O Estado: paradigma de pessoa-de-bem

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo:
‘O Estado: paradigma de pessoa-de-bem’

Diamantino Bártolo
Diamantino Bártolo
Imagem criada por IA do Bing – 05 de fevereiro de 2025,
às 16:29 PM

E se numa conceção clássica se pode definir o Estado como sendo: um grupo de cidadãos (povo); localizados geograficamente num determinado espaço (território); delimitado por fronteiras, internacionalmente reconhecidas; cujo povo comunga de uma cultura, história e língua comuns; tem objetivos e desígnios coletivos, que toda a população defende, então o Estado é constituído por todos aqueles elementos, os quais não têm quaisquer responsabilidades perante o cidadão e a instituição, particularmente considerados. 

O Estado abstrato, assim entendido, nem sempre defende os interesses, não promove a justiça, não distribui equitativamente as riquezas nacionais e não pode exigir dos cidadãos e das instituições particulares, isto é, da sociedade civil, o cumprimento de determinadas obrigações. Importa, então, analisar o Estado concreto, objetivo, identificável. 

Mas o Estado tem o rosto dos respetivos dirigentes que, antes e depois das correspondentes funções, transitoriamente desempenhadas, justamente à custa da confiança que o cidadão-eleitor neles depositaram, seja no grupo político, seja diretamente no próprio governante. 

No exercício das funções que lhes foram cometidas, tais cidadãos, agora investidos de poderes especiais, devem ser os primeiros a cumprir a Lei, com equidade, com tolerância, compreensão e pedagogia preventiva, sem estratégias e processos persecutórios, sem espírito punitivo e, quantas vezes, injusto. 

E se: por um lado, o Estado tem de construir e implementar o Paradigma de “Pessoa-de-bem”, a começar nas e entre as suas próprias instituições de base como as Autarquias Locais, criando laços de confiança e credibilidade, adotando uma postura pedagógica, atuando em tempo útil, sem discriminações, independentemente das ideologias político-partidárias dos diversos responsáveis;

 Por outro lado, e nas atuais circunstâncias, o exercício do poder local democrático, nas freguesias rurais e semiurbanas, carece de uma profunda revisão e estruturação. Nesse sentido, o cidadão contemporâneo tem de participar no processo de atualização e ajustamento às realidades existentes, para garantir dignidade, competência, eficácia, iguais direitos e tratamento para com todos os seus concidadãos, independentemente das suas opções político-partidárias. 

O político, detentor do poder decisório: não pode deixar-se envolver por sentimentos ideológico-partidários; nem por questões mal resolvidas, no passado, em relação àquele sobre quem vai decidir algo; muito menos poderá ignorar a dignidade e o respeito devidos à Instituição que vai responder pelos efeitos da sua decisão e, em última análise, em circunstância alguma deve decidir contra os legítimos e legais interesses de um povo que, a partir da eleição, deve ser tratado todo por igual. 

O Estado, enquanto instituição nacional suprema, é servido por cidadãos que, no exercício das respectivas funções, cumprem ordens, executam a Lei e prestam contas aos seus superiores hierárquicos, e assim sucessivamente, numa cadeia hierárquica, que tem por limite a Lei Fundamental, isto é, o mais alto magistrado do Estado, também presta contas às instituições às quais, constitucionalmente, deve obediência e, finalmente, à própria Lei. 

Venade/Caminha – Portugal, 2025

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente HONORÁRIO do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal

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A Justiça não é cega

Virgínia Assunção: Poema ‘A Justiça não é cega’

Virgínia Assunção

Nas grandes e pequenas cidades do país

Ecoa nas ruas a injustiça irracional

Esquecidas histórias com vidas silenciadas,

Essa gente suplica por igualdade social.

Calejadas mãos dos que trabalham sem parar

E poucos desfrutando de muito luxo e poder,

Suor confundido com lágrimas a transbordar

Na luta diária pelo pão para sobreviver.

Onde estão as vozes dos que prometem, falaciosos?

Não veem as feridas abertas, doloridas, sangrando?

É preciso quebrar, urgente, as amálgamas dos gananciosos.

Que tenhamos, conscientes, a obrigação e premissa

De fazer da poesia um instrumento de protesto

Abrindo os olhos do mundo para dantesca injustiça.

Virgínia Assunção

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Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo: 'Trabalho: Suporte da dignidade, da justiça e da cultura'

Diamantino Lourenço R. de Bártolo

Trabalho: Suporte da dignidade, da justiça e da cultura

Na obra que serve a presente reflexão, António Sérgio descreve como a partir do “Self-Government” se podem criar tipos de escolas mais abrangentes, à semelhança de um Estado.

Acompanhou depois todo o processo que se desenvolveu a partir de três cidades escolares, a funcionar numa escola normal em Nova Platz – Estado de Nova York. De modalidades tais como a “Júnior Republic”, onde se instituíram leis necessárias à defesa da propriedade e o deferimento de julgamento e punição de delinquentes, verificou que as regras eram melhor executadas, quando instituídas pelos estudantes, do que impostas autocraticamente.

A Cidade-Escolar passou a organizar-se na sociedade dos estudantes, à maneira de um município norte-americano, com as suas câmaras, presidente, etc. Vários estados podem reunir-se numa nação ou confederação.

A forma rudimentar do sistema é o das Aldeias Escolares. No Município Escolar preparam-se as crianças para receber a ideia de Município. Aqui propõe-se lhes uma noção concreta do governo democrático, o qual terá por funções: fazer leis para cooperação dos cidadãos; vigiar em comum pelo seu cumprimento; elaborar um plano de governo, que é votado pelos alunos; ensinar os alunos a fazerem petições, e nestas a indicarem os objetivos principais.

No funcionamento dos Municípios Escolares, são importantes os forais, nos quais constam as regras fundamentais, nomeadamente: objetivos, lei geral, coisas proibidas, deveres, punições, etc. O capítulo termina com uma advertência: «Daí a necessidade fundamental de impedir que nas escolas surjam partidos imperados nas clientelas das políticas da nação, a fim de que preparem cidadãos dispostos a atender antes de tudo aos interesses reais do Município.» (SÉRGIO, 1984:58).

António Sérgio encaminha-se para o final da obra, considerando o “self-government” e o “self-support” afirmando que: «o verdadeiro educador há-de ser um vidente, um percursor, um profeta», (Ibidem:69), sujeitando as crianças às exigências espontâneas, naturais e ideais de uma sociedade progressiva.

O trabalho é aqui encarado como uma divisa, que suporta as condições de dignidade, de esforço pessoal criador e disciplinado, de justiça e de cultura. Os artigos produzidos na República, quer nos campos, quer nas oficinas, são vendidos dentro dela, ou para fora.

Desenvolve-se, depois, todo o processo organizativo, que conduz, inclusivamente, se for o caso, à reabilitação, perante os cidadãos e o instrutor, de todo aquele que não se esforça por cumprir as regras trabalhando, tal como se passa na vida real, em sociedade

Destaca-se, pedindo ao leitor que «… se coloque neste ponto de vista ao medir o valor pedagógico de autonomia ligada ao trabalho profissional.» Sérgio conclui a obra com o seguinte comentário: «Os remédios são, evidentemente, uma escola de trabalho e de autonomia, do labor profissional e de iniciativa – uma escola civil para a vida: é essa mesma que vos proponho. Dessa escola não vai banida – bem ao contrário – a educação estética e filosófica: só nela a arte, a ciência e a filosofia tomam vida, deixam de ser um cadáver mumificado numa sebenta.» (Ibidem:83-84).

 Bibliografia

SÉRGIO, António, (1984). Educação Cívica. Lisboa: ICLP/ME.

Venade;Caminha – Portugal, 2022

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal

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Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo: 'A justiça, na partilha da riqueza, é parte integrante do bem-estar'

Diamantino Lourenço R. de Bártolo

A justiça, na partilha da riqueza, é parte integrante do bem-estar

Uma sociedade justa, solidária e livre, certamente facilita o aumento da riqueza material do maior número dos seus cidadãos, desde que bem cedo na vida de cada um, se criem as condições para uma consciencialização coletiva de solidariedade e de justiça.

A distribuição equitativa dos bens materiais pelos cidadãos, quando tais riquezas são património, ou o produto de todos, constitui um imperativo universal, que as pessoas, as instituições e o Estado devem assumir. A distribuição das riquezas (materiais) quaisquer que sejam, conjuntamente com riquezas de natureza subjetiva, como a felicidade, a beleza, a religião e outras, em tudo o que for possível distribuir, seguramente contribuirá para um certo bem-estar geral e individual.

É claro que as elites, e o Estado é uma elite, no conjunto dos cidadãos que integram os seus diversos órgãos, têm uma posição que: tanto pode ser ajudar a reduzir as diversas misérias; como a agravá-las, sendo insensato e, em muitas situações injusto, excluir ou pretender acabar com tais elites, nem esse é o objetivo do presente trabalho, muito menos o pensamento do seu autor.

A distribuição da justiça implica, necessariamente, regras bem definidas e em todos os bens, que devem ser aplicadas, o contrário, conduziria à arbitrariedade, à parcialidade e, concomitantemente, à injustiça. Riquezas materiais e imateriais estão sujeitas, na sua distribuição, a critérios, habitualmente em função de binómios: existência-necessidade e situação-disponibilidade, também aqueles, assentes em valores ético-morais: liberdade, segurança, propriedade privada, solidariedade, paz, felicidade, obedecem a tais regras na distribuição, que em relação a determinadas riquezas são estabelecidas pelo Estado, pelas instituições, e/ou pelo próprio cidadão, de onde resulta que: «As regras da justiça prescrevem, inclusive, o respeito à liberdade.» (GOMES, 2000: 54).

O direito à justiça, nas suas múltiplas aplicações, não apenas no seu sentido mais divulgado, a justiça dos tribunais, mas em todas as dimensões da vida humana, constitui, por si só, uma riqueza insubstituível e que a par de outras, como a graça de Deus, a saúde, o trabalho, entre, ainda, muitas outras de diversificada natureza, que podem ser mais ou menos desejadas, definem o grau de desenvolvimento e bem-estar de uma comunidade, ou de uma pessoa.

Na circunstância, a justiça na distribuição da riqueza é parte integrante desse mesmo bem-estar, porque as pessoas, consideram-se objeto de um tratamento igual, face àquelas que são iguais, perante a lei. Exigir uma justiça igualitária, indistintamente da situação, necessidade, mérito e contributo de cada um para o bem-comum, tornar-se-ia numa autêntica injustiça, mas viver numa sociedade justa, tendo a justiça como valor orientador, para a distribuição de todas as riquezas materiais e imateriais, implica sólida preparação de todos os intervenientes da sociedade, e a todos os níveis de intervenção comunitária, o que eleva a justiça ao grau de outros valores superiores, porque: «A justiça representa um ideal de hierarquia superior». MACHADO, 1983:55).

A Justiça distributiva das riquezas materiais, e/ou imateriais, deve ser uma prática corrente em todas as elites, cujo exemplo e expoente máximos, se consubstanciam nos detentores dos cargos públicos do aparelho de Estado, seguindo-se, imediatamente, todos os agentes que, de alguma forma, têm um papel a um nível idêntico.

A par de outras medidas político-sociais-económicas, a distribuição justa das riquezas, por todos produzidas, impõe-se como um desígnio universal, que urge iniciar-se, desde já, como o principal contributo para acabar com as maiores chagas que envergonham a humanidade, dotada de recursos nunca antes disponibilizados, mas cada vez mais são manipulados e usufruídos por algumas elites.

Cada pessoa viverá, apenas, uma ínfima parte do tempo que a humanidade terá e já teve. Prepare-se, então, o futuro das gerações que sentem constantes dificuldades, e enfrentam as mais cruéis injustiças. Isto é o mínimo que as atuais gerações, nos diversos poderes: familiar, educacional, formativo, político, empresarial, económico, financeiro, cultural, religioso, têm o dever ético-moral de fazerem.

 

Bibliografia

 

GOMES, Maria Cristina Leite, (2000). “Johm Stuart Mill: Felicidade, Justiça e Liberdade, in: Phrónesis, Campinas: PUC-Pontifícia Universidade Católica, Vol. 2 (1) pp. 49-61, jan./jun., 2000

MACHADO, J. Baptista, (1983). Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Coimbra: Livraria Almedina

 

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal

 

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O leitor participa: Marcos Francisco Martins: 'É justa a Justiça?'

“Não sou advogado, mas sempre me perguntei: é justa a Justiça? Desde junho de 2013, contudo, refletir sobre essa questão se tornou lugar comum.”

 

Não sou advogado, mas sempre me perguntei: é justa a Justiça? Desde junho de 2013, contudo, refletir sobre essa questão se tornou lugar comum. E o principal caso a motivar a reflexão é a Operação Lava-Jato e o caso Lula, que tem Moro como um dos protagonistas.

Consciente de que estou em um Estado Democrático de Direito (Constituição, Art. 1º), utilizando-me da liberdade de manifestação do pensamento (Art. 5º – IV) e do espaço ao contraditório aberto pelo Correio Popular, valho-me deste texto para enunciar dúvidas que me surgem ao refletir sobre o contexto do processo do “triplex” contra Lula:

  1. a) É permitido ao juiz Moro manter relações estreitas com adversários do réu, ex-presidente, inclusive participando de eventos dos que lhe são adversários?
  2. b) É permitido decretar prisões baseadas em delações sem teor comprobatório?
  3. c) Pode alguém ser acusado de um crime e condenado por outro? Moro disse na página 6 do despacho dos embargos de declaração: “Esse juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela OAS nos contratos com a Petrobrás foram utilizados para pagamento da vantagem indevida para o ex-Presidente”. Não seria isso razão para anular o processo, pois Lula foi acusado exatamente de ter vantagens com contratos da Petrobrás?
  4. d) O foro de um julgamento não deve ser o local onde o objeto do processo se originou e se desenvolveu? Se for assim, por que o processo do “triplex” do Guarujá foi para Curitiba?
  5. e) Impedir ações da defesa de Lula em relação à perícia no “triplex” é permitido? (“Triplex”? O que as fotos do MTST revelaram é que o apartamento do Guarujá se assemelha mais a três unidades do “Minha Casa Minha Vida” sobrepostos, com uma reforma precaríssima, se é que ocorreu, e uma cozinha bufa, se considerados os valores divulgados sobre ela);
  6. f) grampear advogados de quem se julga não é proibido pela Art. 7º – II, da Lei 8.906/1994?
  7. g) Não seria caso de lawfare (uma guerra jurídica, em que a lei é empregada como arma no conflito) o juiz, a quem cabe julgar, atuar como promotor, cuja atribuição é a de acusar?
  8. h) O ônus da prova não cabe a quem acusa e não a quem é acusado, conforme o Art. 156 do Código de Proc. Penal?
  9. i) O mesmo argumento (não identificação pela Lava Jato dos recursos desviados) pode ser utilizado para decidir pela absolvição da mulher de Cunha e pela condenação de Lula?
  10. j) A exposição de Moro à mídia, em cujos holofotes comentou o processo, não é vedado pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar 35, 14/03/1979), Art. 36 – III?
  11. k) Expedir a prisão antes dos trâmites previstos não caracteriza alguma ilegalidade, já que contraria a Lei 4898/1965?
  12. l) Grampear conversa em que está a Presidente é lícito? Seria aceito nos EUA, por exemplo?
  13. m) Deixar vazar conversas da Presidente à mídia não viola a Constituição e a Lei 9296/1996?
  14. n) É justo ficar parado o processo contra Moro por dois anos no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para apurar se houve eventual crime com os vazamentos? A justiça que tarda, falha?
  15. o) É lícita a apropriação do auxílio moradia a quem tem residência oficial na cidade onde trabalha? A Lei Orgânica da Magistratura, Art. 65 – II, não proíbe isso?

O caso do “triplex” enseja perguntas também ao TRF 4, para saber se a Justiça é justa:

  1. a) Podem desembargadores antecipar decisão à imprensa, falando fora dos autos?
  2. b) Podem desembargadores passar um processo na frente de outros 200? Qual a justificativa?
  3. c) É comum três desembargadores chegarem a dosimetria única, com todos imputando a mesma pena aumentada a Lula, condenando-o e evitando embargos infringentes?

Questões como essas são levantadas dentro e fora do País, deixando a Justiça em situação delicada. Se é essa a Justiça que alguns brasileiros exigem, entendo que não se amparam na ordem legal. Apesar dos pesares, tenho apreço pelo vigente ordenamento jurídico e penso que agir à revelia dele atualmente é temerário ao mínimo de democracia construída.

Em relação ao “triplex”, considero que Moro não agiu como recomenda o referido ordenamento e o TRF 4 confirmou, sinalizando que não parece ser jurídico o processo contra Lula, mas político, o que está em desacordo com a constitucional institucionalidade da tripartição dos poderes (Art. 2º). Se alguém Judiciário ou do Ministério Público quiser “fazer política” parlamentar ou executiva, que se candidate, pois se eleito será legítimo e justo!

 

Marcos Francisco Martins

Professor da UFSCar e pesquisador do CNPq

 

 

 




Carlos Carvalho Cavalheiro: 'O resultado da greve e a decisão do STF'

Carlos Carvalho Cavalheiro:

‘O resultado da greve e a decisão do STF’

Um balde de água fria. A decisão da 2ª Turma  do STF, proferida no último dia 25, que resultou na soltura do ex-ministro José Dirceu – condenado por corrupção pela operação Lava Jato – fez arrefecer os ânimos de quem acreditava que o Brasil ainda tinha jeito.

Não que a prisão de José Dirceu fosse por si só responsável pela “limpeza” da sujeira em que chafurdaram muitos dos nossos políticos. No entanto, pelas consequências que poderão advir dessa decisão, preocupa a todo cidadão decente deste país. Será que voltaremos a ver aquele mesmo final em que tudo acabava em pizza?

Afinal, sendo o entendimento do STF de que a prisão definitiva só é possível após a condenação em segunda instância, é de se pensar no precedente aberto para a soltura de tantos outros políticos presos pelo mesmo crime e que ainda não tiveram a confirmação de suas condenações em segunda instância. É o caso de Sérgio Cabral, de Eduardo Cunha e outros.

O que resta é o sentimento de impunidade, o de que o adágio popular está correto ao afirmar que a corda sempre arrebenta do lado mais fraco e que quem tem padrinho não morre pagão.

Paralelamente, não achando pouco, os nossos políticos aproveitam para votar as reformas da Previdência e a Trabalhista. Não se fala mais da reforma política e de que os Partidos não deveriam ser “sustentados” com a verba pública (colcha que nunca deu para cobrir por inteiro os gastos públicos). Nem se cogita uma reforma agrária, também.  Nem mesmo a reforma fiscal.

Para o Ministro da Justiça Osmar Serraglio, a greve do dia 28 de abril não teve sucesso e que tudo não passou de “uma greve das centrais [Sindicais] insatisfeitas com as restrições colocadas ao imposto deles”.

Não é verdade. A adesão de diversos movimentos sociais, não necessariamente de trabalhadores, à greve do dia 28 foi vista em diversas localidades. Em Sorocaba, por exemplo, os estudantes e também os movimentos LGBT e de juventude, como o Levante Popular, que nada ganham com o imposto sindical, estiveram presentes. Isso porque as propostas de “reformas” atingem a todas as pessoas que trabalham e geram a riqueza deste país. Riqueza esta que vem sendo dilapidada por políticos que sem nenhum pudor locupletam a custa do erário desviado, das negociatas, dos esquemas de corrupção.

Por isso, a decisão do Supremo Tribunal Federal, carrega consigo uma carga de insatisfação. O povo brasileiro que tinha alguma esperança de que os tempos eram outros, agora começa a duvidar. E animal acuado só encontra duas saídas: ou se entrega ao algoz ou parte para cima. Em nenhuma das hipóteses há alguma vantagem. Porém, quando o animal opta por lutar, não há quem possa impedi-lo depois.

 

 

Carlos Carvalho Cavalheiro

02.05.2017

 

 

 




Artigo de Maria Dolores Tucunduva: 'O Conceito de Justiça para Platão e Aristóteles'

Foto FacebookMaria Dolores Tucunduva – ‘O Conceito de Justiça para Platão e Aristóteles’

Introdução

No início de “A Justiça dos Antigos” são apresentadas algumas partes do primeiro e segundo livro de “A República”, de Platão, e do capítulo V do livro “Ética a Nicômaco”, de Aristóteles. No texto de Platão, criam-se duas indagações, em que uma trata da definição do justo e da justiça e a outra questiona se devemos e por que devemos ser justos. A obra, na integra, é dedicada a estas respostas, já que consiste na construção do modelo da “ótima república”. A obra de Aristóteles propõe uma classificação dos diferentes tipos de justiça e as formas à que se aplicam. A distinção feita é a justiça como respeito à lei e a justiça como igualdade. A justiça na distribuição de honras e ônus, de renda e status, é diferente da justiça como aprovação jurídica nos casos em que estão em pauta o dano e a vantagem. Isso, naturalmente, não apenas tem a ver com as distinções entre justiça distributiva, reguladora e comutativa, mas também concerne à complexa relação entre a estrutura da justiça e a virtude ética a ela correspondente. Na ideia do filósofo, a pesquisa sobre justiça deve informar “qual justo meio constitui a justiça e de que extremos o justo é o meio”.

1. A natureza do problema e as questões fundamentais

O sentido de toda a construção do Estado ideal indica abertamente que a comunidade política deve estar assentada na justiça. Se é correto afirmar que a República tenta responder à questão das razões que movem os homens a viver em sociedade, é preciso reconhecer que essa, própria de uma teoria social, se responde somente por meio uma teoria da justiça. Na República, põe-se declarado que a justiça é o componente fundamental do Estado ideal. A justiça é expressão da capacidade do Estado e é ela que assegura que o Estado seja bom e deve ser exercida por cada cidadão, no exercício de suas funções e de acordo com suas capacidades: trabalhadores e artesãos, mulheres e crianças, guerreiros e guardiões, governantes, educadores, filósofos e artistas. Considerando inclusive que a ideia de justiça é a possibilidade da razão na ordem do político, onde as partes constituem uma pura totalidade organizada de acordo com o bem da sociedade.

Grande parte do capítulo é explicada pela utilização de diálogos, retirados da obra de Platão. Em determinada altura da conversa, encontramos os locutores discutindo a relação existente entre a consideração do valor moral da justiça, tema a ser digladiado dentro da história da composição do direito, eis que não se pode confundir justiça com direito, porém pressupõe-se que essa está inclusa neste.

Sócrates possui uma visão idealista da justiça ao discutir com Trasímaco a noção da existência de uma justiça ideal, límpida, sem nenhum vício e, posteriormente, iria declarar uma justiça corrompida por vícios de injustiça. Trasímaco, em contraposição a Sócrates, clamava que justiça é a representação prática da mesma, voltada a realidade, e como se aplicava a sociedade vigente na época.

Trasímaco aparentemente se demonstra conveniente às ideias de Sócrates, porém, após certo tempo, revela estar concordando com ele somente para poder dissipar a discussão. O texto nos leva a acreditar na ideia de uma falsa justiça, pois, em pratica, a sabedoria e virtude elevada por Sócrates em definir justiça, se mostraram ausentes.

Em um segundo momento, Sócrates começa a discutir o conceito de justiça com Gláucon. Este inicia o diálogo propondo a existência de três tipos de bens: o primeiro seria aquele desejado por si mesmo; o segundo, desejado por si mesmo e por suas consequências e o terceiro somente por suas consequências. Daí em diante, o texto consiste em propor sobre em qual tipo a justiça se encontra. Para Sócrates, a justiça está no segundo; para Gláucon, no terceiro.

O oponente de Sócrates cita a lenda de Gyges, um pastor que encontra um cadáver, portando um anel peculiar. Quando coloca o anel no próprio dedo, esse o torna invisível. Sem ninguém capaz de ver suas ações, Gyges passa a praticar várias condutas amorais – seduz a rainha, mata o rei e rouba o trono do seu reino. Sobre isso, Gláucon diz que os homens não desejam a justiça, só a buscam para não serem punidos pelas leis que regulam seus atos.

Sócrates propõe que a justiça deve ser procurada como um bem a ser desejado, como sendo o certo a se buscar, por si mesmo, pelo desejo de realizar o bem. Essa seria a conduta correta a ser seguida. Em seu ideal, diz que a justiça deve ser igualada à aquela exclamada pelos poetas e artistas, como um bem supremo e de infinita beleza.

2. Os modos e os objetivos da justiça

Em “A ética de Nicômaco”, Aristóteles propõe uma indagação a respeito do que realmente significa ser justo ou injusto, bem como discorre sobre os diversos sentidos destes dois opostos e os objetos utilizados para a execução da justiça. Para o autor, o conceito de injustiça materializa-se tanto na figura do transgressor da lei, quanto na daquele que, por qualquer meio, obtêm vantagem de forma ilícita ou mesmo imoral, agindo assim de forma iniqua. Evidentemente em contraponto, existe a figura daquele cidadão virtuoso, respeitador das leis e mantenedor de elevados ideais de moral e ética, visando por meio desta o bem comum e personificando o conceito de justo.

A justiça, portanto, demonstra-se como uma certa forma de virtude perfeita e completa, pois pode servir assim não somente para si próprio, mas também em relação ao outro, sendo assim um bem alheio, dizendo respeito a toda sociedade e não somente ao indivíduo. Aristóteles descreve, de certa forma poeticamente, sobre esta característica como: “a mais importante das virtudes; nem a estrela da noite, nem aquela da manhã são tão admiráveis”. Sendo assim um bem alheio, visto que a justiça é posta como uma forma de virtude, por outro lado a injustiça é um vício, não somente parcial, mas completo, pois, assim como seu oposto, afeta todo o ciclo de convivência do indivíduo que a comete, prejudicando o convívio harmonioso em sociedade.

A justiça é alcançada a partir do momento em que agir de maneira ética se torna um hábito comportamental do sujeito que a pleiteia. O autor defende que agir compactamente de maneira ética é a “receita” para criação de um indivíduo virtuoso – ou seja, justo. A justiça seria dividida em dois métodos principais: a justiça geral e a justiça particular, sendo que esta possui ramificações.

Aristóteles compreendia justiça geral como sendo a pura e simples observação do cumprimento da legislação, por possuírem como objetivo o adimplemento do bem comum e da felicidade geral. É curioso interpretar que o termo “legislação” não compreende apenas a lei positiva, mas também a lei não escrita. Esta seria amplamente priorizada em detrimento daquela, na sociedade grega onde o filósofo se encontrava.

Por justiça particular, o filósofo definia como sendo aquela age com objetivo de igualar as partes envolvidas, subdividindo-se entre justiça distributiva – a simples repartição de bens, segundo o mérito de cada indivíduo – e justiça correlativa. Neste caso, surge a necessidade de envolvimento de um terceiro, alheio às partes, que deve decidir sobre o que cada um tem ou não direito, onde a figura do juiz ditaria o que é justo.

Conclusão

Justiça, sob a ótica dos antigos, possui conceituações diversas da que usualmente se impõe, em tempos modernos, mas as raízes desse pensamento são facilmente avistadas, quando analisadas profundamente. Platão, propondo a ideia de que a justiça é a base de todas as virtudes humanas, não implica que apenas os filósofos (detentores do conhecimento) seriam justos; pelo contrário, seguindo o princípio de “dar a cada um aquilo que lhe é próprio”, utilizado como conceito central da organização de sua república, o autor especifica que uma sociedade justa é aquela onde seus componentes trabalham conforme sua aptidão. Seguindo esse ideal, a própria sociedade, com indivíduos justos, formaria um Estado justo, demonstrando esse viés antropológico que a justiça possui.

A visão aristotélica também apresenta esse elemento antropológico, no sentido de definir o que é justo. A questão de justiça, em “Ética de Nicômaco”, é abordada como uma virtude estritamente humana, não se prendendo em aspectos meramente legais e positivos. Dessa maneira, para Aristóteles, ser justo é uma disposição de caráter e o sentido de justiça não pode ser simplesmente definido em uma terminologia específica.

Referências

 

MAFFETONE, S.; VECA, S. A justiça dos antigos. In: MAFFETONE, S.; VECA, S. A ideia de justiça de Platão a Rawls. 1 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 7-93.