Ricardo Hirata Ferreira – ‘UM AMOR PROIBIDO’
Em um remoto vilarejo na Europa da Idade Média dois jovens foram perseguidos e condenados por tentarem viver o seu grande amor. Os religiosos e inquisidores da época eram implacáveis: jamais duas pessoas do mesmo sexo poderiam se amar, pois isso era contra as ordens do seu deus, do deus e das ordens criadas (elaboradas) por eles. Os dois jovens não eram vistos como humanos, mas sim como criaturas abomináveis que traziam maus presságios aquela comunidade.
João, um pouco mais velho que seu companheiro Felipe, sabendo do grave perigo que estavam correndo, implorou desesperadamente para que seu amor fugisse. Disse a ele que fosse embora e que assim que possível, ele iria partir ao seu encontro. Felipe muito assustado, mas confiante no forte elo que os unia resolveu então fugir. Antes da sua partida, João lhe fez um último pedido: “aconteça o que acontecer não volte para este vilarejo”.
Felipe então com as lágrimas descontroladas no rosto se despediu de João. Na manhã seguinte os inquisidores prenderam João, o castigaram duramente, queimaram seus olhos e perfuraram todo o seu corpo em público até a sua morte. O gesto foi feito para servir de exemplo a todos aqueles que desrespeitassem as ordens segundo eles divinas. João foi então jogado em um poço seco e profundo, apesar de todo o sofrimento, morreu com certo alívio, pois sabia que a vida do seu amor havia sido preservada.
Felipe, por sua vez, no meio do caminho, resolveu voltar, como se pressentisse que seu companheiro havia sido morto. Tomado pela paixão procurou desesperadamente João, mas tarde demais, ao implorar para que o levassem até o seu amor, os inquisidores e os homens da lei, o prenderam e o torturaram cruelmente, ele fora castrado e jogado ainda vivo no poço seco e profundo onde estava o corpo mutilado de João.
A fúria, o ódio e a dor insuportável tomaram completamente conta de Felipe, inconsolável, ele chorava e gritava alucinadamente agarrando em seus braços o amor de sua vida. Com muita sede e picado por inúmeras aranhas, Felipe, dias depois falece ao lado do seu amado.
O sentimento de alívio sentido por João antes do momento de sua morte o levou para outras vidas, não sem sofrimento, mas para lugares mais evoluídos, onde a tristeza, a alegria e alguns sonhos puderam ser vividos.
Por sua vez, Felipe que sentiu o horror na própria pele e que viu o estado deplorável que haviam feito com seu companheiro, faleceu com sentimentos de ódio, revolta e medo. Estes sentimentos o levaram para reinos longínquos: de muita dor, miséria e falsidade. Várias vezes ele renasceu levando consigo estes sentimentos tristes e vingativos, tendo suas sucessivas existências ligadas a eles.
Finalmente após algumas vidas, por um lapso momento do tempo de uma vida, os dois puderam e conseguiram se reencontrar. O reencontro foi mágico (sublime), parecia que ambos já conheciam um o corpo do outro. O olhar, o sorriso, o beijo, o toque e os abraços fizeram os dois reviverem um lindo, porém triste e proibido amor.
Os sentimentos de amor e de alegria possibilitaram que os dois se aproximassem novamente, porém estava evidente que cada um havia trilhado caminhos de existências e de vidas diferentes. Nesta vida houve a possibilidade do reencontro, contudo, em função destas distintas existências que foram, em certa medida, conduzidas por um: pelo sentimento de alívio e de serenidade, e pelo outro: por sentimentos de rancor e ira, os colocaram em diferenciadas posições e vibrações que ainda os impedem de viver plenamente o seu amor.
Talvez, em mais algumas vidas de aprendizagem, evolução e sem grandes retrocessos, ambos poderão viver de maneira feliz e completa este amor que fora interrompido de forma bárbara e precoce, pela frieza daqueles monstros que se travestem de seres humanos cegos, amargos e infelizes e que ainda assombram o século XXI.
Ricardo Hirata Ferreira
Doutor em Geografia Humana, FFLCH, USP.
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É fundador e um dos editores do Jornal Cultural ROL e do Internet Jornal. Foi presidente do IHGGI – Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapetininga por três anos. fundou o MIS – Museu da Imagem e do Som de Itapetininga, do qual é seu secretário até hoje, do INICS – Instituto Nossa Itapetininga Cidade Sustentável e do Instituto Julio Prestes. Atualmente é conselheiro da AIL – Academia Itapetiningana de Letras.