Ficar em casa…

Clayton Alexandre Zocarato: Conto ‘Ficar em casa…’

Clayton Alexandre Zocarato
Clayton A. Zocarato
Imagem gerada com IA do Bing – 8 de outubro de 2024 às 9:22 PM

Ficar em Casa’  naqueles dias de morte não era algo fácil.

As notícias não paravam de chegar, do número de mortos e feridos que aumentava volumetricamente.

Pessoas entrando em crises de suprema ansiedade, aos quais faziam suas subjetividades ficassem atormentadas com o pavor de vir a morrer precocemente.

Um morrer agonizante, aterrorizante, alucinante.

Sufocado por um vírus, que fazia o ‘Ficar em Casa’ intercalar com uma vontade desesperada de poder criar e colocar para fora toda a prova psicológica de medo e incerteza  que o confinamento estava ocasionando.

Mas o que seria de fato esse tal coronavírus?

O prenúncio do Juízo Final?

A ascensão de um Nirvana Sanguinário?

O fato é que a humanidade ignorou sua própria percepção de limitação, defronte as artimanhas da natureza que, com uma forte forma minúscula  de vida, estava causando mais mortes que muitos exércitos e impérios fariam ao longo dos tempos.

Tudo se escondia pelo ar, ao qual cada respiração poderia parecer um sinal do último suspiro assistidos por akáshicos* de uma morte, que não estava livrando ninguém’, não importando sua nacionalidade, sexo, visão político–partidária, idade, religião, tampouco  em fazer uma acumulação sucinta de defuntos, que muitas vezes eram sepultados sem as exéquias primordiais e essenciais, para seu encaminhamento para uma outra dimensão.

Ficar em casa, diante a tela do computador, TV ou celular, acompanhando freneticamente por alguns, que pregavam  um negacionismo que levou ao sepultamento de atrevimentos filosóficos que assim viessem a dar um curso afetivo, para que as pessoas não sentissem que  estavam sozinhas, e que, sim, havia  uma forte humanização de que as emoções estavam à flor da pele, e que havia um materialismo latente em que as pessoas tinham medo de deixar este mundo de forma tão cruel.

Afinal, isso poderia ter sido o anúncio do Apocalipse Bíblico?

O aviso da fúria divina, diante dos nossos mais terríveis pecados, de um coração humano que trancou sua bondade e empatia em busca da sua autorrealização custe o que custar, não  estava carecendo em passar por cima de quem ousasse cruzar seu caminho, de punitivo, em relação à promiscuidade mental de boa parcela das pessoas.

O Corona Vírus  nos fez lembrar que, quando tiramos férias do bom senso, o trabalho da morte vai fazer muitos carecerem de boa sorte.

E milhões perderam a dádiva de viver, por um querer que ultrapassava o limite entre o que seria sensato, do que seria barato.

O barato em se divertir e entreter, com uma doença que no seu início parecia distante para a maioria das pessoas, mas que quando bateu na sua porta da sua casa, causou um tipo de sofrimento e temor, que fez até os mais  céticos chamarem pela misericórdia divina.

O sensato se apresentou que é necessário  os ‘homens e mulheres’  pensarem  mais, em faca a  saciarem  suas vontades e necessidades, do que se ajoelharem a sacrifícios que possam virem, assim trazerem o bem-estar para seus semelhantes, sem precisar agraciar alguma Ideologia em especial, e fazer assim todos lembrarem que viemos na mesma bolha de esperança e desesperança chamada Terra.

O desespero de perder uma vida, que em determinados momentos já não passava de um peso perante suas sociedades, em que ser escravo de si mesmo alimentava uma ferocidade de ignorância, que assim fazia brotar uma ânsia de inconveniências, em ver o corpo do outro como uma arma em potencial, sendo perigoso o toque, um simples apertar de mãos, que pudesse contaminar todos nossos entes queridos, e assim levar para uma psicose mais profunda, detida em um campo analítico, que quando Ficamos em Casa, temos e tínhamos  a tremenda inocência de que podemos estar protegidos contra todos os perigos, mas que  não  foi  bem assim que as coisas aconteceram.

A pandemia (covid-19) (ou as Pandemias ao longo da história), só vieram ornamentar um sentido de desejar se aproximar de uma eternidade que não possa causar dor, mas nosso rancor em pensar unicamente em determinados casos, somente no nosso bem-estar pessoal, fez o espiritual se afastar de um plano astral, que oferecesse algum tipo de redenção divina, para uma civilização que gosta mais da emoção do que a razão.

‘Ficar em Casa’, não era uma atitude lá muito bacana, o importante era desafiar esse ‘pequenino monstrinho’, e não se ajoelhar para prescrições científicas que tirassem a capacidade de ir e vir.

Imunidade de alguns caminhava de mãos dadas com o adoecimento dos mais vulneráveis, e pela lacuna de se colocar na virtuosidade de uma consciência lúcida, de que perder alguns momentos da sua sociabilidade, também seria uma forma de reflexão acerca de como podemos nos outorgarmos  na construção de uma cidadania mundialista, que não veja as regras como algo somente repressivo, mas sim como ativo para ‘uma desaceleração em somente existir’, mas sim insistir que a história necessita de aprendizados duros, para que seus protagonistas deixem um pouco seu egoísmo de lado, partindo para um labor de crescimento pessoal e intelectual, que alimente seu corporal em função do seu bem-estar, e que  também seja um cadência de vaporização das nossas mais profundas frustrações.

‘Ficar em Casa’, uma expressão que, em determinados momentos, eleva um questão de limitação de nossa liberdade, ou talvez solidão, que reflete o vazio do coração, ou requer uma análise mais profunda  da razão.

O vírus não tem compaixão, mas causa aflição, uma tenebrosa sensação de que vivemos fatos pelos quais  toda a  inteligência não consiga uma consciência do que seja óbvio, gerando um cunho da destruição do que seja a libertação, para se chegar a uma comoção de colocar todos os seres humanos em patamar ético de realmente se importar um com os outros.

‘Ficar em Casa’ soa como um aprisionamento de nossas vontades, diante os deleites de uma reconfiguração, de imiscuir a dialética que se possa  pleitear todos os corpos dentro de um ‘vivenciar’, de se fazer ser respeitado diante as ações e decisões individuais, que procurou dentro de suas faculdades mentais maneiras de enganar o tempo em busca de alguma  prevenção.

Uma prevenção que gerou massificação, assim como também uma intepretação equivocada, de que viveríamos um Estado de Guerra Coletivo, quanto a um Inimigo Comum, de tão Comum que era (e ainda é!), passou por uma  comutação de que o Empirismo não poderia de imediato obter todas as respostas possíveis para o temor de uma extinção do homo sapiens bem como o Criticismo, veio à tona, em que quando se retira o bem lúdico da capacidade de abstração do real, não é necessário armas para se declarar uma guerra generalizada entre as polivalentes formas étnicas.

A morfologia de um trancamento corporal como mental fez da covid-19, um lembrete que devemos lembrar-nos de uma valorização da simplicidade diante as nossas ambições mais profundas, e que se faz jus e necessário estar em torno, de uma  transmutação entre estar cuidando de si, como cuidar do outro, fazendo uma transgressão que a saúde, não é somente uma sinfonia de massagear egos exaltados, mas sim uma práxis de que o nosso lar seja nosso castelo em   guardar todas as nossas vontades e desejos mais profundos diante a loucura de vim a ser exterminado por um oponente microbiológico, que não estava poupando absolutamente ninguém de suas argúcias demoníacas.

‘Ficar em Casa’? Mas o que seria isso de fato? Já que uma boa parte da humanidade está perdida por entre ditames, de voltar enxergar somente o que seja conveniente para si mesmo, caminhando para a exigência de Direitos, mas que lucidamente se faz demente a objetar de seus Deveres.

Desejos, Deveres, Direitos, Dialéticas, Dúvidas.

Vivemos tudo isso, de forma a estarmos ‘juntos e misturados’, em uma sinfonia metafísica de buscar verdades, de que mesmo internamente aos nossos micros espaços proativos mais profundos, necessitamos urgentemente de estarmos em evidência, custe o que custar.

A humanidade ainda procura seu devido lar depois da pandemia da covid-19.

As pessoas, ainda se sentem aprisionadas, com o medo de que o Anjo da Morte, venha em um  voo demoníaco,  demonstrar o medo que bilhões de indivíduos têm de desapegarem desse mundo, e de como reinventar novos mundos psicossociais, gerou uma camada de ansiedade, que levou a um globalismo doente, e medonho em aceitar que  nossa  limitação dentro da cadeia biológica não se diferencia em quase nada  em relação a outros espécimes.

‘Mesmo Ficando em Casa’, caímos na parcimônia de uma realidade em sermos caçados por esse vírus, de que a  solidão é um intento ao qual tivemos que aprender a cada momento a lidar com o  extermínio e a perseguição da natureza, e não transformá-la em uma lide, que confronte nossos pensamentos e sentimentos mais profundos.

‘Ficar em Casa’, foi a fagulha de esperança para que assim pudéssemos conhecer um pouco de nossas famílias, e também em demonstrar como a saudade é um ferro quente penetrando em nossas carnes, que fez ferimentos profundos em nos realizarmos ou afirmamos como seres autossuficientes.

Se o suficiente para salvar vidas era o confinamento, então isso cadenciou a formação de novos lamentos, pois o desrespeito ganhou o lugar da bondade e da empatia, em nome manias de procurar estar sempre no meio da multidão, mesmo que isso levasse todos para o caixão.

‘Ficar em Casa’. Eis a graça, para tentar se barrar uma desgraça, que ainda se passa na vida alguns infames, que se tornam alvos fáceis,  da ‘coroa micra da morte’.

Nota do autor

Akáshicos: Em Sânscrito, significa todos os eventos que já ocorreram.

Clayton Alexandre Zocarato

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As lições da pandemia, segundo Celso Lungaretti e Dalton Rosado

Celso Lungaretti

AO ARRANCAR A MÁSCARA DO CAPITALISMO, A PANDEMIA 

TORNA VISÍVEL PARA TODOS SUA MONSTRUOSIDADE INTRÍNSECA

C A criação do mundo segundo Ary Toledo e chegou a ser apresentada no programa O fino da bossa (é da Elis Regina a voz que se ouve chamando-o para o palco).

 Mas, a indignação é toda minha, neste festival afrontoso de iniquidades de 2020.
É que acabo de ler no UOL a notícia do lançamento de três modelos de um novo iPhone da Apple por 3.700, 4.000 e 4.500 reais. Em meio a tanta desgraça, ainda há quem se interesse por tais futilidades?!
Quantas vidas não seriam salvas se as necessidades (e, desta vez, as emergênciascoletivas prevalecessem sobre a insensibilidade egoísta que o capitalismo martela dia e noite na cabeça das pessoas! 
Veem o irmão estrebuchando na sua frente, mas nunca abrirão mão dos seus privilégios, do seu status e do sagrado direito de desfrutar as geringonças em troca das quais se desumanizam até se tornarem caricaturas de seres humanos.  

E as empresas de planos de saúde, quando grassa a peste, recusam uma compensação governamental para não deixarem imediatamente sem cobertura os inadimplentes, pois a consideraram insuficiente para contrabalançar o quanto perderão.

Os que neles confiaram perdem a vida, mas os Strooges da medicina mercantilizada não abdicam de um centavo de suas receitas. Torço para que, após serem abandonados à própria sorte no momento  de maior aflição, os cidadãos aprendam a prescindir desses traidores do juramento de Hipócrates, condenando-o o máximo deles à falência!

E os hospitais particulares que estão demitindo profissionais de saúde porque, com a necessidade de atender aos doentes da Covid-19, não estão podendo realizar as cirurgias eletivas que custam os olhos da cara e lhes garantiam a fatia principal de seus lucros! 
Fico imaginando seus dirigentes à testa de campos de extermínio nazistas, cuidando de obter os melhores preços para o sabão fabricado com a gordura corporal dos prisioneiros exterminados…

A saúde sendo encarada como mercadoria é uma das aberrações mais repulsivas do capitalismo.

Enfim, deprime-me muito que só mesmo um vírus assassino tenha conseguido abrir um pouco os olhos da humanidade para a verdade sobre o capitalismo: ele nos conduz insensivelmente para a morte e, se não começarmos a reagir, morreremos como moscas. Como estamos morrendo agora.

(por Celso Lungaretti)

O MEDO DA MORTE NOS FAZ VALORIZAR A VIDA E O QUE ELA TEM DE MAIS NOBRE: A SOLIDARIEDADE HUMANA!

Termos de ficar reclusos em nossa residências fez com que lançássemos um olhar contemplativo sobre a nossa vida interior e nossa relação com a vida exterior, entre outras questões de sentido social profundo. 

Este é o lado lúdico da quarentena.

 Nesta semana mesmo desengavetei (ou trouxe à terra das nuvens eletrônicas) um breve conto infantil que houvera escrito há quatro anos para o meu primeiro neto, que adora passarinhos: O canário que latia
Tal texto tratava da solidariedade entre um passarinho que havia caído do ninho, quebrado a asa esquerda e sido protegido por um cachorrinho contra a gula de um gato faminto. Com a convivência harmoniosa e solidária, o canarinho aprendera a latir para afugentar seus predadores. 
Tratava-se, portanto, de um conto infantil sobre a solidariedade entre seres diferentes na forma e iguais em sentimentos, cujo sentido moral era afirmar a possibilidade de se fazer o impossível diante de uma iminente tragédia.
Divulgado nas redes eletrônicas da família, despertou um sentimento de alegria entre as crianças, que agora estão mais próximas dos seus pais e adorando essa interação forçada. 

 “a essência da grandeza do sentido humano da vida”

Da mesma forma, estamos vendo as pessoas irem para as janelas dos seus prédios e cantarem a plenos pulmões as melodias que mostram a todos a essência da grandeza do sentido humano da vida na superfície desse nosso planetinha tão sacrificado por sentimentos avessos aos que felizmente ora afloram.

 A mobilização de pessoas nos mais diferentes lugares e no mesmo momento, arrecadando gêneros alimentícios e roupas para as comunidades que até ontem não eram alvo desse olhar solidário, representa o resgate e despertar do sentido humano que habita nas mentes adormecidas por um móvel de relação social individualista e exclusivista.
O medo da morte nos faz valorizar a vida e o que ela tem de mais nobre: a solidariedade humana! 
O ser humano somente sobreviveu às intempéries da sua evolução, à sanha de predadores e às muitas catástrofes sanitárias e climáticas graças ao sentido solidário de sua existência. 
Heróis da luta pela vida sendo hostilizados pela mais abjeta escória

.Que dizer dos abnegados profissionais da saúde que, em defesa da vida, vão para a linha de frente de hospitais nos quais a contaminação virótica é exponencial, mesmo sabendo que os colegas que até ontem estavam ao seu lado hoje estão sepultados em covas coletivas, sem nem mesmo poderem ser velados por seus familiares? Eles são os exemplos concretos de que o ser humano é intrinsecamente bom. 

 Mas, principalmente, a crise sanitária nos faz perceber a irracionalidade da vida que levávamos antes dela. 
A diminuição da poluição aérea nas grandes cidades em razão da redução do uso indiscriminado da combustão fóssil nos veículos que congestionam o trânsito, redução provocada pela paralisia das nossa relações sociais mercantis, mostra que outro modo de viver não somente é possível como necessário.
efeito estufa, que provoca o aquecimento global, deu um tempo na sua escalada genocida. 
O homem que destrói o Brasil e nos faz motivo de chacota no mundo inteiro

.Lamentável nisto tudo é que tais procedimentos não derivem da conscientização dos seres humanos sobre os seus atos genocidas, mas consequência da ação de um vírus microscópico irracional que confronta a nossa própria racionalidade. 

 A crise sanitária está, também, a desnudar a hipocrisia da suposta preocupação com a vida, alegada por quantos desejam a volta ao staus quo da produção mercantil e de suas relações sociais. 
É que, diante do constatado aumento das infecções e das mortes provocadas pela pandemia virótica, muitos governantes propõem o abandono precoce da quarentena, sem levarem em conta o morticínio que isto provocará, presos que estão ao modelo que os jungiu ao topo do poder no atual sistema político-governamental.
O coronavírus, sem o saber e sem qualquer traço de inclinação ideológica, demonstrou que o pensar governamental sobre qualquer alternativa de relação social está proibido, não havendo melhor demonstração disto do que o pesadelo atual, a confirmar a existência de uma corrente de ferro que nos aprisiona socialmente: o fetichismo da mercadoria. 

.Para o capital produzir mercadoria está acima da proteção da vida.

 A grandeza dos muitos gestos de humanidade que temos presenciado contrasta com a simbologia genocida de quem faz a apologia das armas, chegando com isto até a sensibilizar uma população desesperada pela miséria social causada pelo capitalismo (moral e material): esses falsos messias ainda conseguem passar-se por salvadores da pátria aos olhos de muitos incautos. 
Qual profetas da morte, eles tentam nos convencer de que a intensificação da causa do mal pode nos livrar do próprio mal. 
 Dalton Rosado)

Carlos Carvalho Cavalheiro: 'Coronavírus: o que nos espera?'

Carlos Cavalheiro

Coronavírus: o que nos espera?

Vivemos num mundo repleto de informações. O acesso a todo tipo de documento, pensamento, de dados, estatísticas, vídeos, enfim, toda a forma de informação nunca teve o acesso tão facilitado como nos dias atuais.

Não há necessidade de buscar a informação. Ela chega até você, quer queira ou não. Os meios de comunicação da atualidade facilitaram essa disseminação que tornou-se praticamente impossível controlar essa ação. Daí o sucesso das chamadas fake News. Sem verificar a procedência da informação, as pessoas repassam para outras numa velocidade estonteante e, quando se percebe, aquele texto correu o globo todo.

Acesso a dados não significa qualidade de informação e muito menos conhecimento. Pode se tratar, por exemplo, de um boato, de notícia falsa, de dados manipulados, de meias verdades. Pressupõe que tais informações se convertam em conhecimento na medida em que sejam processadas de tal forma que relacionadas a outros dados e a conhecimentos prévios possam criar um entendimento qualitativo (e, talvez, quantitativo) sobre o assunto abordado.

Qualquer ser humano com algum tempo de vivência tem alguma informação sobre o que é um vírus. Também, esse mesmo ser humano é capaz de entender como se processa o contágio desse tipo de organismo para conosco. Porém, quando se trata de algo novo, ou seja, de um vírus que sofreu mutação ou que era desconhecido dos cientistas, então é preciso redobrar a atenção para aquilo que os especialistas no assunto estão adquirindo de informação nova e de conhecimento.

Aparentemente, uma questão responsável pela demissão do Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta foi a do rigor com que a sua gestão indicava para a necessidade do isolamento social e da mudança de hábitos (como o uso de máscaras e o lavar constante das mãos) para evitar o colapso do sistema de saúde brasileiro.

Muito antes dessa orientação do isolamento, empresários como Luciano Hang, proprietário da Havan, divulgava vídeo tentando demonstrar que tal atitude além de desnecessária iria provocar um colapso na economia. Carreatas ocorreram pedindo o fim do isolamento. É curioso o fato de que os modelos de carros que participaram dessas carreatas indicam que seus proprietários não terão que utilizar o transporte público, geralmente incômodo e lotado, propício para a difusão da contaminação do vírus, caso o isolamento seja flexibilizado.

Enfim, os tempos em que vivemos são de difícil entendimento. Porém, não deve ser difícil, mesmo para quem seja desprovido da melhor inteligência, entender algumas coisas básicas. E nem precisa ser entendido em economia ou mesmo em infectologia ou profilaxia para compreender o que nos espera.

As maiores economias do mundo se ressentem da necessidade de impor o isolamento social, mas não abrem mão dela. Mesmo o reticente Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, já admitiu a necessidade do isolamento social até, pelo menos, o dia 30 de abril.[1]

Com uma eleição para vencer, Trump não quer deixar a imagem de um país fracassado economicamente. Por isso, vem pedindo a gradual flexibilização das medidas de isolamento social. Por outro lado, e pelos mesmos motivos, não pretende ser acusado de negligência administrativa se o número de mortos e contaminados acelerar assustadoramente depois da imposição de regras mais flexíveis de isolamento social. Está, então, como se diz, na corda bamba.

Por outro lado, estudo revela que durante o surto de gripe espanhola no início do século XX, as cidades estadunidenses que usaram como tática o isolamento social tiveram recuperação econômica mais rápida.[2] Isso parece óbvio, pois se significativa parte da população adoecer, não teremos nem produtores e nem consumidores. Com isso, a economia ficará estagnada mesmo e será um colapso sem precedentes.

Sabe-se, por exemplo, que escolas no Brasil foram fechadas durante a Gripe Espanhola para se converterem em hospitais de campanha. De fato, nunca estamos preparados para uma epidemia tão devastadora. Porém, sendo o caso de uma pandemia, podemos, ao menos, aprender com os outros países.

O sucesso relativo do fim do surto na China, início da epidemia do novo coronavírus (Covid-19) deveu-se a ações rígidas, como o isolamento. Paradoxalmente, o sucesso do isolamento social causa uma sensação de inutilidade do mesmo. Por esse motivo, no Brasil, alguns desinformados têm filmado hospitais de campanha montados – esperando o pico da crise – dizendo que como estão vazios significa que não existe a doença ou que ela não é tão grave assim.

E desse modo, muita gente embarca nessa história de que se trata de uma “gripezinha” ou “resfriadinho”, ou, ainda, que é o caso de uma conspiração de forças obscuras que querem destruir a economia de todos os países!

Ainda não chegamos ao pico da crise do coronavírus. Por esse motivo, temerosa é a demissão do ministro Mandetta, infelizmente comemorada por quem é a favor do fim do isolamento social e, mais infeliz ainda, por outros que viram nisso uma oportunidade de “vingança” por ele ter votada, enquanto deputado em 2015, pelo impeachment de Dilma Rousself. No fim, alguns “bolsonaristas” e alguns “petistas” concordaram com alguma coisa.

O que está em jogo agora não são picuinhas pessoais. Nem é o caso de duvidar da competência do atual ministro Nelson Teich. Acontece que, fazendo um paralelo com futebol, nosso velho conhecido, não se mexe em time e em treinador durante o campeonato. A não ser que estejam muito ruins. E não parece ser esse o caso. Ao contrário, as diretrizes da gestão de Mandetta pareciam fazer sentido.

O novo ministro vai demorar um pouco até formar uma equipe de confiança, tomar conhecimento do funcionamento da máquina, conhecer os meandros políticos e de saúde envolvidos nisso, bem como planejar toda uma estratégia de combate ao vírus. Isso leva tempo e é o que menos temos agora. Por isso, a demissão de Mandetta foi, no mínimo, uma imprudência neste momento.

A boa notícia é que os estados, em sua maioria, ainda estão seguindo as orientações de quem entende do assunto: médicos, cientistas, OMS… E seguimos, ainda que ansiosos, o isolamento social tão necessário neste momento. E, também, fazendo nossa parte: evitando aglomerações, contatos desnecessários com outras pessoas, mantendo distância de segurança, lavando as mãos e usando máscaras, especialmente em locais públicos.

O vírus é o vilão da vez. E nas histórias de mocinhos e bandidos, quem não usa a máscara não é o Lone Ranger (Zorro). É o Tonto.

 

18.04.2020

Carlos Carvalho Cavalheiro.

[1] https://noticias.r7.com/internacional/donald-trump-prorroga-isolamento-social-ate-30-de-abril-29032020

[2] https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52075870