Ouvindo estrelas
Seus olhos eram azuis da cor do mar. Chegou de mansinho à clínica parecia não se importar com que acontecia ao seu redor. Sem expressão no olhar, parecia distante e trazia debaixo dos braços alguma coisa enrolada a qual chamou-me a atenção e fui logo perguntando:
E – Hei! Tudo ok?
E – Qual seu nome?
R – Rômulo
E – O que traz aí?
R – A minha tela. Eu pinto!
E – Parabéns! Posso ver?
E, como se estivesse expondo um troféu , deu um sorriso e esticou a tela à frente para que eu visse. Sem ter muito conhecimento a respeito da arte, fiquei um tanto surpresa ao ver, mas a elogiei.
A pintura continha muitos traçados. As cores eram forte, ressaltando o preto e o vermelho . No centro o rosto de uma figura humana deformada. Seria precoce da minha parte fazer um pré-diagnóstico, todavia o contexto me levava a um quadro típico de uma pessoa com transtorno mental com características de esquizofrenia. Posteriormente, fui informar- me sobre o seu histórico (prontuário) e estava com a razão, provavelmente as drogas teriam danificado ainda mais a sua saúde mental. A dependência química é uma comorbidade bastante comum em pacientes com diagnósticos de esquizofrenia.
A esquizofrenia é uma doença psiquiátrica, que se caracteriza pela perda do contato com a realidade. Há vários tipos da patologia. Nas últimas décadas houve um grande avanço nos estudos da patologia. Os medicamentos para controle da doença são bastante eficazes aos assim chamados “sintomas positivos” (delírios e alucinações ).
Rômulo foi transferido de clínica, depois de um mês em decorrência do agravamento de alguns comportamentos. Ele gostava da noite enluarada e dizia “ouvir as estrelas”.
Eliana Hoenhe Pereira
eliana.hoenhe1@hotmail.com
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