Afinado com a tua ausência

Paulo Siuves: Poema ‘Afinado com a tua ausência’

Paulo Siuves
Paulo Siuves
Imagem criada por Ia do Bing – 20 de junho de 2025, às 06:46 PM

Hoje o mundo acordou em tom menor menor.
Uma daquelas manhãs em que até os passarinhos
parecem cantar olhando ressabiados.

Abri o violão.
As cordas já sabiam teu nome —
foi só encostar que elas responderam,
num lamento manso,
quase gratidão.

Você não veio.
Nem carta, nem sinal, nem vestígio.
Mas senta sempre à minha frente
quando eu toco sozinho.

E eu me toquei —
no silêncio do quarto,
na calma do gesto que sabe a ausência,
um murmúrio íntimo,
um sussurro entre dedos que procuram.

Ela sai, desliza —
fantasma tênue, sombra leve,
zombando da solidão que me habita,
rindo entre os véus do silêncio,
um adeus que nunca se entrega.

É estranho…
tem dias em que tua falta soa afinada.
Como se tua ausência
fosse mesmo parte da canção.

E eu sigo compondo.
Não pra ser ouvido.
Não pra te alcançar.
Só pra manter tua sombra
ensaiando passos no compasso da saudade.

Paulo Siuves

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Liberdade geométrica

Nilza Murakawa: Poema ‘Liberdade geométrica’

Nilza Murakawa
Nilza Murakawa
Imagem criada por IA no Bing – 17 de março de 2025, às 10:17 PM

Daqui de casa
Vejo o Sol nascer quadrado
Raios e ferros listrados
Bordados em ponto cruz

Lá em cima
Pipas coloridas, confusas
Driblam fios e linhas de vidro
Espiando de seus ninhos
Passarinhos desconfiados

No muro em frente
Rabiscos insistentes
Recados em códigos esquisitos
Tingem de negro e de cinismo
Toda aquarela do grafitismo

Deste lado da rua
Peões respingados da massa
Apressam os passos, sem graça
Domésticas arrumadas
Abraçadas com suas bolsas a tiracolo

Do outro lado
Em vidros semiabertos
Colarinhos engomados
Brincos e penteados
Voam blindados

Da esquina
O chope e as batatinhas
Mudaram-se para o quintal
Os guris de calças curtas?
Nem sinal!

No portão
Bem posicionados
Olhares eletrônicos
Nem só pela pizza esperam
Lavanderia, padaria
Pet shop, pedrarias
Manicure, pedicure
Jornal, revista semanal
Jontex®, calminex®
Buquês, marmitex®
E sapatos via sedex®

Meus pés sentem falta de gente…

Reféns de bichos
Minha história e a sua
Não são mais escritas
Com nossa tinta
Também não é mais redonda
Nossa lua

Meus olhos sentem falta do sol por inteiro…

Tem listras minha pele
Tem listras meu pijama

Nilza Murakawa

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Saudosismo daquelas gentes e pássaros

Ella Dominici: ‘Saudosismo daquelas gentes e pássaros’

Ella Dominici
Ella Dominici
Imagem gerada com IA do Bing ∙ 14 de setembro de 2024 às 3:12 PM
Imagem gerada com IA do Bing ∙ 14 de setembro de 2024
às 3:12 PM

Saudade tanta atingira os passarinhos
viram queimados outros, a fogo,
rastros deixados lembrariam atos
fúnebres
Àqueles que alçaram
lindo porte e cores, ou ainda cantigas das árvores amigas,
cotidianas sombras às galhardas danças ?

O que cantam estes olentes sentimentos
de saudades dos oboés em odes?
o que falta aos pequeninos emplumados
no sereno amanhecer,
marchando pisadelas em folhas de rasgos
do amarelo outonar do ser ?

“Saí-bicudo”
louvou em celeste hino norte à sul.

em caminhada sabiás aos longo
do retorno anunciado,
admiráveis cantores dizendo palavras versos
e algum grito nos leves estros

ao som de assobio afinado, fogem
do peito-pássaro-poeta-apaixonado,
deixando vozes de amor à vida em seu voo,

às altas virtudes enverga-se meigo ninho
ouvindo falas pios aos ventos mágicos,
passarinhas em seus mimos e carinhos

Constelando-se estrela erguida
que tudo lembrará à selva
no passado-pássaro-pensamento
passarinhando em Gonçalves,

Dias cintila asas de antes
e madrigais momentos galanteios,
Onde sonho, devaneio ido,
ainda gorjeia um chorinho:
Saudades!

Ella Dominici

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Canto do passaredo

Ella Dominici: Poema ‘Canto do passaredo’

Ella Dominici
Ella Dominici
"Da floresta ou da janela ouvem-se vozes que ecoam fortes ou de levinho… são amigos belos passarinhos"
“Da floresta ou da janela ouvem-se vozes que ecoam fortes ou de levinho… são amigos belos passarinhos”
Microsoft Bing – Imagem criada pelo Designer

O que canta o canto
da Santa natureza
do observatório do nosso âmago
voam dúvidas ou certezas
marsupiais ou singelezas?

Da floresta ou da janela
ouvem-se vozes que ecoam fortes
ou de levinho…
são amigos belos passarinhos

São desilusões de pássaros em gritos
ou desavenças formosas dos conflitos
queixas dos mais desavisados
frustrações juvenis dos mais infantos

Mistérios do canto
tem nele acalanto e paz infinita
ou roubam o encanto e desdita
na drástica sinfonia
que os ouvidos ouvem
e instigados se comovem
tal violência e tempestade
do impetuoso Bethoven.

O que cantam os pássaros
perderam na dança da conquista
no amoroso amatório?
sentem-se fogosos no canto aleatório
em nossas intuições
ouvimos bloqueadas sensações
desejos e paixões dos passarinhos
dor de saudades, falta nos ninhos

Mas seria …
quando um pássaros canta
vivente nele a alegria de Mozart
conta a sua glória de existir
nas tempestades resistir?
chama a fêmea que lhe falta
no seu tilintar e olente elixir?

Quando um pássaro canta
seriam suaves preces
deixadas no oratório
dos pássaros celestes?
perpetua-se o canto da realeza
simples pássaros…
da Santa Natureza

Ella Dominici

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Nossos passarinhos

Evani Rocha: Crônica ‘Nossos passarinhos’

Evani Rocha
Evani Rocha
Nossos passarinhos
Microsoft Bing – Imagem criada pelo Designer

Os filhos são como passarinhos. Construímos o ninho para recebê-los, com todo carinho. E eles chegam pequenos, frágeis e dependentes. São como uma joia rara que caiu no nosso mundo! Aplaudimos a cada conquista deles, festejamos o nascer de cada ‘peninha’, os primeiros dentinhos, os passinhos, as primeiras palavras. Nos encantamos profundamente com sua energia e sua capacidade também de nos esgotar.

Há momentos difíceis que precisamos de ajuda. Mas há momentos lindamente gratificantes. E eles vão crescendo ocupando espaço em casa: O seu quarto, seu lugar à mesa…a casa fica cheia, barulhenta e iluminada. Os finais de semana são sempre alegres. Os passeios de férias, as brincadeiras na rua, a vida estudantil. Precisamos ensinar nossos passarinhos a sobreviver a sós. Esse é o início de uma angústia. Falar dos perigos do mundo, ensinar valores e responsabilidade em tenra idade. Mas já estão crescidinhos e querem voar. Precisamos treiná-los antes!

A adolescência é confusa para eles. Um turbilhão de emoções que ainda não conseguem entender. E para nós também é difícil lidar com seus conflitos, pois é uma fase que geralmente eles se fecham. É preciso achar a chave certa para o diálogo. Nossos passarinhos pensam que sabem tudo, porém, ainda não conhecem os ‘gaviões’. Estes são as armadilhas que eles vão precisar identificar ao longo de toda sua vida. Cabe a nós somente orienta-los. Estão adultos e querem explorar lá fora.

A casa é grande, e vai ficar maior ainda com sua partida. Aquela angústia no peito e insegurança tendem a crescer também…

Nossos passarinhos já adquiriram maturidade, talvez ainda insuficiente para nós. Mas eles precisam viver por conta. Sabíamos que esse dia chegaria, talvez não pensávamos que doía tanto vê-los se afastar do ninho…a cada dia dão um voo mais longe! Ficamos à porta a rezar por eles, porque para nós, pais, parece que eles sempre serão crianças. E a gente quer ‘arrumar o lanche da viagem’, como arrumávamos a lancheira no jardim de infância…queremos pôr o agasalho na mochila, a escova de dentes…

“Não precisa mãe! Eu já arrumei”. Talvez caia a ‘ficha’. Eles já sabem se virar. Assim eles vão saindo aos poucos do ninho, ou alguns vão de uma vez. E nós voltamos à solitude de nossa essência. Precisamos entender que é assim o ciclo da vida. Um dia, no passado, nós também fomos embora. Fizemos aquele voo rasante, entusiasmados, olhando o mundo de cima. Acreditando que sabíamos de tudo. E como aprendemos na vida, desde aquele voo.

Agora ficamos a pensar em nossos passarinhos. Sabemos que irão enfrentar tempestades e furacões, porém, irão sobreviver. E a cada dificuldade se tornarão mais fortes. Não podemos viver as suas vidas. Mas desejamos que a deles sejam sempre melhores que as nossas. Então, eles voaram. Ficamos a andar nos corredores, visitamos seus quartos…fazemos questão de mantê-los arrumados, para quando vierem nos visitar. Pode acreditar, eles virão bem menos do que gostaríamos. Paramos às vezes no quintal, como se ainda ouvíssemos a algazarra da correria na rua, brincando de ‘pega-pega’, ou em outro momento quase respondemos a um chamado de nossa mente, como se um deles solicitasse a nossa presença.

Ah! As fotos, já conhecemos os mínimos detalhes, pois não cansaremos de olhar. Agora há espaço demais, silêncio demais e saudade demais! O que nos resta é continuar torcendo pelo seu futuro. Que cresçam e vençam e construam suas famílias, suas carreiras profissionais. Passarinhos nascem para voar, conquistar os céus, serem livres e felizes. Não existe gaiola onde há amor.

Evani Rocha

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