Quando o amor chegou
Era noite, e noite chuvosa. As trovoadas me atordoavam. A energia acabou. Tudo estava muito escuro. Naquele breu, unido ao medo que me invadia, nem consegui encontrar meus protetores de ouvido.
Inverno, e gélido; os campos brancos. Minhas unhas arroxeadas, a pele ressequida, lábios desidratados e feridos. Nem a multidão dos cobertores me aquecia. Litros e litros de café e chás saborizados também não. Era tudo em vão.
Cheguei na janela, ninguém na rua. Pico montanhoso, lugar ermo; o mato crescendo ao redor, como uma grande cerca verde isolando-me de tudo.
Um dia, ouvi minha porta bater; quem seria, naquele fim de mundo? Eu tive medo de abrir. Bateram novamente, me calei. Finalmente, desistiram e foram embora.
O céu sempre nublado, da cor da minha solidão. Aquela sopa insossa, meu paladar sem prazer. Eu já não me importava com as teias de aranha que surgiam no teto e com as traças em minhas paredes.
Passou o mês, novamente aquele toc-toc; eu não compreendia. Era o mesmo som. Quem insistiria em bater à minha porta? Seria um assaltante? Um estuprador? Alguém que se aproveitava do lugar desértico em que eu vivia a fim de me causar mal? Algum pedinte pedindo abrigo?
Eu me aproximei da porta. Minhas mãos suavam frio, meu corpo trêmulo. Lá fora, alguém querendo entrar, bastando a minha permissão. Toquei na fechadura, virei a chave.
Abri a porta. Aquele brilho ofuscou-me os olhos. Após muito tempo, vi o sol. O céu, de uma hora para outra, azulou-se. As nuvens se dissiparam. Que magia era aquela?
Minhas mãos se aqueceram, tirei meu casaco. O calor invadiu a frieza do meu ser. Um meio-sorriso se abria timidamente em minha face e a palidez dando lugar a uma discreta morenice.
Eu vi flores. De todas as cores. Como assim? Se eu nem ao menos havia visto os seus botões…
Naquele silêncio em que eu vivia, de repente ouvi o som dos pássaros. Que mistério era aquele que me fez dormir inverno e acordar plena primavera?
Frutas nos pés me devolviam o doce sabor.
Meus lábios hidrataram-se com os molhados beijos desse que chegou sem que eu esperasse; desse que bateu à minha porta e que eu muitas vezes por medo deixei de abrir.
Tudo isso me aconteceu quando o amor chegou.
Claudia Lundgren
tiaclaudia05@gmail.com
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Claudia Lundgren, natural de Teresópolis (RJ), é poetisa, escritora e Educadora Infantil. É Acadêmica da ACILBRAS, da AIL e da FEBACLA; é Acadêmica Correspondente da Academia Caxambuense de Letras e da Academia de Letras de Teófilo Otoni, e Membro Efetivo da Sociedade Brasileira dos Poetas Aldravianistas (SBPA). Também pertence à ALB e a ABC, ambas virtuais. Recebeu Menção Honrosa no I Concurso de Poesia Junina e obteve o 9º lugar no XXXIV Concurso de Poesia Brasil dos Reis, (Ateneu Angrense de Letras e Artes). Foi homenageada com a Comenda Acadêmica Láurea Qualidade Ouro, a mais alta comenda da FEBACLA – Federação Brasileira dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes e com o Prêmio Cidade São Pedro de Aldeia de Literatura. Participou de dezenas de Antologias Poéticas. No início de 2019 lançou seu primeiro livro solo, ‘Alma de Poeta’ (Editora Areia Dourada), que recebeu o Troféu Monteiro Lobato como o melhor livro de poesia, no evento ‘Melhores do ano 2019’ (LITERARTE), e recentemente, lançou seu segundo , ‘Simplesmente Poemas’, com o selo AIL.