novembro 22, 2024
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Celso Lungaretti: 'A esquerda que reluta em fazer um balanço da derrota de 2016 é candidata a repetir os mesmíssimos erros adiante'

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Celso Lungaretti: ‘SEM AUTOCRÍTICA E SEM UMA MUDANÇA RADICAL DE
POSTURAS, A ESQUERDA MARCHA PARA A IRRELEVÂNCIA’

Um artigo que consegue dizer algo novo sobre a novela do golpe (assim se intitula, por sinal) é o do jornalista e bacharel em filosofia Hélio Schwartsman, publicado nesta 3ª feira (13) pela Folha de S. Paulo.

Seu ponto de partida é o de que, para quem considera golpe uma ruptura da ordem constitucional, o impeachment foi legítimo, já que se aplicaram todas as regras definidas na chamada Carta Magna, seguindo a orientação do juiz natural do caso (o STF).

Então, como explicar que comecem a proliferar no meio acadêmico cursos denominados O Golpe de 2016? Schwartsman propõe que a nova onda seja analisada a partir do modelo da cognição cultural de Dan Kahan, um professor de Yale que propõe novos enfoques para o direito e a psicologia:

…na esfera pública, crenças às vezes se tornam símbolo de causas e, a partir daí, as pessoas irão afirmar ou negar essas teses não para dizer o que sabem sobre o assunto, mas para mostrar de que lado estão.

Então, mesmo quem tem miolos suficientes para saber que não houve nenhum golpe de Estado pode ser levado a repetir mecanicamente tal ladainha, apenas por faltar-lhe têmpera para navegar contra a corrente. Os lobos solitários são cada vez mais raros, enquanto há uma imensidão de Marias indo com as outras, incapazes de se fazerem valer por si só e sempre  prontas para corroborarem os maiores absurdos a fim de não serem expelidas do rebanho.

Se fosse um mero jus sperniandi, não valeria nem a pena nem eu estar escrevendo estas linhas. Afinal, os fortes encaram as derrotas de frente e delas extraem ânimo combativo para lutarem melhor na vez seguinte, enquanto os fracos precisam de ilusões reconfortantes que lhes sirvam de desculpa para continuarem sendo exatamente… fracos!

Mas há um porém: tudo de que a esquerda brasileira não precisa é continuar sendo fraca como o se mostra neste instante, pois marcha a olhos vistos para a irrelevância.

Aceitando-se as mirabolantes teorias conspiratórias sobre a derrubada de Dilma Rousseff, seria possível desculpar-se o partido que vem desde 2003 desmobilizando os explorados e apostando todas as suas fichas na conquista de espaços no Executivo e Legislativo sob a democracia burguesa.

Mas, se considerarmos o resultado das votações que selaram a sorte de Dilma no Congresso Nacional como consequência óbvia da prevalência do poder econômico nas grandes decisões da democracia burguesa, teremos de refletir sobre se valem ou não a pena tantos esforços para elegermos presidentes da República que, ou fazem o que o mercado deles espera e não passam de fantoches, ou desagradam ao mercado e são mandados para casa mediante um mero piparote parlamentar.

E se o poder que realmente manda não é o advindo das urnas, mas sim das imensas fortunas acumuladas pelos privilegiados de um dos países mais desiguais da face da Terra, fica evidenciado que o PT pisou feio na bola ao reduzir progressivamente seus esforços na organização dos explorados para as lutas da sociedade.

Como consequência, não conseguiu estruturar nenhuma resistência digna deste nome ao afastamento da Dilma, não foi capaz de mobilizar o povo contra o Governo Temer quando seu destino dependia de votações nla Câmara Federal e, pelo que se viu até agora, nada indica que fará coisa melhor caso Lula venha a ser preso, apesar dos blefes e bravatas da Gleisi Hoffmann.

Então, a exigência de uma autocrítica do PT, pelo menos por parte de esquerdistas como eu, sempre foi no sentido de se repensarem as políticas e posturas que, em 2016, se comprovaram totalmente equivocadas e desastrosas.

Nos anos seguintes a 1964, os erros cometidos pelo PCB foram intensamente discutidos dentro e fora do partido, com várias de suas principais lideranças saindo para formar outros agrupamentos ou transferirem-se para os que já existiam.

O desempenho pífio no período que antecedeu o golpe (aquele, sim, um característico e indiscutível golpe de Estado, com tanques nas ruas e quebra da ordem constitucional!) e sua oposição, beirando a sabotagem, à guinada para a luta armada fizeram com que, de força hegemônica da esquerda, o PCB se tornasse um mero coadjuvante do processo histórico, com influência cada vez menor.

O PT, até agora, está conseguindo adiar sua hora da verdade exatamente graças à narrativa do golpe, que superestima desmedidamente a força do inimigo, como se Dilma tivesse sido defenestrada por um titã e não por um punhado de liliputianos.

E quão humilhante é lembrar sua saída resignada do poder! Ainda mais tendo em mente que Allende preferiu morrer com uma metralhadora na mão a aceitar a oferta de Pinochet, que colocou um avião à sua disposição para deixar o Chile rumo ao país que escolhesse, levando junto quantos de seus colaboradores coubessem no voo!

Seriam bem melhor se estivéssemos há dois anos repassando minuciosamente as causas de uma derrocada tão acachapante para extrair lições, modificar linha política, avaliar atuações pessoais e renovar o quadro de dirigentes com vistas aos desafios de uma nova fase.

O represamento de tal processo apenas está fazendo os cidadãos com espírito crítico se desiludirem da política, já que nem mesmo a esquerda tem algo de novo a lhes oferecer. E o mais do mesmo, hoje, tem sabor de incompetência e de impotência.

Acima de tudo, temos de construir uma esquerda capaz de ir engendrando, pouco a pouco, uma alternativa ao capitalismo. Ao invés disto, procuramos sofregamente um candidato que possa, substituindo o Lula no caso de sua quase certa exclusão da disputa, dar uma volta por cima eleitoral já no próximo pleito.

Só que, exatamente por não termos feito a autocrítica dos erros (imensos!) cometidos durante os governos petistas, mesmo uma improvável vitória nada nos traria a não ser a perspectiva de recomeçarmos a cometê-los um por um, até chegarmos ao mesmíssimo desfecho.

Helio Rubens
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