Demétrio Magnoli, um dos raros articulistas da grande imprensa que ainda merece ser lido pelos que perseguem lampejos de vida inteligente, faz uma análise exemplar do dilema brasileiro atual:
- tudo leva a crer que Lula mereça mesmo ser condenado pelo conjunto da obra (e que deveria é estar sendo, mais do que ninguém, repudiado pela esquerda, pois jamais houve tamanha promiscuidade de um partido dito progressista com o grande capital como durante seu reinado!);
- mas, o processo por corrupção que, em termos de timing, poderia alijá-lo do próximo pleito é o mais discutível dos seis a que Lula responde.
Assim como outros jornalistas que não morrem de amores por Lula, Magnoli é contra uma decisão conveniente ao invés de uma decisão juridicamente consistente. De casuísmo em casuísmo, este país está levando a breca.
Não considero que, se Lula puder concorrer, sua vitória seja favas contadas. Muita água ainda vai rolar debaixo da ponte até outubro. Basta, p. ex., haver uma melhora econômica significativa (ainda que seja de fôlego curto, fadada a dissipar-se adiante) no 2º semestre de 2018 para os humores do povo mudarem, como tantas vezes já aconteceu no Brasil.
Rendição incondicional ao inimigo |
Mas, é à esquerda que me dirijo, pois é a ela que pertenço e o que realmente me importa são as aflições e agruras dos explorados.
O PT já dava nítidas mostras de esgotamento durante a campanha presidencial de 2014. Nada tinha a propor que trouxesse esperanças ao povo e o impelisse a mobilizar-se para lutar por seus direitos. Apenas satanizava os adversários e até mentia sobre as intenções dos mesmos. Foi com uma pregação eminentemente negativa que conquistou sua vitória de Pirro.
Por absoluta falta de ideias, o que fez, no quarto mandato, foi render-se incondicionalmente à pauta econômica do inimigo: entregou o comando da economia a um neoliberal. E nem com um tranco desses o carro pegou…
Era a degringola econômica o motor do impeachment. E Dilma não tinha, em 2016, uma mísera proposta a apresentar ao povo, no sentido de tirar a economia brasileira da marcha para o abismo. Nada!
Foi este o principal motivo do seu defenestramento por meio de um piparote parlamentar, tendo a narrativa do golpe servido apenas para que os culpados por inação no auge da crise e pelo abandono do povo sofrido à própria sorte se eximissem de suas enormes responsabilidades.
Ora, se tudo der certo para os derrotados de 2016 e eles voltarem o poder unicamente graças ao carisma do Lula como pai dos pobres e ao voto anti-Temer, o que acontecerá? Apenas a tentativa de restabelecerem a conciliação de classes num momento muito mais radicalizado da crise capitalista. Lula não é, nem nunca foi, um revolucionário; e a fase histórica do reformismo está definitivamente encerrada no Brasil.
“Lula não é, nem nunca foi, um revolucionário” |
Haveria, portanto, o empenho em anular tudo o que Temer fez, sem terem o que colocar no lugar, pois sob o capitalismo e a democracia burguesa o cobertor nunca mais será suficiente para nos cobrir do pescoço aos pés.
A única opção possível é a superação do capitalismo e a reorganização da sociedade tendo como prioridade o bem comum e não o lucro. Mas é exatamente aonde o PT não quer chegar e é justamente para cumprir esta missão histórica que o Lula não serviria nem a pau, Juvenal!
Que os companheiros ainda movidos por ideais (e não interesses) ponham a mão na consciência e se indaguem: vale a pena insistir em estratégias e posturas anacrônicas, tão somente para vencer uma eleição que não nos levará à posse do poder efetivo nem nos vai dar meios para sustentar a posição conquistada nas urnas caso o poder econômico decida novamente encerrar o jogo e levar a bola para casa? Ou é hora de reposicionarmos a esquerda e organizarmos o povo para conquistas muito maiores?
O Brasil está prenhe de uma revolução. Mas, ela só acontecerá se dermos os passos certos em sua direção. E não é com Lula que faremos tal caminhada.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.