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Marcus Hemerly: 'Martin Scorsese: uma câmera, um olhar'

Marcus Hemerly

Martin Scorsese: uma câmera, um olhar

No dia 17 de novembro, aniversariou uma ilustre lenda viva do cinema, o diretor nova-iorquino Martin Scorsese, que revolucionou a sétima arte, estimulando e inspirando inúmeros diretores desde os anos 70. Injustamente, Scorsese foi por muito tempo rotulado como especialista em fazer filmes sobre o submundo do crime organizado, nicho por ele muito bem conhecido, dada sua criação nos bairros italianos de Nova York. Contudo, nem só de armas fumegantes e diálogos de wiseguys vive o seu cinema; musicais como “New York, New York” e o sensível “Kundum”, sobre a vida do 14º Dalai Lama, são recorrentemente citados como produções cult. Dramas, tensões psicológicas e humanas marcam sua rica filmografia.

Impossível esquecer do delirante taxista Travis Bickle em Taxi Driver (1976), e seu ódio insurgente contra a sociedade e as instituições organizadas. A frase famosa do personagem principal seria reprisada e parodiada pelas décadas seguintes, quando Travis fala consigo mesmo diante do espelho “Are you talking to me? (você está falando comigo?), traduzindo uma dinâmica gradual sobre a escalada da insânia.

Nesta mesma esteira, o bem montado “Touro Indomável,” cinebiografia do pugilista Jake LaMotta será sempre exaltado como o veículo de uma das melhores interpretações da história. Nos anos 90, a parceria Scorsese e De Niro produziria calafrios aos espectadores com o tenso e impressionante “Cabo do Medo” remake do clássico da década de 60, “Círculo do Medo”, protagonizado por Gregory Peck, como o advogado alvo da vingança maligna do psicopata Max Cady.

Uma seleção de ótimas películas seguiria até os anos 2000, quando Scorsese receberia seu primeiro Oscar na categoria melhor direção, pelo filme “Os Infiltrados” de 2006. Com o lançamento de “O Irlandês”, disponível na Netflix, rememora-se os grandes filmes do diretor de “Os Bons Companheiros” e “Cassino”, que retrataram a máfia com um toque forte e incisivo, gravitando em torno da estrutura do crime organizado na América. Trabalhando com seu companheiro de longa data e especialista em história da Cosa Nostra, Nicholas Pileggi, detecta-se uma aura realista inquestionável, pois o escritor detinha horas de entrevistas com mafiosos delatores e, em suas próprias palavras, não é possível descrever em sua essência como um criminoso de Nova York fala; logo, no cinema, tal material é devidamente explorado.

Assim como o cinema de Tarantino, não se trata de violência gráfica e estilizada, mas a transposição da mente e o cotidiano de pessoas violentas e como esse cenário coexiste com a sociedade, em tom de elemento periférico à sua cultura organizacional. Scorsese havia enveredado pelo tema em um de seus primeiros filmes, “Caminhos Perigosos” de 1973, iniciando sua longa parceria com Robert De Niro e Harvey Keitel, naquele espaço, retratando na frieza das ruas, a cadeia alimentar da metrópole e suas almas atormentadas.

Uma característica marcante nas aludidas obras, assim como em “O Irlandês”, é a utilização perfeita do recurso de narrativa sobreposta às cenas, denominado voiceover. Alguns críticos podem argumentar, e de maneira bastante pertinente, que o recurso de narrativa sobreposta seria uma tentativa de contar a história quando esta apresenta-se falha em seu desenvolvimento linear, suprindo suas deficiências de uma forma menos sofisticada. Contudo, é preciso que se componha um verdadeiro e bem composto voiceover, que apenas acrescenta à trama.

Decerto, filmes como “Cassino” e “Bons Companheiros” perderiam o colorido sem os pensamentos e pontos de vista dos personagens Henry Hill (Ray Liotta) e Sam “Ace” Rothstein (De Niro), conduzindo o espectador em uma viagem da qual ele hesita de se evadir. Quando se analisa do ponto de vista crítico, descortina-se uma verdadeira aula de cinema a cada produção do diretor, espaço no qual se verifica técnica e arte num cotejo perfeito, produzida por uma equipe recorrente como a renomada montadora Thelma Schoonmaker e a figurinista Barbara De Fina.

Um de seus mais recentes longa-metragens, baseado no livro “I heard you paint houses” de Charles Brandt, “O Irlandês”, em suas três horas e meia de duração, acompanha a trajetória de Frank Sheeran (De Niro), assassino da máfia e membro dos Teamsters, além da ascensão e derrocada do famoso líder sindical norte-americano Jimmy Hoffa, interpretado magistralmente por Al Pacino em seu primeiro trabalho com o diretor.

Na produção, foi utilizado um recurso inovador, consistente em uma técnica de rejuvenescimento digital, pela qual o elenco interpreta personagens até mesmo trinta anos mais jovens, como Pacino, tendo em vista que o septuagenário ator retrata Hoffa aos 49 anos de idade, através da inserção de pontos digitais na maquiagem e a utilização de câmeras com lentes duplas e em maior quantidade.

O resultado, uma obra-prima que recebeu qualificação de até 100% pelos sites e crítica especializada, além de dez indicações ao Oscar. Infelizmente, a película não foi vencedora em nenhuma das nomeações, e ainda protagonizou a polêmica pelo fato de ter sido concebida originalmente como uma produção realizada para o serviço de streaming, o que justificou seu curto e limitado lançamento nos cinemas, para chancelar sua participação no prêmio da academia. Não foi nessa oportunidade, mas a expectativa é considerável para uma segunda estatueta ao mestre filmmaker, nos anos vindouros.

 

Marcus Hemerly

marcushemerly@gmail.com

 

 

 

 

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