O orgulho – Silêncio entre almas
Clayton Alexandre Zocarato: ‘O orgulho – Silêncio entre almas’


Há, no fundo de cada ser humano, uma centelha que se ergue como chama: o orgulho.
Ele nasce, por vezes, como defesa — um escudo contra as dores do mundo, um manto que nos protege da rejeição, da humilhação, do esquecimento.
Mas com o tempo, esse mesmo escudo pode se tornar armadura pesada, que nos isola, que transforma a palavra em silêncio e o afeto em pedra, um broquel medonho.
O orgulho é sutil. Ele veste a roupa da dignidade, caminha com a postura da razão, mas no espelho da alma, por vezes, revela apenas medo.
Medo de sermos pequenos.
Medo de pedir desculpas. Medo de admitir que erramos — e que precisamos uns dos outros para sermos inteiros.
Mas o orgulho cego… ah, esse cega não apenas a visão, mas o coração. Ele cala pedidos de perdão que nunca são ditos, afasta mãos estendidas e transforma o amor em disputa.
Veja os amigos que não se falam há anos, por causa de uma palavra atravessada, jamais retirada. Veja os pais e filhos, amantes e irmãos, afastados não por falta de afeto, mas por excesso de silêncio.
O orgulho, quando impera, cria muros onde poderia haver pontes. E esses muros, com o tempo, tornam-se mais altos do que a saudade consegue escalar.
Talvez o orgulho nos impeça justamente disso: de aceitar as imperfeições do outro, e também as nossas.
O orgulho, se não for domado, transforma a convivência em campo de batalha, onde ninguém vence, e todos saem feridos.
Mas quando tocado pela humildade, ele se transfigura: torna-se espelho que nos mostra quem somos, com nossas grandezas e fraquezas, e nos ensina a amar com mais verdade.
Onde Mora o Orgulho
Dizem que, quando o ser humano nasceu, o orgulho foi um dos primeiros a sussurrar em seu ouvido.
Não como inimigo, mas como promessa: “Você é único, insubstituível. Nunca se esqueça disso.” E o homem, encantado, acreditou.
Carregou essa voz consigo por séculos, sem notar que ela, aos poucos, deixava de ser luz e se tornava sombra.
O orgulho é sutil como o orvalho da madrugada. Às vezes é o que nos ergue depois de um tombo, o que nos dá voz quando o mundo quer calar.
Mas, em outras, é o que fecha a porta do quarto quando alguém bate pedindo perdão. É o que impede o abraço, mesmo quando o coração grita por ele.
Há quem viva décadas sem pedir desculpas. Não por falta de culpa, mas por excesso de armadura.
Como se admitir o erro fosse esfarelar a própria existência. Como se ser vulnerável fosse morrer um pouco.
E então vivem assim: ilhas cercadas de orgulho por todos os lados, onde ninguém mais aporta.
O velho Lao-Tsé, em sua sabedoria milenar, disse que “quem se exibe não brilha, e quem se vangloria não é respeitado.”
Mas o homem moderno, tomado de urgência e vaidade, esqueceu da simplicidade das coisas. Esqueceu da doçura que há em dizer “eu preciso de você”. Como se amor fosse fraqueza, e não força maior.
Na infância, éramos rios. Corríamos um para o outro sem medo. Caíamos, chorávamos, perdoávamos.
Mas com os anos vieram as pedras, os desentendimentos, os silêncios.
O orgulho construiu represas, e o rio secou em muitos corações.
Há pais que não veem os filhos há anos por causa de uma palavra atravessada. Há amores que dormem lado a lado, mas separados por muros invisíveis.
Tudo porque o orgulho se sentou à mesa e ninguém teve coragem de levantá-lo dali.
Mas há cura.
Ela se chama humildade — palavra antiga, quase esquecida, que vem de “húmus”, terra fértil.
Ser humilde é saber-se pó e sopro. É entender que crescer não é tornar-se maior que o outro, mas mais próximo. É descer do pedestal e caminhar lado a lado, com os pés na mesma estrada.
O orgulho grita. A humildade sussurra.
E é nesse sussurro que a alma finalmente encontra paz.




