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Letícia Mariana: 'Língua Portuguesa versus redes sociais: “E agora, José?”'

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Letícia Mariana

Língua Portuguesa versus redes sociais: “E agora, José?”

Surgiu uma conversa no jantar em família: o avanço da Língua Portuguesa. Duas escritoras na conversa, lado a lado, e uma não escritora diz a seguinte frase: O português precisa mudar!

Como assim? Ele está em constante evolução; se não estivesse, não existiria o novo acordo ortográfico. E mesmo assim, seria necessário mudar o que já está bom?

A moça reclama da dificuldade que é escrever. Antes era “vosmecê”, dizia com fervor para completar seu argumento. “Ninguém mais escreve ‘você'”-  ela continua. Por que, então, não adotar o “vc”?

Eu me recuso! – disse. Não pretendo escrever nas minhas colunas como se fosse falar no “zápzáp”, aliás, nem na internet eu uso abreviações! Mas até que o debate era interessante. Afinal, será que num futuro não tão distante as redações do ENEM serão abreviadas e os livros enfeitados de internetês? Não posso crer! Não quero viver para isso, mas a lógica diz que viverei – apesar da alma velha – eu tenho vinte e um anos.

O assunto familiar me recorda o colégio. Lendo Drummond na sala de aula, fulana me chama de nerd. Pergunta se eu entendia alguma coisa, e é claro que eu entendia! Ela enfatizou: alguma coisa. Não disse tudo, entendam. Eu tinha quatorze anos, caramba. Mas não era burra, e gostava de ler tudo que era difícil de entender. Qual era a graça de devorar “Crepúsculo”? Não era tão divertido quanto a “pedra no caminho”; nunca me esquecerei deste acontecimento, das retinas fatigadas, pois, ter quatorze anos e compreender vampiros é fácil, mas o inusitado é tentar aprender poemas para, então, escrevê-los. Não me arrependo, sou poetisa! E cada anotação que eu fazia me ajudou no processo.

“Letícia, quem escreveu ‘A Moreninha?'” – perguntou a menina com calça rasgada, enquanto segurava um celular da última geração. Eu, prontamente, disse: Joaquim Manuel de Macedo! – será que ela queria ler? Não. Era simplesmente para ganhar uma partida de um jogo online. Até que veio uma outra – jogando a mesma coisa – e perguntou: “Letícia, vem cá! Quem escreveu Dom Casmurro?”. Respondi que foi Machado de Assis, e completei: Vocês adoram implicar comigo, mas na hora que precisam, sempre me chamam, não é?

Como seria uma conversa no WhatsApp de Joaquim Manuel de Macedo? “Eu fundei o romance, o pai tá on? Nunca saberemos. Machado de Assis certamente compartilharia memes depressivos, e contaria suas memórias póstumas. “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas, e segue uma música de Lana del Rey.” Imagina?

“E agora, José?”. Eu era uma adolescente estranha, e só pensava em terminar de escrever o meu primeiro livro. Minha ideia era finalizar aos dezessete anos, e eu consegui. Entretanto, não foi uma tarefa fácil.

Fulana dizia que eu deveria sair mais. Beber, me aventurar, aproveitar a adolescência. E quem disse que eu não aproveitava? Insistia que eu vivia para o futuro, e que nem sabia se conseguiria lançar o tal livro. Que escrever no intervalo me fazia parecer uma alienígena ou uma quarentona, porque não existe escritor jovem. Alguém já viu um escritor de dezoito anos? Pergunta a garota. Não existe, não se iluda. Vamos sair, vamos beber, vamos aproveitar!

Para quem acredita em astrologia: eu sou taurina, e tenho mais cinco planetas em touro. Teimosia em pessoa, persistência, ideais firmes, essa é Letícia Mariana. Não quero beber, não quero sair, eu preciso terminar de escrever esse livro!

Hoje eu estou aqui, escrevendo para vocês. E agora eu sei que, sim, até que eles tinham razão. São raros os escritores da minha idade, e eu me orgulho disso. E se eu tivesse aceitado beber naquela noite? Talvez eu tivesse amigos, mas não teria meu sonho realizado.

Os jovens são engraçados, não são? Depois de tanto conviver com pessoas mais velhas, confesso que esqueço como é ter a minha idade. É claro que é muito mais cômodo usar “pq” e “vc” nas redes, famosa “síndrome de Twitter”. Mas “e agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou.”. O futuro é nosso, e eu espero que a Língua Portuguesa tenha um destino menos jovial.

Eu sou, oficialmente, cringe antes do tempo.

 

Letícia Mariana

leticiamariana2017@gmail.com

 

 

Leticia Mariana
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