O cipó encantado
Raimundo Coleta era um acreano alto e bem apresentado, seringueiro que acordava sempre com o canto do galo, como era comum ao seringueiro-mateiro que morava no Acre lá pelos primórdios de 1954. Depois de lavar a cara no jirau, aprontou o quebra-jejum: pão de arroz com café e farofa de Jabá; depois de comer, colocou o que sobrou numa lata de leite seca e ajumentou para a estrada de seringa. No peito, uma grande esperança de ganhar muito dinheiro para realizar seu grande sonho: casar-se com Nazinha, uma cabocla novinha, bonita e braba feito a Gota Serena; mas isso não espantava Raimundo não, pois ele sempre dizia: ‘Gosto é de muié braba mermo!’. Até tinha um gostinho melhor essa conquista! Raimundo tinha fama de ser cabra conquistador por aquelas bandas. Tudo que era mulher que morava próxima ao Seringal Vai Quem Quer ele já havia tentado conquistar.
Nesse dia, saiu um pouco cabreiro; assim que entrou na mata ainda no aceiro de casa já ouviu o piar da Rasga Mortalha. Logo pensou com seus botões e danou-se a falar sozinho enquanto andava dentro da mata:
– Será que vou morrer? Ouvi o ‘piar da mardita’ ainda de manhã cedo! É muito azar!
E logo embrenhou-se na floresta. Meio espantado com o piado que ouviu, Raimundo assustava-se ao menor ruído de galho seco caindo, ou com o barulho de algum macaco pulando nas árvores. Ia colocando as tijelinhas nas seringueiras, mas sempre com um olhar no padre outro na missa, muito desconfiado de que aquele não era o seu dia de sorte. Após algumas horas, Raimundo chegou na primeira árvore do dia e então teve certeza que descobriu qual o azar ao qual estava predestinado! Esteve andando em círculos! Arrodiando sem parar. Logo aperreou-se, pois sabia que passara debaixo do Cipó Encantado, agora sua sorte estava lançada! Ficaria para sempre rodando até cair morto ou ser pego por alguma onça pintada faminta. Olhou com cuidado nas redondezas, esperava enxergar o tal maldito cipó. Mas nada viu. Até porque esse danado ninguém consegue ver, por ser encantado lógico! Depois de várias tentativas de achar o caminho de volta, Raimundo sentou-se num tronco caído. Estava cansado, suado, com fome, aturdido e assombrado!
– Lascou-se veia do doce! Vou morrer mermo! – pensou.
O pouco saldo que havia juntado no barracão ficaria para sua velha mãe. Nazinha de certo agora casaria com outro. Não. Isso não poderia acontecer! Tudo menos isso. Então lembrou: Ia se valer de Santa Luzia, pois essa sim, nunca falhou com ele. E fez a tal promessa. Para ele um grande compromisso.
Convencido de que agora acharia o caminho de volta Raimundo se embrenhou na mata, entremeando a ruma de árvore, a procura da saída de volta para casa. Já estava ficando triste de novo quando de longe avistou sua casa.
– E não é que deu certo!? Obrigada Santa Luzia! Vou pagar minha promessa, juro!
Com certeza iria pagar a promessa que fizera naquele momento de aflição. Nunca mais trabalharia nesse dia santo! Essa fora a sua grande promessa. E assim foi feito.
Maze Oliver
mazeoliver1@gmail.com
- Florão da América - 18 de maio de 2024
- Eliana Hoenhe Pereira: 'No silêncio da rua' - 16 de maio de 2023
- Márcia Nàscimento: 'O cérebro e sua interação com o sistema mental' - 25 de abril de 2023
Natural de Teresópolis (RJ), é poetisa, escritora e Educadora Infantil. É Acadêmica da ACILBRAS, da AIL e da FEBACLA; é Acadêmica Correspondente da Academia Caxambuense de Letras e da Academia de Letras de Teófilo Otoni, e Membro Efetivo da Sociedade Brasileira dos Poetas Aldravianistas (SBPA). Também pertence à ALB e a ABC, ambas virtuais. Recebeu Menção Honrosa no I Concurso de Poesia Junina e obteve o 9º lugar no XXXIV Concurso de Poesia Brasil dos Reis, (Ateneu Angrense de Letras e Artes). Foi homenageada com a Comenda Acadêmica Láurea Qualidade Ouro, a mais alta comenda da FEBACLA – Federação Brasileira dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes e com o Prêmio Cidade São Pedro de Aldeia de Literatura. Participou de dezenas de Antologias Poéticas. No início de 2019 lançou seu primeiro livro solo, ‘Alma de Poeta’ (Editora Areia Dourada), que recebeu o Troféu Monteiro Lobato como o melhor livro de poesia, no evento ‘Melhores do ano 2019’ (LITERARTE), e recentemente, lançou seu segundo , ‘Simplesmente Poemas’, com o selo AIL.