Alento da morada materna
Ella Dominici: ‘Poema Alento da morada materna’


às 06:22 PM
A morada materna não tem paredes — tem pulsos.
Não se entra por portas, mas por respiros.
Lá, o tempo é um leite que ainda nutre,
e cada ausência se amacia na palma de uma presença antiga.
Quem ali repousa não se esquece mais de si.
Pois se reencontra no calor do primeiro nome,
aquele nome que só as águas profundas sabem dizer.
A terra que embala esse abrigo não é seca nem firme —
é úmida de eternidade, fértil de presságios.
Dela brotam memórias com cheiro de jasmim e chão molhado,
palavras não ditas que ainda assim embalam o ser
como se fosse sempre criança, ainda que velho de dores.
E quando o mundo lá fora grita, fere, apressa —
é para dentro que o filho retorna.
Como quem se encosta no colo do sagrado,
com o ouvido colado à pele do universo,
ouvindo o coração que o gestou.
Há silêncio nessa casa —
mas é um silêncio que canta.
Ali, o grotesco se curva diante do mistério
e o sublime dança com os pés sujos de barro,
como quem celebra a única verdade:
o amor que não cobra presença, porque é presença.
Aquele que não fala de si, mas pulsa em tudo.
Ella Dominici