Sônyah Moreira: '36 anos apenas'

Dizem os teóricos que nossas vidas são traçadas pelas teias do destino,  são como peças de um tabuleiro  de xadrez, os jogadores são os deuses.”

 

36 anos apenas!

Quantas coisas se passam em 36 anos! As lembranças são guardadas com muito carinho; digamos, metaforicamente, em uma caixinha revestida de veludo, incrustada de ouro, pérolas e pedras preciosas. Dizem os teóricos que nossas vidas são traçadas pelas teias do destino, são como peças de um tabuleiro de xadrez, os jogadores são os deuses.

Algumas coisas são bem  planejadas, outras nem tanto, percebemos os anos como o balanço das ondas do mar, vamos sendo empurrados, desviando de muitos  obstáculos, transpondo outros.

A cada ano vencido, um pouco mais de experiência, mais aprendizado e uma certeza. Fácil? Não mesmo! Fazendo uma analogia, seria como uma âncora,  que só  se percebe o valor no mar revolto.

A paixão avassaladora vai aos poucos se transformando em amor,  e a cumplicidade cada dia fica  maior. Com o passar dos  anos as almas tornam-se uma só,  é como se as metades fossem se encapsulando uma na outra, assim,  uma  repetição de outras vidas. A união faz lembrar a incessante procura pelo seu par de asas de anjo que,  ao se reencontrarem,  se completam.

A imagem nos  retratos amarelados pelo tempo sofre  uma mutação,  não nos reconhecemos mais, os sulcos e vincos  das faces, aliado ao acinzentado das madeixas, mostra o tamanho da caminhada.

Olhando para trás, sentimos  uma   saudade danada, talvez, da inocência, ou, do tempo  desperdiçado  em  coisas tão  banais, impulsos da juventude. A estrada foi ficando demasiadamente longa, e os degraus das escadas parecem aumentar sua altura.  O problema está em  nossos joelhos, não são mais os mesmos, às vezes rangem como dobradiças enferrujadas de portas envelhecidas pelo tempo.

Depois de 36 anos, percebemos que existe mais passado que futuro, as lembranças muitas vezes nos fazem  rir; quanta imaturidade, o crescimento veio aos solavancos, em meio às tempestades e tormentas, próprios da idade, pois a juventude é como um temporal de verão que   passa muito  rápido!

Fácil? Não foi! Percebemos com o passar dos anos,  que o conviver é uma coisa feita em conjunto, 50% de cada lado, sem nenhuma sombra de dúvida que  as responsabilidades são em partes exatamente iguais.

36 anos! São 432 meses, 13.140 dias, nossa! Que pouco tempo, melhor parar com esta conta. O fato é  que, não percebemos o tempo passar, só nos  à consciência, quando paramos pra pensar, pois, com a correria da labuta diária, não há   espaço  pra ficar se lamentando.

É  o tempo passou!   Ficamos velhos, todavia, aquela paixão se solidificou, não tem mais  pressa, nem necessidade de impressionar, afinal, nos conhecemos profundamente, sabemos o que agrada  e o que  desagrada.

Sabe! Olhando para trás, só tenho uma certeza: começaria tudo de novo, e detalhe, sem mudar uma única vírgula. O tempo nos amadurece a ponto de perceber o quão maravilhoso é encontrar sua alma gêmea, para alguns, essas palavras podem parecer piegas, porém, nada sobrevive se não for verdadeiro!

Passados  36 anos, as ações, gestos e olhares falam por si só.

O mais  desesperador,   é não saber quanto tempo ainda teremos, porém, se eu  tivesse  uma fada madrinha, igual a dos contos de fadas,  faria um único pedido, pelo menos mais 36 anos ao seu lado.

No balanço geral, foram mais vitórias, as derrotas, usamos como calçamento da estrada. E não é que ficou uma bela estrada!

Os 36 anos de  um casamento   são considerados  as  Bodas de Cedro!  As árvores de Cedro  são os monumentos naturais mais célebres do universo. A religião, a poesia e a história igualmente os consagraram.

Alphonse de Lamartine,  um poeta francês do século XIX, descreveu  o Cedro  como  seres divinos em forma de árvores.

Para o povo  libanês,  o Cedro,  é sinal de união que os fortalece, para  enfrentarem  todas as tempestades e ataques.

Para os  alguns autores  da Bíblia, o cedro   é considerado um símbolo de  força, imortalidade e eternidade!

Será que precisa dizer mais alguma coisa?

 

Sônyah Moreira – sonyah.moreira@gmail.com




Adriana da Rocha Leite: 'Nosso encontro'

Adriana da Rocha Leite: ‘NOSSO ENCONTRO’

 

 15/08/1989. No ônibus, alguém me observava. Não percebi de imediato.   O encontro aconteceu somente mais tarde. Não foi amor à primeira vista, do tipo fulminante, de perder o fôlego. Primeiro um olhar, depois muitas conversas. m novo mundo de escolhas e de conhecimento. Tudo era novidade para aquela adolescente. E como buscara por novas fronteiras, novas ideias e novos caminhos… O desconhecido sempre me fascinou, pelas perspectivas de mudança, de romper a zona de conforto e, principalmente, pelo seu caráter essencialmente audacioso. Assim o conheci!

O tempo nos fez amigos, a amizade nos fez amar e então, eu perdi o fôlego! Por viver um Amor de rupturas com conceitos e estruturas. Por entender que a convivência exige respeito e não posse (“não sou tua, não és meu”), que somos completos e não “metades da laranja”, tampouco você é a “tampa” da minha panela. Sou única e você também o é!

Nunca quis um relacionamento de “faz de conta” ou de hierarquia.  Não sou adepta às ordens: minha rebeldia congênita não aceita imposições.  Por isso, assustei-me quando em conversa com meu pai sobre o casamento, ele lhe disse: “Você sabe que não poderá mandar nela.” Sua resposta:  “Se quisesse mandar em alguém, não poderia estar me casando com sua filha”.

Sua fala foi-me arrebatadora, fez-me sentir mais a liberdade  que já me pertencia), fez-me entender e valorizar a importância do vínculo, da convivência saudável de quem quer compartilhar e não simplesmente dividir.  E nada disso é mero conceito. Não para nós.

Não houve “pedido” formal, foi tudo tão natural, tão do nosso jeito, antes, durante e depois…

Valorizamos nossa convivência em busca da harmonia, não de pensamentos, ações e reações idênticas/iguais, mas de sintonia, de diálogo amoroso sobre quem somos e o que queremos, enquanto indivíduos e enquanto casal. Respeitar diferenças não nos faz sofrer, faz-nos próximos e cúmplices: “Somos suspeitos de um crime perfeito…”

Quem poderia homenagear-me no dia 08/08? Quem saberia a importância desta data no calendário de minha história, de minha vida? Quem entenderia qual foi a perspectiva e quais foram os sonhos da menina que saiu de casa aos 17 anos? Que não fugiu. Que foi em busca do que sempre soube que lhe pertencia? Sim, você e tão somente você!

Agora entendo: não foi um encontro em 1989. Foi um reencontro!…