim das atividades diárias, os momentos de descanso e quando era  hora de se recolher. 

Pauline, de nove anos, jogada de um lugar para outro, com pais vivos, abastados e distantes,  destacava-se entre as outras na mansão por seus grandes olhos azuis, cachos alourados angelicais, perspicácia e alegria constante, embora às vezes desconexa, que disfarçava para  não ser aborrecida pelas superioras. Ainda assim, suas pequenas travessuras cotidianas e  outras rebeldias eram sempre uma jornada solitária, pois ninguém ousava acompanhá-la por  temor. Bolhas de shampoo e gritinhos felizes, desenhos esquisitos ou agourentos em espelhos e vidros embaçados, brotos de flores esmiuçados, pertences alheios escondidos,  correspondências rasgadas, copos cuspidos, berros e batidas insistentes naquela porta  proibida, chaves furtadas sem êxito ou entortadas rendiam-lhe constantes punições: privação  de sobremesas e recreação, cem vezes uma frase em latim escrita em letras garrafais, acordar  mais cedo para realizar tarefas extras, joelhos nas pedrinhas, olhos postos no canto da parede,  quarto da vergonha e… porão! Vitória: finalmente adentrava o lugar sombrio que tanto a  atraía. 

Saboreando a atenção, a desordem e o jogo da perturbação e reações, ela fazia carinha inofensiva, dissimulava olhos melosos e inocentes, agarrava-se nas barras dos hábitos pretos, pois percebia que havia um despreparo para lidar com ela, e ganhava perdão. 

Nas suas raras tardes livres primaveris, ela costumava arrancar petúnias vermelhas ou rosinhas  espinhentas cor-de-rosa pendentes e levava-as escondidas até o dormitório. À noitinha,  enquanto o sino murmurava um lamento arrastado e quase morto — blem… blem…—, e todas  as luzes e atividades eram encerradas, Pauline emaranhava as flores nas “bonecas” pálidas que  repousavam, ajeitando-lhes delicadamente as mechas de cabelo solto para não acordá-las. Algumas, no entanto, ela sempre cobria de branco da cabeça aos pés, como castigo na certa. Vez ou outra, tirava seu laço de fita permitido do cabelo e amarrava-o nos pescoços dessas pobres, uma a cada dia, apertando-o com força até que as “bonequinhas”, com espinhas arrepiadas, arregalassem os olhos tristes ainda quentes. Abafava-lhes o grito com as mãos,  uma sobre a outra, a sangue frio e visceral, até que os corpinhos frágeis ficassem roxos,  apagando definitivamente os sorrisos amarelos de desdém que tantas vezes a incomodaram,  enquanto sussurrava: “Dorme, dorme, dorme, anjinho…” 

Nos jornais locais, principalmente durante a primavera, pequenas notas semanais preenchiam  a seção de óbitos infantis por causas naturais. E no Orfanato Springfield, na Rua Alfred, 666, à  espera de novos brinquedos ambulantes, Pauline balançava escondida um bercinho ainda  vazio no porão… DOMINUS SUI — DOMINUS SUI — DOMINUS SUI — DOMINUS SUI — DOMINUS SUI — DOMINUS SUI FORTITUDO SOLITARIA — FORTITUDO SOLITARIA — FORTITUDO SOLITARIA — FORTITUDO SOLITARIA  — FORTITUDO SOLIT…

Nilza Murakawa

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