Ficar em casa…
Clayton Alexandre Zocarato: Conto ‘Ficar em casa…’
‘Ficar em Casa’ naqueles dias de morte não era algo fácil.
As notícias não paravam de chegar, do número de mortos e feridos que aumentava volumetricamente.
Pessoas entrando em crises de suprema ansiedade, aos quais faziam suas subjetividades ficassem atormentadas com o pavor de vir a morrer precocemente.
Um morrer agonizante, aterrorizante, alucinante.
Sufocado por um vírus, que fazia o ‘Ficar em Casa’ intercalar com uma vontade desesperada de poder criar e colocar para fora toda a prova psicológica de medo e incerteza que o confinamento estava ocasionando.
Mas o que seria de fato esse tal coronavírus?
O prenúncio do Juízo Final?
A ascensão de um Nirvana Sanguinário?
O fato é que a humanidade ignorou sua própria percepção de limitação, defronte as artimanhas da natureza que, com uma forte forma minúscula de vida, estava causando mais mortes que muitos exércitos e impérios fariam ao longo dos tempos.
Tudo se escondia pelo ar, ao qual cada respiração poderia parecer um sinal do último suspiro assistidos por akáshicos* de uma morte, que não estava ‘livrando ninguém’, não importando sua nacionalidade, sexo, visão político–partidária, idade, religião, tampouco em fazer uma acumulação sucinta de defuntos, que muitas vezes eram sepultados sem as exéquias primordiais e essenciais, para seu encaminhamento para uma outra dimensão.
Ficar em casa, diante a tela do computador, TV ou celular, acompanhando freneticamente por alguns, que pregavam um negacionismo que levou ao sepultamento de atrevimentos filosóficos que assim viessem a dar um curso afetivo, para que as pessoas não sentissem que estavam sozinhas, e que, sim, havia uma forte humanização de que as emoções estavam à flor da pele, e que havia um materialismo latente em que as pessoas tinham medo de deixar este mundo de forma tão cruel.
Afinal, isso poderia ter sido o anúncio do Apocalipse Bíblico?
O aviso da fúria divina, diante dos nossos mais terríveis pecados, de um coração humano que trancou sua bondade e empatia em busca da sua autorrealização custe o que custar, não estava carecendo em passar por cima de quem ousasse cruzar seu caminho, de punitivo, em relação à promiscuidade mental de boa parcela das pessoas.
O Corona Vírus nos fez lembrar que, quando tiramos férias do bom senso, o trabalho da morte vai fazer muitos carecerem de boa sorte.
E milhões perderam a dádiva de viver, por um querer que ultrapassava o limite entre o que seria sensato, do que seria barato.
O barato em se divertir e entreter, com uma doença que no seu início parecia distante para a maioria das pessoas, mas que quando bateu na sua porta da sua casa, causou um tipo de sofrimento e temor, que fez até os mais céticos chamarem pela misericórdia divina.
O sensato se apresentou que é necessário os ‘homens e mulheres’ pensarem mais, em faca a saciarem suas vontades e necessidades, do que se ajoelharem a sacrifícios que possam virem, assim trazerem o bem-estar para seus semelhantes, sem precisar agraciar alguma Ideologia em especial, e fazer assim todos lembrarem que viemos na mesma bolha de esperança e desesperança chamada Terra.
O desespero de perder uma vida, que em determinados momentos já não passava de um peso perante suas sociedades, em que ser escravo de si mesmo alimentava uma ferocidade de ignorância, que assim fazia brotar uma ânsia de inconveniências, em ver o corpo do outro como uma arma em potencial, sendo perigoso o toque, um simples apertar de mãos, que pudesse contaminar todos nossos entes queridos, e assim levar para uma psicose mais profunda, detida em um campo analítico, que quando ‘Ficamos em Casa‘, temos e tínhamos a tremenda inocência de que podemos estar protegidos contra todos os perigos, mas que não foi bem assim que as coisas aconteceram.
A pandemia (covid-19) (ou as Pandemias ao longo da história), só vieram ornamentar um sentido de desejar se aproximar de uma eternidade que não possa causar dor, mas nosso rancor em pensar unicamente em determinados casos, somente no nosso bem-estar pessoal, fez o espiritual se afastar de um plano astral, que oferecesse algum tipo de redenção divina, para uma civilização que gosta mais da emoção do que a razão.
‘Ficar em Casa’, não era uma atitude lá muito bacana, o importante era desafiar esse ‘pequenino monstrinho’, e não se ajoelhar para prescrições científicas que tirassem a capacidade de ir e vir.
Imunidade de alguns caminhava de mãos dadas com o adoecimento dos mais vulneráveis, e pela lacuna de se colocar na virtuosidade de uma consciência lúcida, de que perder alguns momentos da sua sociabilidade, também seria uma forma de reflexão acerca de como podemos nos outorgarmos na construção de uma cidadania mundialista, que não veja as regras como algo somente repressivo, mas sim como ativo para ‘uma desaceleração em somente existir’, mas sim insistir que a história necessita de aprendizados duros, para que seus protagonistas deixem um pouco seu egoísmo de lado, partindo para um labor de crescimento pessoal e intelectual, que alimente seu corporal em função do seu bem-estar, e que também seja um cadência de vaporização das nossas mais profundas frustrações.
‘Ficar em Casa’, uma expressão que, em determinados momentos, eleva um questão de limitação de nossa liberdade, ou talvez solidão, que reflete o vazio do coração, ou requer uma análise mais profunda da razão.
O vírus não tem compaixão, mas causa aflição, uma tenebrosa sensação de que vivemos fatos pelos quais toda a inteligência não consiga uma consciência do que seja óbvio, gerando um cunho da destruição do que seja a libertação, para se chegar a uma comoção de colocar todos os seres humanos em patamar ético de realmente se importar um com os outros.
‘Ficar em Casa’ soa como um aprisionamento de nossas vontades, diante os deleites de uma reconfiguração, de imiscuir a dialética que se possa pleitear todos os corpos dentro de um ‘vivenciar’, de se fazer ser respeitado diante as ações e decisões individuais, que procurou dentro de suas faculdades mentais maneiras de enganar o tempo em busca de alguma prevenção.
Uma prevenção que gerou massificação, assim como também uma intepretação equivocada, de que viveríamos um Estado de Guerra Coletivo, quanto a um Inimigo Comum, de tão Comum que era (e ainda é!), passou por uma comutação de que o Empirismo não poderia de imediato obter todas as respostas possíveis para o temor de uma extinção do homo sapiens bem como o Criticismo, veio à tona, em que quando se retira o bem lúdico da capacidade de abstração do real, não é necessário armas para se declarar uma guerra generalizada entre as polivalentes formas étnicas.
A morfologia de um trancamento corporal como mental fez da covid-19, um lembrete que devemos lembrar-nos de uma valorização da simplicidade diante as nossas ambições mais profundas, e que se faz jus e necessário estar em torno, de uma transmutação entre estar cuidando de si, como cuidar do outro, fazendo uma transgressão que a saúde, não é somente uma sinfonia de massagear egos exaltados, mas sim uma práxis de que o nosso lar seja nosso castelo em guardar todas as nossas vontades e desejos mais profundos diante a loucura de vim a ser exterminado por um oponente microbiológico, que não estava poupando absolutamente ninguém de suas argúcias demoníacas.
‘Ficar em Casa’? Mas o que seria isso de fato? Já que uma boa parte da humanidade está perdida por entre ditames, de voltar enxergar somente o que seja conveniente para si mesmo, caminhando para a exigência de Direitos, mas que lucidamente se faz demente a objetar de seus Deveres.
Desejos, Deveres, Direitos, Dialéticas, Dúvidas.
Vivemos tudo isso, de forma a estarmos ‘juntos e misturados’, em uma sinfonia metafísica de buscar verdades, de que mesmo internamente aos nossos micros espaços proativos mais profundos, necessitamos urgentemente de estarmos em evidência, custe o que custar.
A humanidade ainda procura seu devido lar depois da pandemia da covid-19.
As pessoas, ainda se sentem aprisionadas, com o medo de que o Anjo da Morte, venha em um voo demoníaco, demonstrar o medo que bilhões de indivíduos têm de desapegarem desse mundo, e de como reinventar novos mundos psicossociais, gerou uma camada de ansiedade, que levou a um globalismo doente, e medonho em aceitar que nossa limitação dentro da cadeia biológica não se diferencia em quase nada em relação a outros espécimes.
‘Mesmo Ficando em Casa’, caímos na parcimônia de uma realidade em sermos caçados por esse vírus, de que a solidão é um intento ao qual tivemos que aprender a cada momento a lidar com o extermínio e a perseguição da natureza, e não transformá-la em uma lide, que confronte nossos pensamentos e sentimentos mais profundos.
‘Ficar em Casa’, foi a fagulha de esperança para que assim pudéssemos conhecer um pouco de nossas famílias, e também em demonstrar como a saudade é um ferro quente penetrando em nossas carnes, que fez ferimentos profundos em nos realizarmos ou afirmamos como seres autossuficientes.
Se o suficiente para salvar vidas era o confinamento, então isso cadenciou a formação de novos lamentos, pois o desrespeito ganhou o lugar da bondade e da empatia, em nome manias de procurar estar sempre no meio da multidão, mesmo que isso levasse todos para o caixão.
‘Ficar em Casa’. Eis a graça, para tentar se barrar uma desgraça, que ainda se passa na vida alguns infames, que se tornam alvos fáceis, da ‘coroa micra da morte’.
Nota do autor
Akáshicos: Em Sânscrito, significa todos os eventos que já ocorreram.
Clayton Alexandre Zocarato