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Patrícia Alvarenga: 'O último domingo cinzento'

Patrícia Alvarenga

O último domingo cinzento

Ângela acordou assim: sonâmbula, zumbi, ainda sob o efeito dos calmantes que tomara de madrugada, após perceber que teria mais uma noite insone, se não ingerisse aquelas pílulas. Lançada às traças do tempo frio, naquele domingo de inverno, na cidade de São Paulo, sentia-se só. Muito só. Ainda não havia se recuperado da recente separação de Paulo.

A forte chuva batia em sua janela, respingando com toda a fúria. Como a fúria que sentia internamente. Sentia pena de si mesmo e odiava-se por isso. Era uma mulher de meia idade, muito inteligente, bonita e interessante. Não entendia a razão de ter sido “abandonada” por seu parceiro. Aliás, “que termo mais antiquado!”, refletira. “Abandonada?” A gente abandona coisas, não pessoas.

Observava, pela janela, a paisagem sombria, velada pelas nuvens cinzentas. Não tinha ânimo para sair da cama. Ali, sentia-se acolhida, como em um ninho. O silêncio do amplo apartamento só era cortado, de vez em quando, pelos trovões. “Que dia horrível”! Pensava… O domingo externava seu humor.

Arrastou-se da cama e foi até o banheiro. O que viu no reflexo do espelho era um espectro da mulher tão vivaz e radiante de poucas semanas atrás. Olheiras profundas, pálida, cabelos desgrenhados. Também perdera alguns quilos e tinha um olhar embaçado. Ponderou profundamente: “era assim que iria passar o resto de seus dias?”; “lamentaria a partida de Paulo eternamente?”.

Então, num ímpeto, juntou suas últimas forças – aquelas guardadas numa caixinha secreta em algum lugar de nossas cabeças – e ligou o celular. Mas, desta vez, não procurou por recados do ex-companheiro. Buscou por páginas de turismo. Decidiu que novos ares talvez ajudassem. Acabou alugando uma casa, num condomínio, na Serra da Mantiqueira, numa cidade silenciosa e tranquila. Natureza! Era disso de que precisava!

Assim, mesmo se arrastando, pegou seu notebook – para o trabalho remoto – um agasalho, roupas confortáveis, alguns livros e montou uma pequena bolsa com material de higiene. Partiu no dia seguinte, em seu próprio automóvel. Dirigiu a manhã toda. Ao chegar, comeu biscoitos que levara de casa e um suco de caixinha, leu alguns capítulos de um livro e acabou adormecendo no fim da tarde – sem medicamentos. Só acordou no dia seguinte. E seu humor já estava um pouco melhor. Decidiu dar uma caminhada e acabou tomando café numa padaria, a cerca de 2 km do condomínio. Voltava a sentir fome. Voltava a se levantar cedo. Voltava a querer viver.

Sabia, em seu íntimo que, provavelmente, aquela não seria a última decepção de sua vida. Todavia, decidira retomar as rédeas de sua existência. Afinal, o maior sentimento que deve existir é o amor-próprio. E até considerou que Paulo também não era “aquilo tudo” que imaginava. Foi ótimo enquanto durou. Mas foi uma fase. Guardaria as boas lembranças e seguiria em frente. Livre, leve, mais madura e com um caderno cheio de páginas em branco para escrever uma nova história.

 

Patrícia Alvarenga

patydany@hotmail.com

Patricia Danielle de Ataíde Alvarenga
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